quarta-feira, 21 de janeiro de 2015

A suposta psicografia de Chico Xavier e seus parceiros

ANTÔNIO WANTUIL DE FREITAS E WALDO VIEIRA TERIAM CO-ESCRITO AS SUPOSTAS PSICOGRAFIAS DE FRANCISCO CÂNDIDO XAVIER.

A aparente psicografia de Francisco Cândido Xavier já mostrava suas irregularidades. Elas geraram até problemas judiciais, escândalos vergonhosos, para os quais a reação variava entre a omissão e os ataques violentos dos partidários contra aqueles que "obstruíram" o caminho "sereno" do anti-médium mineiro.

Daí as manifestações de puro rancor, como verdadeiras bestas-feras soltas nas selvas, contra Amauri Pena, só por causa de uma denúncia divulgada porque o jovem sobrinho de Chico Xavier estava com peso de consciência, diante das pressões que os líderes "espíritas" fizeram sobre ele para praticar supostas atividades psicográficas.

As irregularidades custaram graves incidentes contra Chico Xavier. desde o processo judicial dos herdeiros de Humberto de Campos - com o advogado Milton Barbosa apontando falhas na suposta psicografia atribuída ao escritor maranhense - até acusações de cumplicidade no caso da farsante Otília Diogo, a falsa irmã Josefa em rituais de falsa materialização, que eram puro ilusionismo.

Se juntarmos as irregularidades em torno de Chico Xavier, dariam um livro amargo que deixaria os adeptos do anti-médium entristecidos, reagindo com eventual coitadismo, vítimas do "impiedoso julgamento dos homens na Terra" mas, às vezes, despejando língua ferina acusando os questionadores de "homens de ciência convertidos em juízes cruéis das pessoas de bem".

Mas Chico Xavier apresentou irregularidades, mesmo. E constatá-las não é perseguir uma figura tida como muito querida por seus seguidores nem se escravizar aos "julgamentos terrenos". É uma questão de lógica dos fatos, mesmo. Assim, avaliado friamente, sem raivas nem rancores, usando o critério da coerência, que está acima de pessoas ou de partidos diversos.

Se observamos, por exemplo, uma disparidade entre o poema de Olavo Bilac, com seu estilo sofisticado de calcular métricas e rimas, antecipando a musicalidade do movimento simbolista em seus poemas parnasianos, e o cansativo poema de apelo religioso de um suposto "Olavo Bilac espírito", carregando bandeiras típicas de Chico Xavier, seguimos critérios lógicos.

Nem de longe queremos perseguir nem desmoralizar coisa alguma. Mas, devido a avaliações lógicas e questionadoras, temos que ser severos diante de irregularidades cometidas, pois não há palavrinha amorosa que possa permitir a fraude ou mesmo a sua dissimulação em "lindas lições de vida".

Pesquisamos os textos de Chico Xavier e somos obrigados pela lógica dos fatos a constatar que muito do que se atribui à sua psicografia tem crédito duvidoso. Não fosse essa avaliação, teríamos que adotar situações e processos surreais e de teor fictício, como se Chico Xavier fosse o Speed Racer da escrita mediúnica.

EQUIPES EDITORIAIS

Há a famosa acusação do eminente escritor católico Alceu Amoroso Lima, que às vezes escrevia sob o pseudônimo de Tristão de Athayde (ou Tristão de Ataíde, numa grafia mais atualizada), de que Parnaso de Além-Túmulo teria sido escrito por uma equipe de editores.

A tese foi considerada "absurda" e "inconcebível" pelos partidários de Chico Xavier, mas tem seu aspecto lógico. Para piorar, algumas cartas de Chico a Antônio Wantuil de Freitas, então presidente da FEB, em 1947, comprovam tal visão, apontando negociações de revisão das reedições do referido livro poético, e foram reveladas em fontes simpáticas ao anti-médium, conforme registra Testemunhos de Chico Xavier, de Suely Caldas Schubert.

Pois foi uma fonte favorável a Chico Xavier, publicada pela editora da FEB, deixou confirmar, por acidente, uma tese que seus partidários julgavam "inconcebível" e "absurda". Negavam o ato de forma veemente, mas tiveram que apresentar seus vestígios.

