quarta-feira, 29 de junho de 2016

"Escola Sem Partido" faz os brasileiros pensarem sobre valores retrógrados da Educação


Recentemente, numa comunidade de ateus nas mídias sociais, um integrante - talvez um religioso "espírita" e deísta entusiasmado que só entrou nela para fazer proselitismo e "converter" as pessoas - chegou a defender o anti-médium baiano Divaldo Franco sob o pretexto de que ele, tido como "maior filantropo do Brasil", tinha um "revolucionário" projeto educativo na sua Mansão do Caminho, em Salvador.

Tal alegação é duvidosa se confrontarmos com os fatos que a realidade mostra, com a Mansão do Caminho não chegando a beneficiar 1% da população de Salvador e muito menos a população brasileira, como um todo e seu projeto educacional segue o mesmo modelo inócuo e paliativo de ensinar apenas coisas básicas e, no recheio, transmitir dogmas religiosos.

As pessoas acabam entendendo mal e invertendo as coisas. Veem como "transformador" um método educacional que possui o manto religioso e manipula as pessoas com crenças e ritos dissimulados pelas tarefas de ensinar a ler, escrever e trabalhar. E veem como "manipulador" um método educacional que estimula o questionamento e a mobilização social, ensinando as pessoas a pensar criticamente a vida e não aceitar tudo de mão beijada.

Como é que um igrejeiro como Divaldo Franco, que, a exemplo de Francisco Cândido Xavier, o festejado Chico Xavier do catolicismo enrustido do "movimento espírita", prega conformação no sofrimento e desaconselha o senso crítico, é considerado "mais transformador" que Paulo Freire, que priorizava o raciocínio questionador e a busca das pessoas de superar a pobreza e a ignorância pelo ativismo e pela mobilização?

Diante desse quadro estarrecedor, em que a educação que manipula é vista como "não-manipuladora" e vice-versa, um fato político veio à tona para mostrar os equívocos que estão por trás do mito da educação "transformadora" que vive sob a sombra da religiosidade.

Trata-se de um engodo chamado "Educação Sem Partido", uma farsa arquitetada pelos setores da sociedade organizada que foram os mesmos que se manifestaram vestidos de verde e amarelo nas passeatas contra a presidenta Dilma Rousseff.

Exposto por Alexandre Frota - famoso ator que fez sucesso nas novelas Roque Santeiro e Sassaricando, que depois virou ator pornô e atualmente é evangélico - ao lado do líder do movimento Revoltados On Line, Marcello Reis, ao ministro da Educação do governo Michel Temer, Mendonça Filho, o projeto reflete o contexto de uma sociedade reacionária em ascensão.

Alexandre Frota faz parte de uma legião de famosos que passaram a apresentar pontos de vista bastante reacionários e superestimaram o direito de fazer oposição aos governos do Partido dos Trabalhadores com um ódio cego e intolerante.

Além de Frota, militam pela "causa" nomes como os roqueiros Lobão e Roger Moreira (da banda Ultraje a Rigor), o comediante Danilo Gentili, jornalistas como Reinaldo Azevedo, Diogo Mainardi, Guilherme Fiúza, Eric Bretas, Merval Pereira e Diego Escosteguy, a apresentadora e também jornalista Rachel Sheherazade, a ex-jogadora de volei Ana Paula, o ator Thiago Lacerda e os escritores Luiz Felipe Pondé, Rodrigo Constantino, Marco Antônio Villa e Olavo de Carvalho.

PATRULHAMENTO IDEOLÓGICO NA ESCOLA "SEM IDEOLOGIAS"

O projeto "Escola Sem Partido" consiste em criar um projeto pedagógico "neutro", asséptico, no qual os professores estão proibidos de estimular o raciocínio crítico nas escolas, além de serem recomendados a evitar a discussão de problemas cotidianos e de transformações sociais que permitem a ascensão social de negros e a legitimidade social das relações homossexuais.

Em São Paulo, já se aplica esse projeto ideológico tido como "sem ideologias" em algumas escolas. Diante da sede arrivista das forças reacionárias no Brasil, que torcem para que Dilma Rousseff seja definitivamente afastada do poder em agosto próximo, o medo é que esse projeto educacional, que mais parece digno da ditadura militar, seja implantado em todo o país e passe a deformar gerações e gerações de cidadãos.

A ditadura militar já deformou gerações inteiras de cidadãos por conta de projetos educacionais voltados somente para o mercado, que mais desensinavam que ensinavam, transmitindo mentiras religiosas e até históricas, o que resultou nesse quadro que vemos com distorções alarmantes, do mercado de trabalho à cultura e ao entretenimento, tomados da mais assustadora mediocrização social.

O grande perigo é que esse projeto "Escola Sem Partido" leve às últimas consequências todo o método educacional da ditadura militar, que foi tão nocivo que chegou a enviar líderes estudantis menos perigosos para regiões distantes do país, isolados dos colegas, sob o pretexto de trabalharem o Projeto Rondon, fachada de educação em lugares distantes para desestruturar os movimentos estudantis contra a ditadura.

