quinta-feira, 9 de julho de 2015
O "morde-e-assopra" dos "espíritas"
Há um dito popular que diz a respeito de "acender uma vela para Deus e outra para o Diabo". No "movimento espírita" que conhecemos no Brasil, a ambiguidade dessa doutrina indica que o ditado das velas acesas se volta para outro contexto.
Desde 1975, quando o roustanguismo passou a ficar enrustido, diante dos escândalos causados com a defesa radical da obra de Jean-Baptiste Roustaing, o "movimento espírita" passou a assumir uma postura dúbia, defendendo Allan Kardec na teoria e o abandonando na prática.
Os mesmos líderes "espíritas" usam em causa própria os alertas de Erasto e, depois, vão para o extremo oposto, aderindo ao jesuíta Emmanuel. O maior mal do "espiritismo" brasileiro é ir da objetividade científica ao misticismo religioso como quem vai de um bairro para outro.
Não há como ficar entre esses dois lados. Isso não é como ir para a Zona Norte de manhã e seguir para a Zona Sul de tarde. A contradição em que se envolvem os "espíritas" é algo grave e ser ambíguo é visto erroneamente como adotar uma postura equilibrada.
Com toda a certeza, o recado enérgico de Erasto, em mensagem espiritual divulgada na França, alertava sobre os piores inimigos da Doutrina Espírita, que não estavam fora dela, mas dentro, o que indica que Jean-Baptiste Roustaing foi o ponto de partida de toda a bagunça.
Roustaing foi defendido com entusiasmo pelos líderes da FEB. A postura era nefasta e leviana, mas era bem mais assumida do que nos últimos 40 anos, quando se adotou uma linha "intermediária" entre o roustanguismo sem Roustaing e o kardecismo com Chico Xavier.
Adotar uma postura dúbia não é adotar equilíbrio. Da mesma forma, adotar uma neutralidade não é necessariamente adotar uma postura justa e objetiva dos fatos. A lenda do rei Salomão que queria cortar um bebê em dois para satisfazer duas mães em disputa ilustra, como metáfora, este caso.
Evidentemente, a postura dúbia do "espiritismo" está causando a maior crise da doutrina desde que o roustanguismo tornou-se a escolha da FEB desde sua fundação, em 1884. Até pelas contradições existentes entre a pretensão de acertar diante dos graves vícios adotados pela doutrina, como a eterna proximidade com o Catolicismo medieval e as práticas irregulares de mediunidade.
Tudo fica um morde-e-assopra, o que faz com que o "espiritismo" brasileiro só tenha a sorte de suas irregularidades não serem conhecidas do grande público, do contrário que os neo-pentecostais (através de nomes como Edir Macedo, Silas Malafaia, Marco Feliciano e o atual presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha), estes bastante grotescos e pouco sutis.
Dessa forma, o charlatanismo de Chico Xavier e Divaldo Franco, ao lado de sua ideologia calcada no moralismo católico-medieval, é protegido pela blindagem da grande mídia reacionária e pela ilusão retórica de aparente bondade e humildade.
A crise do "espiritismo", portanto, não reflete a onda de intolerância religiosa, embora os "espíritas" tenham que pegar carona neste termo em moda e se autoproclamarem vítimas. Diferente de outros movimentos religiosos, o "espiritismo" paga o preço caro da deturpação da doutrina de Kardec e do abandono da sua essência.
Como a figura do marido cafajeste, o "espiritismo" trai Allan Kardec o tempo todo, contrariando a natureza do pensamento do professor francês, mas tenta dar a impressão de que se mantém rigorosamente fiel a ele e suas ideias. Enquanto seus seguidores ficam felizes com essa falsa demonstração de lealdade, o "espiritismo" continua "pulando a cerca".
Coerência de conduta não é estufar o peito e adotar uma pose de serenidade tão falsa quanto triunfante. Não é bancar o conciliador tendencioso de contrastes inconciliáveis. Não é forçar o equilíbrio com palavras dóceis e belas, que não são mais do que o mais melífluo discurso feito apenas para adoçar o peso na consciência de erros tão grosseiros.
Coerência de conduta é coerência de agir, pensar, fazer e dizer. É cometer menos erros e menos incoerências possíveis, e não apenas dizer que "erra, sim". É muito fácil cometer erros grosseiros e gravíssimos e tentar sair imune disso com falsa autocrítica, tão cruel quanto a falsa modéstia.
São essas posturas contraditórias, de erros gravíssimos e falta de autocrítica, de mistificações e falsa razão, que mancham o "espiritismo" brasileiro com sua preocupante porção de grandes irregularidades. Não é o discurso bonitinho clamando por uma coerência e fidelidade que nunca se faz que irá resolver a grave crise do "espiritismo" brasileiro. A retórica fácil só piora as coisas.
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