segunda-feira, 29 de dezembro de 2014

Enviamos carta para NUPES alertando sobre pesquisa a respeito de Chico Xavier


Numa tentativa de tentar reverter o desfecho da pesquisa sobre Chico Xavier, mandamos uma carta para o NUPES (Núcleo de Pesquisas em Espiritualidade e Saúde) da Universidade Federal de Juiz de Fora (MG), dirigida a toda a equipe, não apenas ao psiquiatra Alexandre Moreira Almeida (foto acima), alertando sobre falhas na metodologia utilizada.

Entendemos que a pesquisa, que enfoca treze cartas atribuídas ao espírito de Jair Presente, e que ao nosso entender são de veracidade bastante duvidosa, se preocupou apenas em colher semelhanças e dados que coincidissem com referenciais da vida do jovem falecido. Só que uma única diferença que contradizesse mesmo as informações menos óbvias põe por terra a tese de veracidade.

E isso não vem de Quevedos, Tristões, Edirs ou de qualquer grupo opositor católico ou protestante. Essa constatação vem do próprio Allan Kardec, que havia dito que, entre muitas informações acertadas, se houver uma que causasse uma séria contradição, a veracidade é rejeitada, por mais que possam haver semelhanças bastante sutis.

Daí que mandamos, ontem, para o formulário de mensagens do NUPES, para que a mensagem seja pesquisada e estudada. Esperemos que os acadêmicos não se sintam tentados pela sedutora imagem religiosa de Chico Xavier e não transformem o núcleo de pesquisas num sub-escritório da FEB, cabendo tão somente pesquisar e obter o resultado mais lógico possível.

Segue a missiva, lembrando que as mensagens tidas como de autoria do espírito Jair Presente, usadas para comparação, já foram reproduzidas aqui:

"(...), 28 de dezembro de 2014.


Prezados acadêmicos do NUPES / UFJF


   Antes de mais nada, prefiro aqui não revelar minha identidade, por estar lançando uma tese que ainda causa intensa polêmica e não quero me comprometer com as repercussões e efeitos que esta carta poderá causar adiante. 
    Lendo as reportagens do Universo On Line e de O Globo sobre as pesquisas em torno do caso Jair Presente / Chico Xavier, fiquei estarrecido com os rumos tomados pelo trabalho acadêmico, depois que eu fiz pesquisas na Internet a respeito do assunto.
   Em primeiro lugar, mesmo quando os pesquisadores adotaram critérios rígidos, ou pelo menos é o que parece ser em tese, observei grave irregularidade que, com toda a minha pesquisa cuidadosa, levam para desmentir a veracidade da autoria espiritual de Jair Presente, o jovem que havia falecido há 40 anos.
    Observei que os referidos pesquisadores se preocuparam unicamente com as semelhanças entre as mensagens atribuídas ao espírito de Jair e aspectos pessoais apresentados em sua breve vida. Só que não se preocuparam com a ocorrência de diferenças que destoassem do suposto espírito e do Jair que viveu junto a seus familiares, colegas e amigos.
   É como se, analisando um boneco de cera, procurasse se verificar até que ponto a semelhança pode se tornar perfeita em seus mínimos detalhes de forma que o boneco seja o próprio homem que o representa.
   O que observei, só tomando como amostra dois dos treze textos atribuídos a Jair, é uma série de equívocos apresentados nas duas obras, o que indica dúvida da veracidade autoral das mesmas, através de inúmeros questionamentos a serem apontados a seguir. As duas cartas aparecem, aqui, após o fim desta carta.
   As missivas escolhidas datam de 15 de março de 1974, a primeira que, segundo se diz, Jair teria enviado para Chico Xavier, pouco mais de um mês após o falecimento do jovem, e a de 25 de agosto do mesmo ano, cerca de cinco anos depois do suposto primeiro contato. As contradições entre uma carta e outra são aberrantes.
   Começando com a primeira carta, de 15 de março, ela se assemelha aos mesmos apelos sentimentais de outras mensagens atribuídas a jovens mortos divulgadas por Chico Xavier. É o mesmo enredo: jovem sofredor que pede orações para sua família, que descreve sua dor depois da tragédia repentina e o posterior apelo religioso que de uma forma ou de outra é expresso na mensagem.
    A mensagem é extremamente sentimental e exageradamente religiosa, dentro de um mesmo padrão de mensagens “espirituais” que comumente se conhece e do qual muitos estão acostumados não porque apresentam necessariamente traços pessoais de cada falecido – embora, em tese, sejam apontadas “semelhanças” entre as “mensagens do além” e o que cada falecido fez ou representou em vida - , mas porque evocam uma religiosidade que conforta as pessoas, sobretudo familiares.
   Mas se a primeira mensagem revela aquilo que eu defino como “panfletarismo religioso”, uma das mensagens posteriores, que aqui reproduzo e data de 25 de agosto, surpreende pela disparidade de linguagem, num tom diferente demais mesmo quando se pode admitir uma mudança de comportamento, e isso num prazo de apenas cinco meses, menos de meio ano e levando em conta que o mundo espiritual, considerado atemporal, viveria esse período como se fosse uma questão de poucos minutos.
   Esta outra mensagem torna-se aberrante, pelo excesso de gírias e pelo texto nervoso, o extremo oposto da outra carta. Uma linguagem alucinada e que, portanto, de outro extremo destoa da personalidade do rapaz, lembrando a linguagem de um hippie paranoico, de alguém que havia tomado LSD e viveu a ressaca da “viagem alucinógena”.
   As duas mensagens, portanto, apresentam irregularidades terríveis que contestam a veracidade das mesmas, e posso sistematizar os questionamentos apresentados da seguinte maneira, considerando as amostras das cartas de 15.03.1974 e 25.08.1974:

1) A primeira mensagem mostra um tom exageradamente religioso, maior do que normalmente se esperaria de jovens mortais, mas que dá uma falsa impressão de veracidade por se encaixar no hábito de religiosidade das famílias, que se sentem tranquilizadas porque seu suposto ente querido aparece apresentando “muita religiosidade”, num discurso que seduz pela retórica de “bondade” e “devoção” ante momentos de sofrimento.

2) A mensagem posterior usada para comparação mostra uma linguagem nervosa e excessivamente coloquial, em claro contraste com a anterior e que se torna aberrante ao se considerar que uma pessoa não tende a ter mudanças bruscas num prazo de cinco meses, num contexto desses. O tom da mensagem lembra a de alguém que sofreu ressaca após uma “experiência” com LSD, com um tom de pânico que, no contexto da mensagem, chega ao nível da caricatura, pelo excesso de gírias e por uma linguagem grosseiramente parecida com o vocabulário hippie, tipo juvenil em moda naquela época (1974).

3) Não existe um contexto que possa justificar a veracidade da autoria de Jair Presente através destas duas amostras, que, comparadas entre si, revelam uma inexplicável mudança de comportamento, excessiva demais para que pudesse ser explicada de maneira coerente. Nota-se até um aparente retrocesso comportamental da mensagem mais antiga para a posterior, não bastasse o caráter falso de cada uma delas, a primeira com exagerada religiosidade – improcedente para o contexto de vida dos jovens falecidos, mas confortável para o padrão emotivo de seus familiares - , a segunda com um nervosismo e um coloquialismo exagerado que beiram à caricatura que mais sugere um hippie tomado de pânico.

