domingo, 5 de julho de 2015

"Espíritos de luz" e "irmãozinhos sofredores" no mesmo teatro "espírita"


Niterói, 1984. No Centro Espírita Ismael, no Barreto, depois de uma reunião doutrinária, com alguns supostos médiuns sentados ao redor de uma mesa retangular, um deles começa a supostamente incorporar um espírito considerado negativo.

Esse suposto espírito dá o seu depoimento, aparentemente declarando algum ódio ou adversidade contra um dos presentes, que previamente fez sua consulta para expor o seu problema. O modo de falar do suposto obsessor é agressivo, e ele responde a um dos membros do grupo "espírita", tentando justificar sua raiva.

A pessoa que o interroga, geralmente uma mulher, tenta acalmar o "espírito", procurando persuadi-lo que não é com o ódio que ele irá se sentir feliz. Depois de alguns minutos entre perguntas e apelos de persuasão, o "espírito" acaba chorando, infeliz, e, em seguida, agradece a Deus depois de receber as orações dadas pela interrogadora, antes de ir embora e o "médium" retornar à consciência.

O "drama" exposto tem algo de duvidoso, uma vez que é sempre a mesma encenação de um suposto espírito obsessor que faz seus comentários endurecidos, mas sempre cede quando a pessoa que o interroga, depois de algum tempo, encerra a conversa com uma oração. O "espírito" reage com aparente comoção e agradece a Deus por ter "aprendido a lição".

No "espiritismo" brasileiro, costuma-se criar um maniqueísmo semelhante ao do Catolicismo. Se o Catolicismo mostra o "céu", ou "paraíso", e o "inferno", o "espiritismo" cria os "mundos superiores" e o "umbral", este alvo de uma interpretação bastante controversa.

Para alguns, o "umbral" seria o que os católicos entendem como o "inferno", zonas da mais baixa evolução espiritual e dotada de almas grotescas governadas por uma figura que denominam Diabo ou Demônio, e que, segundo sua crença, seria a personificação de um anjo que vivia no Céu e cometeu algum deslize sério.

Para outros, o "umbral" seria uma espécie de "purgatório", ambiente que os católicos entendem como "intermediário" entre o "céu" e o "inferno". Neste caso, o "umbral" não seria a zona de espíritos "trevosos" (alegoria a "treva", falta de "luz" dos espíritos de condição moral mais baixa), mas de espíritos "penitentes" que precisam sofrer muito para atingir a evolução.

Em relação ao Nosso Lar, suposta colônia espiritual divulgada por Chico Xavier, também existem controvérsias. Algumas interpretações definem como equivalente ao "paraíso", como um ambiente assistencial de preparação para espíritos "felizes" aos quais restariam algumas missões na Terra para completar o ciclo evolutivo.

Outras interpretações, no entanto, entendem Nosso Lar como o "purgatório", ambiente ainda de trabalhos e ajustes de evolução moral. Há um aspecto estranho, no livro que leva o nome da suposta colônia, lançado em 1943, que são os conflitos que envolvem a colônia e o "umbral", estranhamente vizinhos e ambos localizados sobre o Estado do Rio de Janeiro (!).

Há até mesmo uma rebelião entre os pacientes da colônia, que se revoltavam pela dieta que recebiam, dotada de alimentos considerados "saudáveis", enquanto reivindicavam o fornecimento de alimentos gordurosos ou açucarados, típicos da junk food. Gozado haver tantos aspectos materiais "seguramente descritos" num mundo tido como espiritual.

Quanto às naturezas de evolução espiritual que o "espiritismo" brasileiro descreve em sua ideologia, observa-se dois tipos principais, os considerados "mais evoluídos", chamados de "espíritos de luz" - que certas interpretações identificam como uma analogia livre aos "santos" católicos - e os "menos evoluídos", considerados "espíritos trevosos".

Os "espíritos de luz" seriam aqueles que se encaixam nos critérios de "bondade máxima" acreditados pelos "espíritas". Foi uma pessoa que sofreu demais e foi premiada pela recompensa da "evolução" ao morrer, depois de ter atribuído para si o fim de uma missão que ocorreu em diversas vidas.

Para os seguidores do "espiritismo", Chico Xavier seria exemplo de "espírito de luz", uma tese bastante equivocada. Afinal, Chico foi associado a uma série gravíssima de irregularidades e causou confusões sérias demais para ser considerado nesta condição, estando mais próximo de um espírito mediano e ordinário que, com certeza, reencarnou para aprender mais coisas na vida.

Os "espíritos trevosos", frequentemente confundidos com "espíritos obsessores", são aqueles de nível moral bastante grosseiro, são agressivos, mórbidos ou zombeteiros. Os "espíritas" costumam usar eufemismos como "irmãozinhos sofredores" ou "amiguinhos não-esclarecidos" para defini-los.

O grande problema é que o "espiritismo", pelas suas inúmeras e preocupantes irregularidades, torna-se na verdade uma religião prejudicial, em que "espíritos de luz" e "espíritos trevosos" não passam de atores de um mesmo teatro, encenando um aparente maniqueísmo que não passa de conversa para boi dormir e garantir plateias lotadas e grandes lucros para os "espíritas".

Nos tratamentos espirituais, muitas pessoas, em vez de contrair soluções e boas energias para resolver seus problemas, atraem novos problemas, muito mais graves, e até mesmo encrencas pesadas e infortúnios assustadores.

Quando se queixam de tais ocorrências, os sofredores "assistidos" por esses tratamentos ainda recebem dos "espíritas" o comentário hipócrita de que os tratamentos "estão dando certo, sim", mas "os irmãos sofredores é que não entendem e querem atrapalhar", dando a promessa de que, "com mais oração" os infortúnios possam desaparecer.

Mas eles não desaparecem, mas crescem e pioram. Multiplicam-se as más ocorrências e surgem até obstáculos pesados para as soluções. E aí a coisa fica como no caso da droga que não dá mais prazer, que obriga a pessoa a se drogar mais para recuperar o deleite dos primeiros consumos.

As pessoas são assim induzidas a rezar mais, a ir para mais doutrinárias, a ouvir palestras de Divaldo Franco, ler livros "espíritas", orar, orar e orar, até o momento em que a pessoa deixará de fazer qualquer coisa e só ficar orando.

Isso cria uma histeria severa e faz com que a pessoa, para tentar alguma solução, se torne beata religiosa, criando um fanatismo quase debiloide, se enlouquecendo com crenças místicas exageradas, com uma nervosa euforia de adoração religiosa aos ícones "espíritas", uma devoção que tem mais de doentia, porque alucinada e neurótica.

Daí que isso se torna terrível. E mostra o quanto "espíritos de luz" e "irmãozinhos sofredores" não são mais do que dois lados de uma mesma moda, apenas atores de um mesmo espetáculo "espírita", cúmplices no aliciamento de novos fiéis, seja "por amor ou pela dor", como dizem os "espíritas". De preferência, que seja pela dor, através dos infortúnios impostos em suas vidas.

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