quinta-feira, 15 de junho de 2017

"Espiritismo" e desinformação no Brasil


O Brasil virou o paraíso da pós-verdade, na qual o poder midiático se utiliza para criar uma "realidade paralela" que, mesmo com muitas contradições, cria uma falsa lógica que dá no grande público a falsa impressão de uma "realidade objetiva e imparcial".

Constrói-se um discurso no qual se misturam alhos com bugalhos e tarefas humanas são descritas de maneira confusa e contraditória, servindo-se do apelo à emoção para legitimá-las nesta forma completamente fora da lógica, do bom senso e, muitas vezes, sob o risco de lesar milhares e milhares de pessoas.

Uma dessas confusões permitiu o estrelato do juiz Sérgio Moro, alvo de uma compreensão confusa e cheia de falhas. Mesmo sendo apenas um juiz de Direito, Moro tinha atributos estranhos, podendo bancar advogado, xerife ou mesmo um tira urbano das produções de Hollywood. E essa visão maluca era servida pela grande imprensa, tida como "reduto máximo da objetividade, da imparcialidade e da transparência".

No "espiritismo", o que se vê é que a figura do "médium" virou uma grande aberração. "Coisa de louco", como diria o anedotário popular. O "médium" virou uma coisa monstruosa de apelo sensacionalista e um propagador de valores igrejeiros dos mais conservadores, mas rotulados de "valores positivos de caridade plena", um discurso que lembra muito o Catolicismo medieval nos seus primórdios, antes de cair a máscara de ferro das cruzadas e das condenações sangrentas.

Primeiro, o "médium" deixou de ter o valor intermediário da comunicação entre vivos e mortos. Depois, passou a ser o centro das atenções, sofrendo o culto à personalidade. Virou dublê de pensador e filantropo, veiculando ideias prolixas e mistificadoras e apenas ajudando pouca gente, mais preocupado de desenvolver uma "bondade" que lhes dê mais cartaz do que progresso social aos necessitados.

A desinformação deixa as pessoas caírem não só no ridículo. Ela também faz com que as redes sociais virem redutos de burrice e fanatismo extremo, quando compreensões equivocadas da realidade se tornam ferrenhamente defendidas, sob pena de ofensas, chantagens e ameaças.

No "espiritismo", seguidores dos "médiuns" deturpadores da Doutrina Espírita chegaram a recorrer da carteirada para ofender quem questionava esses ídolos religiosos. "Quem é você para falar alguma coisa sobre Chico Xavier?", disse uma "espírita" fanática a uma questionadora da deturpação.

A desinformação vem até mesmo de revistas que prometem didatismo para explicar certas coisas e explicam tudo errado. Um mercado editorial marcado pelo pedantismo e pelos dados superficiais e estereotipados, não raro misturando meias-verdades com fatos verídicos, num engodo jornalístico que serve mais para confundir as pessoas.

Por exemplo, há um volume da revista Ciência & Foco intitulado "Espíritos", nos quais cita a ideia de glândula pineal. Vão atribuir o "pioneirismo" ao fictício "André Luiz", quando sabemos que o assunto era fartamente discutido desde o século XVI e de maneira ainda mais sistematizada desde 1928.

Se acadêmicos "espíritas" alegam que a literatura referente à glândula pineal nos anos 1940 - sendo 1945 o ano de Missionários da Luz, livro que Chico Xavier publicou atribuindo ao fictício médico - era "escassa e conflituosa", cometeram eles dois graves equívocos:

1) Eles apenas pesquisaram o que lhes estava disponível dentro de seus lugares de pesquisa. Além disso, mesmo que a bibliografia fosse escassa, isso não significava que o tema não era debatido nos bastidores do mundo científico. Quanto ao outro aspecto, é da natureza científica ser conflituosa, porque se trata de um embate de ideias e discussão de hipóteses.

2) Eles atribuíram o "pioneirismo" de André Luiz em 1945 a descobertas sobre a glândula pineal em 1958 e em 2008 quando se sabe que essas descobertas, na verdade, eram objetivos cogitados bem antes de Missionários da Luz, levando em conta hipóteses que podem ter sido tardiamente divulgadas, mas cujo debate, nos bastidores da Ciência, é coisa muitíssimo antiga.

O "espiritismo", tão tido como "defensor do Conhecimento", se deixa valer por tais desinformações. E outro aspecto foi a risível atribuição a Chico Xavier pelo suposto pioneirismo da descoberta de água em Marte, em 1935 em relação a descobertas recentes realizadas em 2004, porque o assunto já era velho na década de 1930 e fartamente debatido no século XIX. O astrônomo estadunidense Percival Lowell falava do assunto bem antes do "médium" brasileiro nascer.

No final da vida, o radialista "espírita" Gerson Simões Monteiro cometeu uma grande gafe ao atribuir tal pioneirismo da "vida em Marte" a Chico Xavier. Foi algo que se valeu apenas por causa da desinformação das pessoas, que nunca ouviram falar da verdade a respeito dos debates que aconteceram no meio científico em torno da existência de água em Marte.

A desinformação faz com que as pessoas tendam a possuir uma compreensão umbiguista, fora da realidade do planeta e que causaria arrepio nas pessoas mais informadas e inteligentes do Primeiro Mundo. E no caso do "espiritismo", cria-se uma realidade paralela na qual uma literatura fake é tida como "autêntica", pinturas falsificadas são tidas como "verdadeiras" e informações equivocadas e fictícias são dadas como "realistas".

E tudo isso, pasme, tem como pretexto o "pão dos pobres", que permite qualquer mentira e mistificação. O pior é que as pessoas, tomadas de um perigoso transe emocional, o das paixões religiosas, ainda não suportam que se questione isso, contentes em ver o "espiritismo" criar e manter uma realidade paralela onde aberrantes atentados à lógica e ao bom senso são tidos como "verdades indiscutíveis". Depois dizem que são "rigorosamente fiéis" aos ensinamentos de Allan Kardec.

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