A "Escola Sem Partido" é, na verdade, um projeto partidarizado. Como "projeto de lei", é proposto, só para perceber o nível da coisa, por Jair Bolsonaro e seus familiares. Tem, na verdade, o selo do PSDB, PMDB, PP e PSC, entre outros associados, o que mostra que, só por ser pluripartidarizado, não significa que seja "apartidário".

Muito pelo contrário, esse projeto educacional "sem ideologias" tem muito de ideológico. Não quer expor questões ligadas a raça e gênero sexual, mas ensina valores de uma sociedade patriarcal e, sobretudo, teocrática, transmitindo uma ideologia que também se volta para o mercado, criando pessoas subservientes dentro de uma sociedade que é também tecnicista.

Um dos aspectos mais graves do "Escola Sem Partido" é a patrulha ideológica disfarçada de meios jurídicos. Professores podem ser denunciados pelos pais de alunos quando os docentes passarem a transmitir conhecimento e reflexão questionadora e adotarem métodos pedagógicos que escaparão do que as chamadas "boas famílias" esperam dos alunos.

Isso é gravíssimo. Os professores podem ter suas aulas gravadas a pedido dos pais e, se os profissionais de ensino transmitirem ideais humanistas e promoverem debates sobre problemas cotidianos, eles poderão ser processados judicialmente e serem demitidos ou receber outras punições. Por trás desse projeto "sem ideologias", há a defesa ideológica e o mecanismo de "caça às bruxas" para combater quem fuja do padrão asséptico-conservador do projeto "Escola Sem Partido"

Vivemos os tempos em que os concursos públicos, se valendo de um padrão moralista de estudo, em que a quantidade vale mais que a qualidade (estudar demais e aprender menos devido a sobrecarga de matérias e material), voltaram a exigir Matemática e Raciocínio Lógico a funções que nada têm a ver com isso.

Também vivemos os tempos em que o poder das universidades particulares aumenta e os cursos de pós-graduação se tornam cada vez menos gratuitos, mesmo em universidades públicas, afunilando cada vez mais a formação superior, uma vez que a pós-graduação hoje, em época de degradação do sistema de ensino, é a nova "universidade", já que a graduação universitária do Brasil medíocre tornou-se um novo "ensino médio", mais para high school que para nível superior.

O grande risco do projeto "Escola Sem Partido" é que valores ligados ao preconceito social, à supervalorização do mercado e ao proselitismo religioso serão ensinados, e estes são muito mais ideológicos e partidarizados do que a "escola marxista" que só existe nas mentes dos reacionários que querem o projeto educacional proposto ao governo Temer.

O Método Paulo Freire e outros métodos que, embora menos ousados, se empenhavam em favor da educação pública e ao desenvolvimento mental dos alunos não eram projetos ideológicos ou partidarizados. A histeria anti-comunista e anti-petista do reacionários de plantão é que inventou tudo isso, por não suportar projetos educacionais que estimulem pessoas a questionarem as injustiças existentes no mundo de hoje.

E vemos no "movimento espírita" a mesma atitude, embora de forma velada, Uma religião (que muitos se recusam a ver como tal) que acha "progressista" Chico Xavier dizer para os sofredores aceitarem as desgraças em silêncio e nunca revelar o sofrimento para outrem aceita qualquer coisa retrógrada como "positiva".

Talvez os "espíritas" estivessem rezando para que o projeto educacional ultraconservador, exposto por duas figuras estranhas ao meio pedagógico, incluindo um "revoltado" da Internet (logo os "espíritas" que tanto reprovam essa ideia de "revolta"), pelo menos seja "em favor da solidariedade e do amor ao próximo".

Daí o contexto vago de "solidariedade" e "bondade" como subprodutos da religião. Talvez os "espíritas" defendam com entusiasmo a "Escola Sem Partido", se ela pôr em prática o ensinamento de "valores cristãos".

Embora os "espíritas" não se misturem aos neopentecostais no conjunto da obra, eles se dão as mãos em muitas causas reacionárias, como o combate radical ao aborto. Até porque os "espíritas" já arrumam a "Lei de Causa e Efeito" para recomendar à estuprada que se case com o estuprador, já que a religião estabelece preceitos moralistas através do pretexto dos "resgates espirituais".

O grande problema é que o projeto "Escola Sem Partido" será um retrocesso para o Brasil, em níveis calamitosos. Ensinará mistificação religiosa, moralismo social, preconceitos de etnia, cor e gênero, valores mercantilistas que reforçam o egoísmo e a concorrência desleal, e criará uma grande marcha-a-ré social para o país, criando gerações bem mais deformadas que as educadas pela pedagogia ditatorial. O partido da Escola do Partido é a degradação do Brasil.

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