O livro poético já fez errado ao ser reparado em cinco sucessivas edições, em pouco mais de duas décadas - a revisão da quinta para a sexta e "definitiva" edição durou dez anos e da qual vieram as cartas de 1947 entre Chico e Wantuil - , pelo contexto e pretexto a que se inseriu.

Pois Parnaso de Além-Túmulo, se considerarmos a suposta superioridade espiritual de Chico Xavier, e a elevada qualidade moral dos poetas envolvidos, deveria ter sido uma obra pronta e irretocável de mensagens espirituais, das quais não tivesse necessidade de haver qualquer reparo.

No entanto, a obra se contradisse pelo fato de ter feito sucessivos reparos - alguns deles severos e motivados por situações desagradáveis - em cinco edições e duas décadas, o que desqualifica a "pureza intocável" da "primeira psicografia" de Chico Xavier.

E, piorando mais ainda, a revelação que confirma a "absurda tese" do católico Alceu Amoroso Lima veio de uma escritora e suposta médium, ligada à FEB, que, lembrando carinhosamente do querido Chico Xavier, deixou publicar cartas que simplesmente "confessam o crime", com Chico Xavier pedindo para Wantuil e outros editores "revisassem" o livro porque Chico não tinha "possibilidade nem oportunidade" (ou melhor, "tempo") para fazer minuciosamente a revisão.

São contradições e irregularidades que os partidários de Chico Xavier deixam mostrar e que se apresentam claramente aos nossos olhos. Como é que, constatando as mesmas de maneira objetiva, podemos ser acusados de "perseguir homens de bem" ou de nos limitarmos aos "juízos terrenos" em detrimento da "lógica (?!?!?!) do coração"?

OS PARCEIROS DE CHICO XAVIER

Observando os livros de Chico Xavier, talvez a única hipótese de mediunidade autêntica estaria associada aos livros do jesuíta Emmanuel, que teria sido o padre Manuel da Nóbrega e aparentemente era o "mentor e confidente" do anti-médium mineiro.

Mesmo assim, talvez não teriam sido todos os livros. Há denúncias, mesmo dentro do "movimento espírita", de que algumas obras de autoria de Emmanuel se contradizem em várias ideias, e que, dos anos 60 em diante, mesmo as obras dessa "lavra" teriam sido feitas por equipes editoriais.

Podemos identificar, no entanto, a verdadeira autoria dos livros atribuídos a André Luiz e a Humberto de Campos / Irmão X, que claramente mostram aspectos irregulares que contradizem claramente as autorias espirituais. Em ambos, Chico Xavier teria co-escrito os livros, mas não sozinho, e ele teria recebido a colaboração de outro alguém.

No caso de Humberto de Campos, o mais antigo deles, nota-se que o tom messiânico, de ranço fortemente católico, destoa completamente do estilo que o escritor maranhense escrevia em vida, mais descontraído e coloquial, embora bastante culto em informações.

Em contrapartida, observa-se, na obra do suposto "Humberto de Campos / Irmão X" ("Irmão X" foi o pseudônimo usado para evitar o prolongamento dos litígios com os herdeiros do escritor), uma alternância do conservadorismo religioso de ligeiras evocações pseudo-científicas de Antônio Wantuil de Freitas, de uma escrita solene e eventualmente agressiva, e o sentimentalismo católico de Chico Xavier.

Dessa feita, a "safra Humberto de Campos" seria, na verdade, uma parceria que Chico Xavier, que escrevia de sua própria mente, teria feito com Wantuil, que era também escritor e, com o pseudônimo de "Minimus", só tardiamente revelado, escreveu obras como Síntese de O Novo Testamento, em 1949.

Quanto à "safra André Luiz", Chico Xavier teria co-escrito os livros junto a Waldo Vieira. Oficialmente, a identidade do suposto André Luiz remete a várias personalidades. Waldo atribuiu ao médico Carlos Chagas (1879-1934).  Há também uma teoria, sem um responsável direto, e um tanto remota, de que André teria sido Osvaldo Cruz (1872-1917). Já Luciano dos Anjos atribuiu a identidade ao médico e ex-dirigente esportivo Faustino Esporel (1888-1931).

