segunda-feira, 9 de janeiro de 2017

Surtos fascistas e preconceitos sociais no Sul e Sudeste preocupam o Brasil


Algo preocupante ocorre no Brasil e contradiz - ou melhor, "corrobora", se abrirmos mão de abordagens oficiais - a "profecia" de Francisco Cândido Xavier sobre os rumos sociais e políticos em ocorrência no país. É a ascensão do fascismo e a liberação dos preconceitos sociais que mostram que nossas elites estão cada vez mais psicopatas.

Quando falamos "corrobora", é porque o "projeto" do "Brasil Coração do Mundo" revela uma perspectiva totalitária, e, partindo de um Chico Xavier que havia defendido a ditadura militar, na sua pior fase, para milhares de telespectadores - e, recentemente, para milhões e milhões de internautas no mundo inteiro - revela o lado obscurantista do "espiritismo" brasileiro.

Para quem não sabe, a "profecia" da Data-Limite, embora tenha uma roupagem "futurista" e "filosófico-cientista" por parte de seus divulgadores, Geraldo Lemos Neto e Juliano Pozati, revela um projeto roustanguista que claramente remete ao projeto da "religião-síntese", a "religião espírita" (Catolicismo medieval redivivo) de Os Quatro Evangelhos de Jean Baptiste Roustaing.

A reboque disso tudo, há a perspectiva sombria de que uma "religião unificadora", repetindo o exemplo do Catolicismo na Idade Média, se transforme num sistema político-religioso totalitário, que tantas atrocidades e tantos genocídios fizeram contra a humanidade. E nada disso estava escrito no roteiro, porque todo movimento totalitário sempre se apresenta pelo seu aspecto positivo, omitindo o problema maior, que são os "obstáculos" a serem combatidos.

O "espiritismo" cada vez mais mostra sua vocação ultraconservadora. Publicações "espíritas" definem os protestos anti-Dilma que ocorreram em 2015 e 2016 como "libertadores" e "símbolos da regeneração da humanidade", chegando ao ponto de atribuir a tais manifestações uma suposta intuição de "espíritos benfeitores" ou "de considerável elevação moral".

Só que essas manifestações, se sabe, demonstram não uma "regeneração", mas uma "degeneração". Sinais da mais baixa evolução espiritual se observam facilmente, a partir de nomes como "Revoltados On Line" - logo os "espíritas", que dizem contra a revolta, apoiam tais manifestações - , do endeusamento de facínoras como Jair Bolsonaro, da exibição de suásticas nazistas e de cartazes vingativos pedindo intervenção militar ou pregando a morte aos petistas.

Ver que o "espiritismo" brasileiro está apoiando os movimentos fascistas é o cúmulo de sua trajetória de deturpações tão vis e tão deploráveis, desde que Chico Xavier ofendeu as humildes vítimas do incêndio num circo em Niterói e esculhambou os humildes operários e camponeses no Pinga Fogo da TV Tupi, mesmo programa no qual defendeu abertamente a ditadura militar, naquela época muito mais cruel e repressiva.

Ver que tínhamos que orar por gente como o coronel Brilhante Ustra, que estava construindo um "reino de amor" assassinando acusados de subversão, num contexto em que gente honesta era presa e levada à tortura e morte até quando denunciada levianamente por um desafeto, bastando uma pequena desavença para o dedo-duro de ocasião entregar o outro para os "anjos da morte", é assustador.

Numa época de pós-verdade (mentiras veiculadas como "verdades indiscutíveis"), pós-ética (desonestidades socialmente aceitáveis) e pós-lógica (teses ou opiniões sem pé nem cabeça que viram "certezas absolutas" e "fatos comprovados"), é assustador a ascensão do fascismo e a liberação dos preconceitos sociais não só nas redes sociais, mas também vindos de gente famosa e gabaritada.