   Quanto aos critérios usados para explicar a “provável veracidade” da suposta psicografia por Francisco Cândido Xavier, deve-se observar que, no plano espiritual, não há segredos, e o fato do suposto espírito de Jair Presente mostrar traços pessoais que corresponderam ao falecido não é garantia de que ele tenha se manifestado, se considerarmos a tese de que a mediunidade aconteceu, o que me parece duvidoso.
    Supondo, todavia, que a mediunidade realmente ocorreu, pode haver indícios de que outros espíritos teriam se passado por Jair Presente e ditado tais informações. É bom lembrar que não se deve se ater apenas aos aspectos semelhantes, porque a menor divergência pode eliminar qualquer veracidade de autoria espiritual, por mais que seja identificado um maior número de semelhanças.
   Porém, tudo indica que a mediunidade não teria ocorrido, já que existem indícios de que Chico teria colaboradores que, seja em entrevistas ou mesmo em conversas informais, teria colhido informações particulares dos entes falecidos, sendo também possível uma coincidência de compreensão de aspectos “pouco conhecidos”, trazidos pela intuição.
   A tese é considerada “absurda” e “inconcebível” para os seguidores e simpatizantes de Chico Xavier. No entanto, observando um livro favorável a Chico, Testemunhos de Chico Xavier, de Suely Caldas Schubert, publicado pela FEB, o próprio Chico, em carta ao então presidente da Federação Espírita Brasileira, Antônio Wantuil de Freitas, deixou revelar outra tese “inconcebível”, a de que o livro Parnaso de Além-Túmulo, supostamente de poemas escritos por autores já mortos, teria sido concebido por uma equipe de editores, acusação feita pelo famoso escritor Alceu Amoroso Lima, pensador católico.
   Pois Chico Xavier teria escrito a carta para Wantuil com as seguintes palavras, que denunciam claramente a colaboração de uma equipe editorial que teria moldado as estranhas mudanças nas seis edições do livro poético, feitas em duas décadas e mais três anos. Diz o trecho:
"Grato pelos teus apontamentos alusivos ao “Parnaso” para a próxima edição. Faltam-me competência e possibilidade para cooperar numa revisão meticulosa, motivo pelo qual o teu propósito de fazer esse trabalho com a colaboração do nosso estimado Dr. Porto Carreiro é uma iniciativa feliz. Na ocasião em que o serviço estiver pronto, se puderes me proporcionar a “vista ligeira” de um volume corrigido, ficarei muito contente (...)". (In: SCHUBERT, Suely Caldas. Testemunhos de Chico Xavier. Rio de Janeiro: Editora da FEB, 2010).
   O livro poético é um tema que não cabe discutirmos minuciosamente aqui, mas eu citei o trecho para mostrar que uma tese “absurda” e “inconcebível” relacionada a Chico Xavier ocorre, e volta e meia mesmo seus defensores mais extremos acabam, por acidente, mostrando.
   Chico é denunciado, em vários sítios da Internet, como plagiador de livros, autor de mensagens apócrifas e apropriador indébito de pessoas precocemente falecidas e personalidades de reconhecida popularidade, como se observa no caso da jovem mineira Irma de Castro (sob o consentimento e a boa-fé do deslumbrado e saudoso viúvo), a Meimei, da poetisa potiguar Auta de Souza e do escritor maranhense Humberto de Campos. No caso de Humberto, houve um processo judicial movido por seus familiares contra Chico Xavier e a FEB, em 1944, que gerou ampla cobertura na imprensa, mas os padrões jurídicos da época não compreenderam a questão e o processo resultou num empate que favoreceu Chico, como nos 0 X 0 que somam pontos para determinados times esportivos.
   Chico também teria participado de fraudes de materialização, processos grotescos em que pessoas eram cobertas de roupas brancas – em boa parte das vezes, com grotescos recortes ou fotocópias de fotos de pessoas falecidas coladas na cabeça encapuzada - ou eram fotografadas com filetes de gaze ou de algodão colocados na boca. Em outros casos, havia também travesseirinhos em que as fotos eram coladas e nos quais eram ligados também filetes de gaze e algodão forjando supostos braços em formação.
   No auge dessas práticas, uma suposta médium, Otília Diogo, que se passava por supostas materializações da Irmã Josefa e do Dr. Alberto Veloso, com a clara participação de Chico Xavier – que em várias fotos de um livro apologista (que não denunciou a fraude de Otília), divulgadas por fontes pró-Chico, parecia estar a par de todo o processo - , foi desmascarada por uma reportagem de O Cruzeiro em 1970, que conseguiu localizar uma mala com os disfarces de Otília, como o véu da “Irmã Josefa” e a barba do “Dr. Veloso”.
   São casos ligeiros sobre algumas das irregularidades relacionadas a Chico Xavier, só para chamar a atenção de vocês o que está por trás de um mito relacionado a estereótipos agradáveis referentes à velhice, humildade e bondade. E que reforçam as dúvidas sobre suas atividades.
   O que se quer apresentar, a seguir, são os referidos textos atribuídos a Jair Presente, dotados de aspectos aberrantes em que se pede que seja feito um questionamento mais cauteloso. Deve-se observar que semelhanças não garantem veracidade, se uma única divergência apresentar contradição. O próprio Allan Kardec alertava sobre isso, quando um único equívoco pode rejeitar a veracidade de algum fenômeno ou mensagem, por mais semelhanças que existam e por mais engenhosas que elas sejam.
   Faltou isso no método de pesquisa que o NUPES, em parceria com a USP, realizou, em que pese o aparente rigor da metodologia. Não bastam apenas pesquisar minuciosamente os documentos, confrontá-los em busca de semelhanças, mas buscar divergências e contradições. Ao que parece, a pesquisa se limitou a pesquisar as diferenças genéricas, sem verificar os pormenores que trazem sérias contradições e comprometem seriamente a tese de veracidade.
   Espera-se que seja feita maior cautela na pesquisa dos trabalhos, e que se elimine o risco do trabalho se comprometer numa parcialidade movida pela religião. Afinal, antes que um trabalho se destine a servir movimentos religiosos, ele deveria servir-se à sociedade, ainda que não trabalhe necessariamente para agradar as perspectivas deste ou daquele grupo religioso.
   Encerro esta carta trazendo então as amostras do acervo supostamente atribuído a Jair Presente, do qual tudo indica que não foi de sua autoria.
   Atenciosamente,

Senhor A."

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