terça-feira, 16 de dezembro de 2014

O padre Manuel da Nobrega, o "Ermano Manuel"


Emmanuel, o mentor de Francisco Cândido Xavier, é identificado ao padre jesuíta Manuel da Nóbrega pelas caraterísticas manifestas que ligam o espírito ao personagem que teria sido sua encarnação mais famosa, como o temperamento enérgico e a habilidosa astúcia.

Nascido em Sanfins do Douro, no Norte de Portugal, em 18 de outubro de 1517, Manuel da Nóbrega formou-se em direito canônico e filosofia na Universidade de Coimbra, onde completou os estudos universitários iniciados na Universidade de Salamanca.

Ordenado pela Companhia de Jesus aos 27 anos de idade, Manuel da Nóbrega tornou-se pregador católico em sua turnê por toda a península ibérica, participando de cerimônias e missas. Desembarca na Bahia no dia da fundação de Salvador, 29 de março de 1549.

Em terras brasileiras, Manuel teria dito aos presentes: "essa terra é nossa empresa", entendendo a palavra "empresa" não no sentido do jargão da Economia e Administração como conhecemos, mas tão simplesmente como "projeto" e "iniciativa", indicando uma intenção de Nóbrega iniciar no Brasil a sua mais ambiciosa pregação católica.

Manuel participou também das fundações das cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo. Também tornou-se conhecido pelo processo de inculturação, que ele praticou com diversos povos indígenas, para impor nelas o seu Catolicismo, de moldes ainda fortemente medievais.

A inculturação visava assimilar as caraterísticas dos povos a serem dominados, como ocorreu no caso das tribos indígenas, em que até o idioma tupi-guarani era aprendido de forma a ser organizada até mesmo uma gramática com esse idioma.

Assimilando práticas e crenças indígenas - o que teve lá seu ponto positivo, porque foi por esse caminho que várias práticas foram introduzidas e perpetuadas na vida urbana, valendo até hoje - , os jesuítas no entanto estabeleciam um preço muito caro para tamanha tarefa, que era a conversão dos povos indígenas ao Catolicismo medieval.

Manuel da Nóbrega era temperamental, escravocrata, machista, racista e autoritário. Era um habilidoso orador católico, mas era vingativo e bastante agressivo, embora também dotado de muita esperteza para fingir benevolência e cordialidade. Doente, morreu em 1570, no dia do seu próprio aniversário de 53 anos de idade.

O LEGADO DO CATOLICISMO MEDIEVAL

Note-se que, no que se refere aos cálculos historiográficos, a Idade Média teria sido superada como período histórico dotado de suas caraterísticas mais fortes e dominantes, mas seu legado continuava valendo em Portugal bem depois do fim oficial do período medieval, atribuído ao século XV.

O Brasil foi "descoberto" no começo do século XVI, embora sabemos que o que se conhece como "descoberta" é na verdade uma exploração oficial de esquadra portuguesa com o fim de submeter o grande pedaço de terra situado no sul do continente americano à coroa portuguesa.

Há relatos, todavia, de expedições marítimas ocorridas bem antes da chegada de Pedro Álvares Cabral e seus parceiros ao solo que hoje corresponde ao Brasil, vindas de outros países fora da península ibérica, já na primeira metade do século XV. Sem falar dos próprios indígenas brasileiros, cujos ancestrais teriam vindo de ilhas da Polinésia, no Oceano Pacífico.

Vestígios do Catolicismo medieval português eram fortemente presentes no começo do século XIX, portanto, depois da ocorrência da Revolução Industrial inglesa (1750), da Independência dos Estados Unidos da América (1776) e da Revolução Francesa (1789).

Com o terremoto que arrasou Portugal, em 1755, uma das piores tragédias acontecidas no continente europeu, a Companhia de Jesus teve um desfecho desfavorável no Brasil. Antes que descrevamos o fim de suas atividades, vale citar um pouco dessa tragédia.

Um grande terremoto que teria atingido parte do litoral português e o seu solo teria atingido, segundo sismólogos, entre 7,5 e 9,5 da escala Richter, considerado entre grande e excepcional, a provocar grandes estragos. Juntando o terremoto com o maremoto de cercade vinte metros que teria atingido a costa portuguesa, a tragédia causou danos irreparáveis.

