terça-feira, 3 de março de 2015

Chico Xavier e a "felicidade" da Copa de 2002

RICARDO TEIXEIRA - O brasileiro que realmente ficou feliz no dia em que Chico Xavier morreu.

Consta-se, quando Francisco Cândido Xavier faleceu, em 30 de junho de 2002, que veio à tona uma antiga declaração do anti-médium mineiro, de que ele morreria no dia de muita felicidade para o Brasil.

A Seleção Brasileira de Futebol venceu pela quinta vez uma Copa do Mundo, vencendo uma partida contra a Seleção da Alemanha (que "daria o troco" numa humilhante derrota em 2014). Mas o time brasileiro nem de longe teve um desempenho confiável ou exemplar, tendo feito, justamente na Copa do Mundo de 2002, no Japão e na Coreia do Sul, a pior campanha de sua carreira.

A seleção jogou mal tanto nas partidas preparatórias para a Copa de 2002 no ano anterior, quanto em todo o evento, com incidentes que incluíram irregularidade de um juiz coreano em favor dos jogadores brasileiros e um desempenho desastroso contra a Seleção da Inglaterra quando Ronaldinho Gaúcho perdeu a cabeça e foi expulso do campo. Os brasileiros, apesar disso, venceram a partida.

A vitória da Seleção Brasileira de Futebol em 2002 teve um sabor de derrota. Mais tarde, quando livros sobre a corrupção do futebol revelaram os bastidores do esporte, soube-se que a "histórica vitória" de 2002 não foi mais do que uma armação montada por Ricardo Teixeira e João Havelange para alavancar seu poder, respectivamente, na CBF e na FIFA.

É só ler os livros O Lado Sujo do Futebol, de Amaury Ribeiro Jr., Luiz Carlos Azenha e outros, e Jogo Sujo e Um Jogo Cada Vez Mais Sujo, estes dois livros do repórter britânico Andrew Jennings, para perceber as negociações e acordos que vão desde manipulação de resultados de partidas a compras de dirigentes esportivos regionais.

A "vitória brasileira" foi um resultado que mais serviu aos interesses dos dirigentes esportivos do que aos torcedores de futebol, enganados pela mídia esportiva que exaltava uma equipe insegura, sem jogadas confiáveis, com jogadores "estrangeiros" (que jogavam em clubes fora do Brasil) que não tinham entrosamento entre si

As vitórias em partidas só ocorreram por uma questão de "sorte". Ou não seria "$orte"? Em todo caso, o "penta do Brasil", aliado ao falecimento do dito "maior líder espírita" do país, representa a tese tendenciosa de um país supostamente destinado a ser o "Coração do Mundo".

E A VIOLÊNCIA DAS TORCIDAS?

Para o "espiritismo", os torneios mundiais de futebol seriam uma forma do Brasil promover a "solidariedade dos povos", mostrando a aparente hospitalidade brasileira que impulsionaria a nação a se ascender na comunidade das nações por conta dessa "lição de fraternidade".

Com base nessa tese, leva-se a crer que o futebol, não bastasse ser um entretenimento supervalorizado pela grande mídia, seria, a partir das pregações de Chico Xavier, uma das chaves para impulsionar o Brasil para a liderança mundial, graças ao mito de que o futebol seria uma forma de promover a fraternidade, a cidadania e o desapego aos instintos criminosos.

Então tá. Mas essa tese não consegue explicar por que existem "irmãozinhos sofredores" que se reúnem em torcidas organizadas para cometer vandalismos e atos de violência , não raro homicidas. Os chiquistas, neste caso, fazem o coro dos porta-vozes do cartolato eletrônico, fantoches televisivos de Ricardo Teixeira e similares, alegando que esses truculentos "não gostam de futebol".

Isso, além de ser um grande equívoco - as torcidas organizadas gostam de futebol, sim, até mais do que qualquer coisa na vida - , cria um preconceito cruel contra quem não curte futebol, que é visto como "socialmente intolerante", "psicologicamente problemático" e "chato", para não dizer coisas bem piores.

Como é que o "espiritismo" poderá explicar como os "irmãozinhos sofredores" das torcidas organizadas querem impedir o "espetáculo da fraternidade" que transformará o Brasil na "nação mais iluminada do planeta" é algo que fica muito complicado.

Mas no rol de surrealismos que envolve o "espiritismo" brasileiro, Chico Xavier, falecido 14 anos depois do falecimento de Abelardo Barbosa, o Chacrinha, foi realmente o homem que veio para confundir e não para explicar.

Coitado do falecido apresentador, que era bem menos complicado do que o anti-médium, este marcado pelo jogo de contradições que transformou Chico Xavier em um quase deus, endeusado às custas da exposição sensacionalista e exótica de suas fragilidades.

FELICIDADE?

Que "felicidade" sugere uma campanha de futebol da Seleção Brasileira? A ilusão de que o futebol necessariamente tira jovens e crianças da criminalidade, e promove a solidariedade dos diferentes povos do planeta tem caraterísticas bastante duvidosas para tais pretensões virtuosas.

Primeiro, porque nos bastidores do futebol, conforme o jornalismo investigativo revelou, aponta para esquemas de corrupção que envolvem até associações com a Máfia, além de um grande esquema de roubalheira que alimenta fortunas através de esquemas que envolvem até empresas "fantasmas".

Segundo, porque a própria natureza competitiva do futebol estimula rivalidades e cria nos jogadores práticas que envolvem até uso ilegal de estimulantes, que é o doping. Sem falar que o estrelato revela depois a tentação do álcool, do qual o jogador brasileiro Mané Garrincha e o inglês George Best são dois exemplos trágicos, e drogas, do qual o argentino Diego Maradona é um exemplo.

O fanatismo esportivo é um efeito da histeria que o futebol causa no Brasil, com a pressão midiática que envenena os instintos dos torcedores. E que mostra o lado infeliz que pouco tem a ver com "irmãozinhos sofredores que não gostam de futebol" e usam o esporte para agredir inimigos, mas com a natureza do futebol como um ninho de rivalidades e competições nem sempre justas.

Daí que não dá para usar o futebol para confirmar as supostas previsões de Chico Xavier de que, a partir de espetáculos como a Copa do Mundo de 2014, o Brasil construiria a sua missão mundial de promover a solidariedade e a fraternidade. O que o referido evento da FIFA fez foi apenas criar mais crise entre tantas que assolam o nosso país.

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