terça-feira, 10 de novembro de 2015

O mito da "caridade pela escrita"


Francisco Cândido Xavier nunca foi um primor de bondade e caridade. Esse mito, plantado pela Rede Globo de Televisão com base no que Malcolm Muggeridge fez a respeito da Madre Teresa de Calcutá no documentário Algo Bonito para Deus (Something Beautiful for God), de 1969, como tudo relacionado ao anti-médium mineiro, mostra aberrantes contradições e incoerências.

Uma das supostas bondades atribuídas a Chico Xavier é a "caridade pela escrita". Sabemos que seu conteúdo é confuso e mesmo os apelos de generosidade, paciência e equilíbrio moral escondem aspectos sombrios, inspirados pela Teologia do Sofrimento, cuja defesa da parte de Madre Teresa a fez ser conhecida como "anjo do inferno".

É muito fácil dizer que as mensagens trazidas por Chico Xavier foram "consoladoras". Sabe-se que nem isso é verdade. Muitos aspectos estranhos existem por trás, como a irregular produção de cartas "mediúnicas" - que Waldo Vieira, depois de romper com Chico após o caso Otília Diogo, denominou "cartas marcadas" - que escondem tanto processos de fraude como de obsessão aos mortos.

Mensagens que apontam irregularidades diversas, não bastasse a caligrafia e a narrativa serem do mesmo estilo pessoal de Xavier. Informações "complexas" trazidas pela "leitura fria", pesquisas bibliográficas e até por conversas informais durante eventos "espíritas". Tudo isso compromete qualquer veracidade nas mensagens supostamente atribuídas ao além.

Chico Xavier nunca entendeu de mediunidade, da forma como Allan Kardec sistematizou em O Livros dos Médiuns, apenas se dotando de dons paranormais primários e iniciantes. Quando muito, se comunicava com um padre jesuíta (Padre Manuel da Nóbrega, rebatizado Emmanuel) e com a mãe, Maria João de Deus.

Mas existem dúvidas se a mediunidade ia ao ponto da escrita. Até a obra atribuída a Emmanuel apresenta dúvidas de que teriam sido escritas pelo jesuíta. Para nós, existe a hipótese provável de que Emmanuel teria ditado ideias que Chico Xavier assimilava e botava no papel. Não era necessariamente uma psicografia, mas uma escrita consciente na qual o autor se sentia intuído com sugestões que ele associava ao seu mentor.

Houve confusão em vários casos. Nos livros, sabemos os escândalos aberrantes que Parnaso de Além-Túmulo e Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho causaram, revoltando os críticos literários mais renomados que, com muita razão e conhecimento de causa, identificaram pastiches e aberrações literárias que contrariam a natureza original dos autores atribuídos.

Nas cartas, famílias se desentendiam quanto às autorias das mesmas. Um pai chegou a se revoltar ao ver que a carta atribuída a uma filha falecida não parecia ser dela, enquanto outros familiares, tomados de fascinação, acreditaram na suposta veracidade. Os amigos de Jair Presente não viram qualquer aspecto da personalidade dele nas cartas a ele atribuídas. E por aí vai.

Onde tem confusão demais, a coerência não encontra morada. E um dos maiores aspectos para a verdadeira bondade é o respeito à coerência e à lógica, e, quando estas não são respeitadas, não há discurso fraterno que se sustente.

Chico Xavier causou vários escândalos, pelas confusões que causou. Sua prática sempre foi irregular, daí que tantos e graves incidentes ocorreram, e o anti-médium tem em boa parte culpa ativa em vários deles. Ele assinou atestados de falsa autentificação das fraudes de materialização, e esteve junto a Otília Diogo apoiando todo o processo de ilusionismo que ela armou.

Por isso, não há como dizer que Chico Xavier é a personificação do bom senso. De jeito nenhum. E se sua figura "unificadora" chega a criar divergências como as de Geraldo Lemos Neto, que o via como "profeta", e Ariston Teles, que discordava dessa tese, então não há como aproveitar coisa alguma do anti-médium mineiro se quisermos recuperar as bases da Doutrina Espírita.

Quanto ao aspecto da "caridade pela escrita", esse mito, tão exaltado pelos chiquistas, torna-se uma crueldade por apresentar uma aberrante, explícita e escancarada desonestidade intelectual, principalmente nos livros "teóricos" que foram produzidos através do autoproclamado "lápis de Deus".

Só a comparação com os livros de Allan Kardec - que não foram muitos, mas primam pela maior coerência e clareza possível de ideias - demole, de forma irrecuperável, qualquer credibilidade das obras de Chico Xavier, já que estes mostram pontos de vista contrários à Doutrina Espírita.

Pesquisas sérias já fazem tais comparações, confrontando textos de Kardec com os que Chico divulgou ao público, e é estarrecedor o nível de contrariedade que se nota entre uns e outros, quando a lógica e o bom senso kardecianos não são compartilhados por um Chico Xavier que traz teses fantasiosas, valores moralistas retrógrados e outras irregularidades.

O amor, a bondade, a caridade não podem permanecer de pé se não há a lógica, a coerência e o bom senso. Tornam-se frágeis sentimentos emocionais, que diante do menor questionamento se convertem em ódio, maldade e egoísmo, prendendo seus iludidos adeptos na cegueira de suas convicções pessoais, na vã tentativa de promover o casamento da bondade com a falta de lógica.

Diante da contrariedade severa que os livros de Chico Xavier expressam em relação à obra de Kardec, não há como atribuir bondade alguma aos cerca de 400 livros que o anti-médium mineiro publicou, Bondade não se faz com desonestidade intelectual e doutrinária, já que se tratam de processos de mistificação, enganação e mentira, que por isso já são cruéis por lesar as mentes de pessoas seduzidas pelas promessas de esperança, consolação e otimismo.

Por isso os livros de Chico Xavier também mostram que seu mito de "brasileiro mais bondoso de todos os tempos" é falso e altamente discutível, e sua "antena psíquica" nunca passou de um brinquedo para ele se divertir enganando severamente as pessoas.

Não se faz caridade por meio de livros cujo conteúdo é uma grave violação à lógica e à coerência, por apresentar ideias enganosas, fantasiosas, especulativas e sem comprovação de qualquer natureza, mas que se impõem como "realidade", mentindo para seus leitores.

Só esses aspectos já eliminam de vez qualquer valor de bondade e de caridade dos livros lançados por Chico Xavier. Afinal, não se ajuda nem se beneficia outrem através do engano, da mistificação e da malícia.

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