Só para se ter uma ideia, ocorreram incêndios, Lisboa foi quase toda destruída, outras cidades portuguesas foram atingidas com similar gravidade e um número estimado a cerca de pouco mais de 10 mil mortos, de acordo com dados oficiais, embora se suponha que o número teria sido bem maior.

Em todo caso, o prejuízo causado foi de proporções alarmantes, e um dos políticos sobreviventes, Sebastião José de Carvalho e Melo, o Marquês do Pombal, que havia sido secretário dos Negócios Estrangeiros e da Guerra do reino português e, na ocasião do terremoto, era primeiro-ministro, adotou uma política austera de reconstrução de Portugal.

Com um vigor enérgico e autoritário, o Marquês do Pombal agilizava ações dos bombeiros para apagar incêndios, diligências hospitalares para recolher cadáveres e impunha um corte drástico de investimentos para resolver a situação financeira do país europeu, diante do grave prejuízo causado com o terremoto.

Aí é que entra a Companhia de Jesus. Ou melhor, é aí que ela sai, quando é convocada a deixar do Brasil, encerrando suas atividades, que representavam grandes despesas para o tesouro português. A essas alturas, nomes como Manuel da Nóbrega e José de Anchieta, só para citar os maiores expoentes, estavam há muito tempo falecidos.

A "REVANCHE" DO ALÉM

No plano espiritual, os diversos grupos católicos que haviam se associado à Companhia de Jesus parecem não ter engolido a decisão do Marquês de Pombal de encerrar a inculturação jesuíta, deixando o tempo lhes dar uma nova oportunidade.

Essa oportunidade se deu quando, já nos últimos anos do Segundo Império, figuras como Luiz Olímpio Teles de Menezes e Adolfo Bezerra de Menezes (sem parentesco entre si), respectivamente na Bahia e no Rio de Janeiro (apesar de Adolfo ter sido cearense), começaram a minimizar a influência audaciosa da Doutrina Espírita dentro dos limites do Catolicismo vigente no Brasil.

Essa forma de Catolicismo era a herdada do modelo português, ainda fortemente medieval, que encontrou terreno favorável quando o Espiritismo, ao ser introduzido no país, teve que ser amenizado de forma a não representar conflitos com a Igreja Católica, que o via como prática ilegal.

Com o tempo, a Doutrina Espírita de Allan Kardec, encontrando concorrência com o neo-catolicismo de Jean-Baptiste Roustaing, foi podada de forma que praticamente reduzisse o teor científico da doutrina kardeciana para se transformar num receituário moralista religioso, numa indústria de "palavras de amor".

E Manuel da Nóbrega, relembrando dos tempos em que era conhecido como "Ermano Manuel" - "ermano" era "irmão", no português arcaico - e assinava cartas como "E. Manuel", regressou através do relativo poder paranormal do católico Francisco Cândido Xavier para tornar-se seu mentor e instrumento para a nova inculturação do jesuíta.

Desta vez, Nóbrega retornava, agora como Emmanuel, para estabelecer a inculturação sobre a Doutrina Espírita, absorvendo algumas de suas caraterísticas para impor nelas o velho moralismo jesuíta, e, não podendo criar um novo Catolicismo e tendo sido passado para trás diante das transformações feitas pela Igreja Católica, se contentou com sua nova tarefa.

Assim, Emmanuel se empenhou em desenhar um perfil "católico" padrão para o "espiritismo" brasileiro, através de muitos livros que atualizavam as ideias que constavam nas cartas de Manuel da Nóbrega e que se afinam, entre si, até na forma com que as palavras eram escritas. É só comparar as cartas do padre Nóbrega com os livros de Chico Xavier sob a autoria de Emmanuel.

Sim, porque as cartas de Manuel da Nóbrega tinham o mesmo estilo de escrita que Emmanuel lançou através de Chico Xavier. Com todas as caraterísticas fortes da personalidade do jesuíta que indicam ser o padre Nóbrega um dos poucos espíritos, entre os que supostamente aparecem nas manifestações mediúnicas, que teriam correspondido verdadeiramente às identidades atribuídas.

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