quinta-feira, 13 de abril de 2017
O maior drama dos "espíritas" brasileiros
O "movimento espírita" brasileiro fez o que quis com o legado de Allan Kardec e continua fazendo. Desfigura seus postulados com igrejismo extremado e, mesmo assim, se arroga em se autoproclamar "absolutamente fiel" aos ensinamentos kardecianos.
A falsa sabedoria, a presunção de posse da verdade, o moralismo, a ilusão de se achar que sabe tudo, esses vícios todos não são privilégio de "casas espíritas" de quinto escalão, mas de gente tida como "tarimbada", "sábia" e "verdadeira unanimidade".
É só perceber, por exemplo, a grande aberração dos "médiuns" que se dotam de culto à personalidade. Muita gente ingênua imagina que o "culto à personalidade" se limita só às pessoas que adotam postura agressiva e riem como se fossem candidatos políticos se achando vencedores por antecipação.
Não. O trabalho de médium foi deturpado violentamente por pessoas que oficialmente são tidas como "sábias" e "do mais elevado caráter". Nos tempos de Allan Kardec, médium era apenas um ofício eventual de aristocratas modestos que apenas faziam a tarefa de se comunicar com os mortos e transmitir mensagens deles aos interessados em recebê-las.
Os médiuns do tempo de Kardec eram discretíssimos, quase anônimos. Mas o que vieram a ser "médiuns" no Brasil têm o maior cartaz, alimentam o sensacionalismo, se aproveitam do assistencialismo (um tipo de atitude socialmente condenável, por ser uma "caridade" tendenciosa) e dos apelos à emoção (Ad Passiones, tipo de falácia) para convencer com surpreendente facilidade a opinião pública.
Infelizmente, esse trabalho de manipulação foi bem-sucedido. Tanto que os "médiuns" viraram as maiores vitrines da deturpação do "movimento espírita", garotos-propaganda do igrejismo manifesto propositalmente em livros, até porque ninguém deturpa o Espiritismo sem querer com centenas de livros e palestras.
Os brasileiros se esqueceram dos alertas do espírito Erasto, sobre o fato de que os deturpadores farão apelos "em prol do amor e da caridade" para convencer as pessoas a aceitar suas ideias mistificadoras. Em vez disso, invertem os avisos do discípulo de Paulo de Tarso, alegando que "é certo que eles entendem mal o legado de Kardec, mas pelo menos praticam bondade".
É aquela coisa de prestar um mau serviço e depois apelar para uma aparente filantropia, que pouco realiza na transformação das pessoas. É um trabalho medíocre, que só serve de propaganda para o prestígio religioso dos anti-médiuns, é uma "caridade" mais para estimular a adoração dos fanáticos do que para realizar algum benefício porque, se tivesse causado, o Brasil não estaria nesta catástrofe social que hoje se vive.
Os deslumbrados seguidores dos "médiuns" até tentam separar a caridade da qualidade de vida, como se caridade não tivesse responsabilidade de trazer a prosperidade sócio-econômica das pessoas. Como assim? Caridade melhora a vida das pessoas ou não melhora? É uma grave contradição que desmascara a idolatria barata que elas sentem aos "médiuns" brasileiros.
ILUSÃO DE PRETENSA SABEDORIA E POSSE DA VERDADE
O grande mal do "espiritismo" como um todo é a ilusão de superioridade que corrompeu a doutrina, já manchada pela deturpação igrejista, com uma catolicização que no conjunto da obra desqualifica os ensinamentos kardecianos.
A "fase dúbia" não resolveu a situação e a ideia de criar um falso equilíbrio entre o igrejismo "espírita" - herdado de Jean-Baptiste Roustaing - e um suposto respeito aos postulados kardecianos, só fez piorar as coisas. Muitas vezes o igrejismo predominava na prática, por mais que, na teoria e nas letras "desencarnadas", se apele para o "respeito rigoroso aos ensinamentos da Codificação".
O maior drama do "movimento espírita" tornou-se a ilusão de pretensa sabedoria e posse da verdade. Os juízos de valor aos sofrimentos alheios, sob a desculpa dos "reajustes espirituais", já causaram danos morais e processos na Justiça. A pretensa sabedoria cria aberrações como os livros "Divaldo Responde" que não raro apontam "pretensas certezas" que depois são desmentidas sem dificuldade.
Palestrantes "espíritas" que num momento estufam o peito, "cobrando coerência de conduta" aos outros e, quanto a si, se considerando "exemplos de lucidez", se embaraçam depois e tentam desmentir o tempo todo o que disseram, e, na última esperança de não perder a posse da verdade, admitem que "erraram" como se isso lhe garantisse o passaporte para o Céu por tão tendenciosa mea culpa.
Esses palestrantes, em primeiro momento, são rígidos e taxativos na defesa do sofrimento alheio. "Aceite o sofrimento sem queixumes, ame o seu próprio prejuízo, porque assim obterá as graças futuras". Mas, depois, tentam enrolar dizendo que "não defendiam o sofrimento", que "queriam dizer apenas" que "as dificuldades extremas são desafios e aprendizados".
Esse drama, que revela a crise aguda da "fase dúbia" do "movimento espírita", causa um enorme desespero. "Espíritas" que faziam altos elogios a Emmanuel, ao igrejismo e à Teologia do Sofrimento agora apelam até para Paulo Freire, para espíritas autênticos como Deolindo Amorim, José Herculano Pires, Carlos Imbassahy, tentando se salvar da decadência.
Recorrendo aos mesmos apelos que geraram a "fase dúbia", o que indica que o "movimento espírita" hoje corre atrás do próprio rabo, seus palestrantes e escrevinhadores tentam evocar espíritas autênticos na tentativa de se salvarem da má reputação de deturpadores, e no pânico de perderem a credibilidade que obtém em suas bem remuneradas palestras e lucrativos livros, todos em tese "destinados à caridade".
A situação está insustentável, principalmente quando a única solução cai sempre na "fase dúbia", que é bajular Kardec e praticar igrejismo. Combater a deturpação e recuperar os postulados originais do Espiritismo já foi uma promessa de 40 anos atrás. Não deu certo e causou problemas. Usar a fórmula fracassada como solução dará sempre na mesma coisa. Não seria melhor os "espíritas" brasileiros, ao menos, assumirem seu vínculo com as ideias de Jean-Baptiste Roustaing?
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