sexta-feira, 26 de junho de 2015

Por que a mediunidade é uma prática desmoralizada no Brasil?


A maioria dos brasileiros não sabe, mas a prática da mediunidade, no nosso país, está completamente desmoralizada. Fora a histeria religiosista que vê na prática um primor de transparência e isenção, justificando a falsa constatação pela emoção e pelo status dos supostos médiuns, o que se observa é uma falta de controle e disciplina até entre os que dizem exercer controle e disciplina.

A mediunidade foi corrompida porque nunca houve uma compreensão correta da Ciência Espírita. Que todos podem ser médiuns, em tese isso é verdade. E que a mediunidade não depende de ser espírita para ser feita, também é outra verdade.

Mas o problema nem é tanto que a mediunidade seja feita alheia à Doutrina Espírita em si, mas o fato da mediunidade que se afirma "espírita" ser feita de forma irregular e não raro fraudulenta, mesmo por aqueles que julgam rigor e honestidade em relação aos ensinamentos contidos em O Livro dos Médiuns.

Em primeiro lugar, não tivemos uma prática mediúnica vinculada verdadeiramente aos ensinamentos e recomendações de Allan Kardec, mas vindos de práticas não-espíritas trazidas por movimentos hereges ligados ao esoterismo, à feitiçaria ou ao curandeirismo.

Exportamos práticas que, em muitos casos, beiram ao mais rasteiro charlatanismo, algo mascarado de maneira bem sucedida pelo status e pela reputação de "bondade" atribuídos aos supostos médiuns, que, espertos, não hesitam em bancar dublês de filósofos num Brasil de pouca leitura, baixa instrução e mais baixa capacidade de discernimento, e carente de verdadeiros filósofos.

Mascara-se a incompetência mediúnica com todo um repertório maciço de falsas verdades, aliado a uma suposta filantropia que não passa de um paternalismo barato, desses que qualquer pessoa com um nível moral mais mediano é capaz de fazer, como dar cestas básicas para os pobres, algo que só traz benefícios provisórios e frágeis.

VIROU BAGUNÇA

Como fenômeno espírita, é de se esperar que a mediunidade se desenvolva aos poucos, com muita cautela, com pessoas realmente especializadas e sem muito alarde. Isso, se forem levados em conta os ensinamentos que O Livro dos Médiuns, obra fundamental de Allan Kardec, estão claramente escritos em suas páginas.

Mas nada disso aconteceu. Tudo virou um circo, um espetáculo sensacionalista que envolve práticas improvisadas ou falsificadas, feitas por pessoas cujo talento mediúnico é bem menos expressivo do que se supõe e com uma propagação e uma ostentação que põe a credibilidade em xeque, mas é visto como "altamente confiável" pela triste tradição de haver tanta gente crédula.

O verniz de filantropia, bondade e humildade servem para mascarar a bagunça que virou a prática "mediúnica", das mensagens produzidas das mentes dos supostos médiuns, com informações inclusive "complexas" e "inacessíveis" colhidas pela leitura fria, mensagens estas que não passam de puro propagandismo religioso.

Para quem não sabe, leitura fria é um recurso comunicativo em que o interrogador faz uma conversa sutil para estimular a emotividade de outra pessoa que, envolvida com esse discurso "intimista", passa a dar informações das mais detalhadas sobre sua vida e a de seus entes próximos e até com algum nível de distância.

São produzidas mensagens com um padrão muito parecido entre si, apenas diferindo de estilo conforme o respectivo "médium", que conta com um estilo pessoal para cada repertório de mensagens correspondente. O "médium" A terá um estilo, o "médium" B terá outro, e assim por diante.

Nas curas mediúnicas, o que se observa são práticas improvisadas, que não buscam diálogo real com a medicina feita na Terra. Chegam mesmo a ser práticas marginais, com procedimentos clandestinos, como se fosse uma anti-medicina, que não raro traz energias negativas para os próprios "médiuns", já que boa parte deles acaba sendo vítima de algum infortúnio trágico.