Pessoas como o empresário Flávio Rocha (da rede de lojas Riachuelo), o publicitário baiano de "alma paulista-carioca" Nizan Guanaes, o diretor teatral Cláudio Botelho e os roqueiros Lobão e Roger Rocha Moreira (Ultraje a Rigor) passaram a defender abertamente preconceitos sociais contra pobres e mulheres. Por outro lado, internautas despejam ofensas racistas desconhecendo que isso é crime, ou acreditando que a lei não irá prendê-los por prática de "brincadeiras inocentes".

Há casos de pessoas espancando políticos de esquerda, xingando músicos progressistas, agredindo mulheres nas ruas. Recentemente, dois homens que perseguiram um travesti espancaram até a morte um vendedor que o defendia, numa estação de Metrô em São Paulo. Mais tarde, um homem matou 12 pessoas numa festa de Ano Novo em Campinas. Recentemente, um motoqueiro agrediu uma jornalista do portal Vermelho, em São Paulo.

Isso são só alguns dos inúmeros episódios. Enquanto isso, no cenário político, há quem queira censurar a Internet e calar as vozes contrárias ao cenário político obscurantista e confuso de Michel Temer, que quer porque quer manter seu projeto e até pessoas nefastas como o ministro da Justiça, Alexandre de Moraes, mesmo com a grave crise penitenciária.

Esta crise, já anunciada pela rebelião de presos em Pedrinhas, na cidade de São Luís, no Maranhão. eclodiu com a chacina de um presídio em Manaus, Amazonas, e outro em Boa Vista, Roraima, revelando organizações criminosas que tiveram raiz na ditadura militar, quando presos políticos e bandidos perigosos conviviam juntos na mesma cela, o que fazia os bandidos aprenderem macetes de organização política.

O Brasil está numa situação extremamente vulnerável e não será um débil otimismo religioso que irá resolver essa tragédia. O discurso religioso dos "espíritas" indica a ideia de que a "melhor forma" de resolver o problema é esquecê-lo, o que se revela um equívoco. "Esquecemos" demais de deixamos a situação piorar cada vez mais.

Os movimentos fascistas e os surtos elitistas revelam a reação furiosa de setores sociais retrógrados, antes detentores dos mais plenos privilégios sociais. Muitas dessas pessoas, antes símbolos de prestígio social impecável, se mostram desequilibradas e dotadas de níveis aberrantes de estupidez, ao adotarem posturas e atitudes antes inimagináveis em gente desse nível.

São pessoas que se enlouqueceram quando viram os pobres obtendo ascensão social antes nunca cogitável. Despejam comentários brutais e cometem agressões de pura intolerância social, paranoicos por perderem os privilégios que obtiveram de gerações e gerações de elitistas.

É lamentável que o "espiritismo", cada vez mais moldado na Teologia do Sofrimento, esteja conivente com tudo isso. Mesmo quando seus apelos se apoiam em mensagens sorridentes e "amigas" sobre "solidariedade" e "perdão", os "espíritas" se tornam um tanto deslocados, se agem por boa-fé diante da situação dramática do país. Se agem por má-fé, cometem uma mentira mistificadora irresponsável.

A onda de "convulsões sociais" está tomando o Brasil, diante do enlouquecimento das elites com medo de perder privilégios e vantagens que há muito detinham. E mostra o quanto o Brasil possui estruturas sócio-culturais e morais arcaicas, que sempre obrigavam o país a assimilar novidades que eram filtradas pelos valores conservadores que deveriam ser obsoletos, mas são assimilados na deturpação das novas tendências.

O próprio "espiritismo" brasileiro faz parte dessa mania, e o que vemos é o duro trabalho de Allan Kardec ser desmoralizado no Brasil, quando o "movimento espírita" prefere usar a Doutrina Espírita como fachada para suas deturpações de raiz roustanguista e voltadas para a restauração dos valores do Catolicismo medieval que a própria Igreja Católica hoje descartou. Como muita coisa neste país, o "espiritismo" brasileiro é uma embalagem nova de um conteúdo podre de tão velho.

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