segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Rio de Janeiro e a tirania do conformismo

GATO PULANDO NUMA SALA - BOBAGENS "ENGRAÇADAS" TORNARAM-SE MAIS IMPORTANTES DO QUE QUESTIONAR O "ESTABELECIDO".

O Brasil tornou-se o país em que pessoas perdem tempo vendo, na Internet, bobagens "engraçadas" com animais. É o país da imbecilização musical e da leitura de "livros para colorir", que surrealmente aparecem nas listas de mais vendidos, ocupando posições que deveriam ser para livros de textos, é óbvio. É o país em que as pessoas se destacam mais por contar piadas de um jeito mais "esperto".

O que assusta mais ainda é que os atrasos se concentram agora nas regiões Sul e Sudeste, em que esse quadro de alienação cultural se torna mais intenso e preocupante, não só pelo inconsciente coletivo apegado ao consumismo e à falta de senso crítico, mas também pela ilusão de prosperidade e estabilidade que tentam atribuir a isso.

No Rio de Janeiro, em que os retrocessos acontecem intensamente a todo momento, seja a violência exacerbada que agora acontece plenamente à luz do dia, seja o autoritarismo político dos governantes, seja a degradação cultural do "funk", seja o fanatismo no futebol, seja no consumismo passivo de produtos e mercadorias cada vez mais caros e com qualidade cada vez pior.

Mas o que mais assusta é que no Rio de Janeiro e, em parte, outros Estados do Sul e Sudeste, as pessoas não suportam questionadores. Elas se afastam quando alguém passa a contestar além da conta. O Brasil regrediu demais, mas parte desses retrocessos tem que ser aceita para o suposto bem da aparente "paz social", a "paz sem voz" que conforta multidões.

O ideal é que as pessoas busquem "válvulas de escape" e há quem acredite que, na guerra cotidiana, os "abrigos anti-aéreos" são os bares, as boates, as igrejas e os estádios de futebol. O Rio de Janeiro pode até se destruir, desde que qualquer dos quatro times cariocas - Flamengo, Fluminense, Vasco e Botafogo - , de preferência todos eles, vençam sempre suas partidas.

Isso para não dizer o refúgio nas mídias sociais, sobretudo no WhatsApp, em que as coisas "mais importantes" que são vistas são bobagens "engraçadas" envolvendo animais, seja gato dando cambalhota, cavalo rindo com seus dentes, porco brigando com ganso etc. Ou então é criancinha dublando cantor veterano, que transforma qualquer desocupado em "youtuber" (astro do YouTube).

RIO VIVE A TIRANIA DO CONFORMISMO

O Rio de Janeiro tornou-se, hoje, o Brasil levado às últimas consequências. Virou o foco de pessoas não apenas conformistas, mas intolerantes com quem leva adiante a contestação, quando ela deixa de ser uma reclamação dada pelas costas para se tornar um texto a ser publicado para o mundo ver através de um blogue.

Aí, o contestador do "estabelecido" perde amigos um por um. É boicotado em muitos espaços sociais. É barrado em muitas oportunidades de emprego. É visto como "arredio" e "chato" até por aqueles que sentiam simpatia por ele. E, à menor polêmica nas mídias sociais, ainda tem sua conta invadida por mensagens ofensivas pelos chamados troleiros (trolls).

Ou seja, o Rio de Janeiro se tornou o lugar em que o conformismo virou uma grande tirania. Até antigos contestadores do "estabelecido" mudaram o discurso e passaram a aceitar retrocessos em troca de um benefício aqui e ali. Finge que o retrocesso "veio para ficar" e se consola indo com seus amigos para boates e bares jogar conversa fora e "debater" amenidades.

É claro que há ecos disso em São Paulo, Minas Gerais e Paraná, por exemplo, e isso reflete até no interior desses Estados, não bastasse nas capitais. Mas é no Rio de Janeiro que a tirania do conformismo tornou-se um processo cruel de discriminação social, em que aqueles que contestam mais do que três problemas corriqueiros passam a ser rejeitados como se fossem "perigosos" para a paz social de hoje.

É um conformismo arrogante, diante da postura um tanto hipócrita e tendenciosa, vinda até mesmo de pessoas com razoável formação cultural. E faz com que pessoas antes admiráveis decepcionassem por posturas complacentes aqui e ali. De repente, virou obrigação "ficar de bem com a vida" a qualquer preço.

As pessoas se tornaram fechadas. Os cariocas, sobretudo, se isolaram na bolha de plástico do entretenimento e consumismo plenos. Se irritam quando há mais questionamentos, e se refugiam nas boates em que, alegremente, fazem selfies cheios de felicidade para publicar nas mídias sociais.

E isso num contexto em que cariocas vão tomar chope rindo dos assuntos criminais do dia. Parecem que estão falando de programas cômicos, quando estão narrando tiroteios em UPPs e assaltos à luz do dia. Claro, não é com eles que isso ocorre. Não são seus bares os alvos prováveis de chacinas ou balas perdidas e não são eles que perdem entes queridos pela violência e por acidentes de trânsito.

Mas também é o Estado em que cidadãos chamam a presidenta Dilma Rousseff de "bandida", "nazista", "prostituta", "velha nojenta" e outras humilhações e internautas despejam comentários racistas nas mídias sociais sem ter noção de que podem ser presos em regime fechado (sem poderem sair da prisão) por causa disso.

Ver que a regra tornou-se se adaptar aos inúmeros retrocessos porque temos que "ser positivos" é preocupante. Ver que pessoas que questionam demais o "estabelecido" são socialmente discriminadas é assustador. E mostra o quanto o conformismo, antes meramente uma "zona de conforto" como tantas outras na vida dos brasileiros, virou uma tirania imposta pelos cariocas.

E assim a falta de questionamentos profundos faz com que se permita crescer a corrupção e o negocismo, que cada vez se tornam mais sofisticados e se inserem em contextos em que não se imaginava haver conchavos e negociatas. Mais confortável é esquecermos tudo isso e prestarmos atenção a vídeos com animais dando piruetas no WhatsApp.

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