A vida espiritual é feita na base da especulação, na maioria das vezes combinando valores moralistas com abordagens materialistas. dentro de um sistema de valores que tanto pode negar os prazeres materiais quanto pode afirmar, por exemplo, que existem animais domésticos num "mundo do além-túmulo" que consiste numa colônia espiritual em construções pomposas e megalomaníacas.

Os passes são feitos mais por um conjunto de sensações de transe e excitação pessoais que, dentro de ambientes com relativa escuridão, iluminado apenas por uma pequena lâmpada, geralmente azul, fazem os chamados "passistas" (deveriam ser "passeiros" para não confundir com a função carnavalesca que leva este nome) sacudirem as mãos sobre as pessoas atendidas.

A "mediunidade", no Brasil, é feita no improviso ou então mascarada pela incompetência. Em ambos os casos, o "fazer mal" e o "não fazer" dos supostos médiuns são sempre feitos em total dissonância e acima de tudo dessintonia com a Ciência Espírita.

Houve até mesmo um livro que tentou dar um verniz "científico" a toda sorte de deturpações, mistificações e fraudes, o livro Nos Domínios da Mediunidade, de 1955, uma desordem teórica que, atribuída ao fictício espírito André Luiz, foi escrita a quatro mãos por Waldo Vieira (não creditado) e Francisco Cândido Xavier.

Era uma forma de justificar a ignorância em relação a O Livro dos Médiuns e um meio de permitir práticas que o livro de Kardec não aconselharia de jeito algum. Um arranjo "teórico" para autorizar toda a bagunça que é feita sob o rótulo de "mediunidade".

Daí que a prática "mediúnica" tornou-se desmoralizada no Brasil, no sentido de impossibilitar que alternativas fossem feitas em prol da verdadeira mediunidade. Porque mesmo as tentativas mais honestas acabam sendo vinculadas aos desonestos, porque eles querem se autopromover às custas daqueles.

Isso cria um aspecto terrível sob vários aspectos. Entre eles, o de não permitir que aqueles que praticam uma mediunidade honesta, distantes do oba-oba e do estrelato "espírita" da quase totalidade dos seus "centros", se expressem de maneira independente do "circo" puxado por Chico Xavier, Divaldo Franco e outros mistificadores e fraudadores.

Há o outro aspecto de que os desonestos sempre se preparam para se apropriarem de práticas honestas, ou mesmo das reivindicações de honestidade. Chico, Divaldo e outros usurpam até mesmo Erasto para se autopromoverem, enquanto o discípulo de Paulo de Tarso, em mensagens divulgadas no tempo de Kardec, estava na verdade dando um violento puxão de orelha nesses oportunistas.

O "espiritismo" age através da corrupção dos conceitos de mediunidade e mascara tudo isso tentando bancar o "bonzinho". Mas a "doutrina dos bonzinhos", com seus pastiches e com a usurpação dos nomes dos mortos para fazer propagandismo religioso, apenas agrava a situação que hoje faz os líderes "espíritas", desesperados, pedir "equilíbrio de conduta".

E logo esses líderes, a apoiar fraudes, pastiches e tantas outras aberrações, desde que conduzidas com aparente serenidade e sob o pretexto da "pura bondade", é que cobram a "ética espírita" que não cumprem. Ficam assustados com as críticas, mas nada podem fazer, até porque os erros, gravíssimos, partem deles mesmos ou então são apoiados abertamente por eles.

Daí que a mediunidade no Brasil, se ela tiver que ser feita de forma honesta, terá que ser começada do zero, descartando com a mais absoluta firmeza todo o "circo" que se observa entre os astros do "espiritismo" brasileiro. Para ser honesto, deve-se romper com os desonestos, por mais badalados que eles sejam, e não compactuar com eles sob o pretexto da "relativização dos erros".

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