quinta-feira, 17 de março de 2016

A "bondade" que mais deslumbra do que transforma

SOPA DOS POBRES - Caridade paliativa, mas vista como "revolucionária" pelos "espíritas".

A blindagem com que ídolos religiosos como Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco faz com que as pessoas prefiram estereótipos de "bondade" e "caridade", e defendam com unhas e dentes tais estereótipos, dizendo que eles "transformam, sim", tomados mais da emoção que da razão.

Um "tranquilo" seguidor de Divaldo Franco, nas mídias sociais, infiltrado numa comunidade de ateus, tentou defini-lo como autor do "maior projeto de caridade do Brasil". Dessa feita, ele insiste em dizer que Divaldo é o "maior filantropo do país", desqualificando as análises que se fez sobre os 0,08% que a Mansão do Caminho que ele encarou com indisfarçável desdém.

Ele alegou que a porcentagem era uma forma de "diminuir o trabalho" de Divaldo, mas se enrolou ao dizer que o projeto beneficia 3200 ou 3500 crianças, sem dar clareza da dimensão da "caridade", e ainda disse que "é muito" haver projetos educacionais que ensinam a "ler, escrever e trabalhar".

Se comportando como se fosse um assessor da Mansão do Caminho ou alguém que só enxerga a realidade pelos tendenciosos filtros da Rede Globo - ele se baseou numa reportagem do decadente Fantástico para defender suas convicções divaldistas - , o rapaz ilustra o desespero que os religiosos têm em defender a caridade paliativa.

É um deslumbramento que expressa uma teimosia infantil, porque sabemos que esses projetos nada têm de revolucionários nem transformadores e os resultados que trazem, se realmente existem, são ínfimos e tímidos.

É evidente que o divaldista deu um tiro no pé quando disse que "é muito" ensinar a ler, escrever e trabalhar. Isso é apenas o básico do básico, mas não significa que isso, em si, possa fazer a pessoa compreender realmente o mundo em sua volta.

O que o divaldista ignora é que o "espiritismo" inclui no cardápio educacional o proselitismo religioso. Evidentemente ninguém vai dizer "você vai seguir nossa religião". Nem os pastores da Igreja Universal, salvo exceções, fazem isso. Pelo menos os mais sutis não dizem "você vai seguir nossa fé", mas fazem de tudo para convencer a pessoa de que a "crença da casa" é "mais importante".

FORA DA FANTASIA RELIGIOSA

A bondade estereotipada não traz todas as respostas para desigualdades e conflitos de interesses diversos. O "espiritismo" se torna impotente em ver a complexidade da vida, e mesmo projetos como a Mansão do Caminho se revelam inócuos e pouco eficazes nesse contexto.

Se Divaldo Franco tivesse realmente feito um projeto revolucionário, o bairro de Pau da Lima seria seguro até para se passear de madrugada, no escuro. A reputação que se atribui ao anti-médium baiano pressupõe que ele tem poderes transformadores, sua energia é elevadíssima e por isso se espalharia por todo o lugar de sua ação, pois Pau da Lima é onde fica a Mansão do Caminho.

Mas isso não acontece. Além do índice de 0,08%, resultante de um cálculo lógico e não de invencionices caluniosas, do número anual de beneficiados da Mansão do Caminho, ser bastante inexpressivo para Divaldo merecer o título de "maior filantropo do Brasil", a trágica situação de Pau da Lima já desqualifica ainda mais essa atribuição.

Repetimos. A porcentagem de 0,08% já é humilhante em relação a Salvador, imagine em dimensão nacional. Como dizer que Divaldo é "o maior filantropo do Brasil" se, em níveis nacionais, sua "revolucionária ajuda", em dimensões de todo o território brasileiro, praticamente chega ao nível de 0% (zero por cento), ou seja, NADA?

Além disso, soa bastante arrogante comemorar uma "caridade" ínfima dessas com essa parca porcentagem. Os divaldistas nem conseguem argumentar direito, e além do mais, se Divaldo Franco tivesse feito jus ao título, o Brasil não estaria vivendo a crise que vive. E mostra o quanto o "espiritismo" brasileiro nunca tem, na firmeza, um de seus princípios.

Quando a Chico Xavier, a "caridade" dele também não era muita. Paliativa, inócua, também sem qualquer caráter transformador. E também se festejou demais com pouca coisa, com os chiquistas dizendo que seu ídolo "ajudou muita gente" sem mostrar provas, sem apresentar sequer o recibo dos "grandes feitos" do anti-médium mineiro.

É claro que o caso de Divaldo Franco é mais verossímil do que Chico Xavier, porque Divaldo sempre trabalhou seu mito com maior esperteza que o amigo de Pedro Leopoldo, marcado por escândalos e deslizes menos sutis. Xavier só foi transformado num mito "mais limpo" porque a Rede Globo teve que se inspirar em Malcolm Muggeridge para relançar o "médium" como um pretenso ícone de "bondade" e "caridade".

Essa "bondade" toda mais deslumbra que transforma. Ela segue um roteiro de "boas ações" que conforta as pessoas dotadas de emotividade religiosa. É como uma novela da vida real. É uma "caridade" mais piegas do que ativista, e é feita sem mexer com o sistema de desigualdades e injustiças que existe no Brasil.

Daí o seu caráter duvidoso. Mas o Brasil é um país conservador e as mídias sociais são cheias de gente retrógrada. Elas preferem exaltar figuras como Chico Xavier e Divaldo Franco, que "ajudam" sem mexer no sistema de desigualdades e injustiças, apenas investindo numa pequena "multidão" de pessoas inócuas, que apenas "sobrevivem" sem que tenham muita qualidade de vida.

A verdade é que a "caridade" que eles promoveram - Divaldo ainda promove - não traz transformação significativa na sociedade. Apenas interfere, de maneira mais inócua possível, em uma parcela muito pequena de vidas humanas.

Só que isso é insuficiente e desmerece qualquer título de "grandes filantropos" a esses dois anti-médiuns, porque essa caridade, na complexidade social em que se vive, se demonstra impotente e sem eficiência para resolver definitivamente as injustiças e desigualdades existentes. Tanto que as áreas "protegidas" por suas "boas energias" são tomadas da mais intensa violência e pobreza.

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