Embora haja argumentos favoráveis para cada tese, elas sempre esbarram em alguma contradição, tendo sido a tese de Esporel considerada mais convincente. Mas uma observação cuidadosa dos livros de "André Luiz" apontam que a verdadeira identidade não pode ser outra: André teria sido, na verdade, um personagem fictício do próprio Waldo Vieira.

Nosso Lar, de 1943,seria uma obra de ficção científica medíocre, mas atribuída a um relato "realista" do mundo espiritual, e apresentava uma narrativa e um estilo de argumentar próprios de Waldo em sua Conscienciologia, religião pseudo-científica que criou depois que rompeu com a FEB, em 1968.

O próprio livro Nos Domínios da Mediunidade (1955), feito sob encomenda pela FEB para substituir O Livro dos Médiuns de Allan Kardec, permitindo certas "licenças" que fogem do cientificismo kardeciano, apresenta muitos aspectos pseudo-científicos que compõem hoje a Conscienciologia e seu derivado, a Projeciologia.

Isso é certo, porque observa-se as identidades pelos conteúdos das obras. As ideias de "André Luiz", assim como sua forma de narrativa e argumentação, se afinam, e muito, com as ideias de Waldo Vieira hoje difundidas na sua seita.

Chico Xavier teria, provavelmente, atuado como co-autor das histórias e teorias dos livros do suposto espírito. Em certos casos, Waldo escrevia sozinho, como em Conduta Espírita (1960), sendo a co-autoria Waldo e Chico observada através da alternância entre o dogmatismo religioso xavieriano e o pseudo-cientificismo de Waldo.

A parceria teria se encerrado em 1968. O livro E a Vida Continua, provavelmente com autoria exclusiva de Chico Xavier, pela predominância do religiosismo, embora com "orientações" deixadas por Waldo.

Entre os livros posteriores, já com Waldo ocupado em sua seita, destaca-se Cidade do Além (1983), que Chico fez em parceria com a sobrinha do falecido Eurípedes Barsanulfo, Heigorina Cunha, também falecida. Chico usou o crédito de André Luiz, enquanto Heigorina teria usado Lucius, que supostamente teria sido o "mentor" de Zibia Gasparetto.

Heigorina fez, em Cidade do Além, a parte que antes coubera a Waldo, acrescentando uma narrativa "científica" e ela mesma desenhando as plantas que seriam da tal "cidade espiritual" do livro, que procurava seguir a linha de Nosso Lar, num contexto mais "contemporâneo".

SOBRECARREGADO DEMAIS

Chico Xavier, muito provavelmente, pode não ter escrito boa parte dos livros publicados depois dos anos 70. Como um popstar do "movimento espírita", ele tinha que comparecer a inúmeros compromissos, receber pessoas e escrever supostas mensagens espirituais. Eram compromissos intensos, que levavam muitas horas, impossibilitando a dedicação intensa a livros.

Um livro não se escreve às pressas numa vez só. Ele leva tempo para ser escrito. Imagine Chico Xavier escrevendo de quinze a vinte livros por ano, cheio de compromissos, recebendo centenas de pessoas, fazendo visitas, dando depoimentos, divulgando mensagens etc etc etc.

Alguém imaginaria Michael Jackson lançando de quinze a vinte álbuns por ano? O prazo entre um álbum e outro, do finado cantor norte-americano, sempre foi longo, pelo menos contado a partir de Off The Wall, já que antes, ao menos, ele tinha uma discografia mais consecutiva, em anos, junto aos seus irmãos do Jackson Five / The Jacksons, sendo seu primeiro trabalho solo de 1975 inserido dentro desse ritmo de lançamentos.

Por isso, muitos dos livros de Chico Xavier, já no crepúsculo de sua carreira, eram na verdade feitos por equipes editoriais, como em muitos livros de auto-ajuda que um autor assina o que um "time" de ghost writers, geralmente seus próprios subordinados, acabam escrevendo.

O próprio Chico já alegava a tal "falta de tempo" na carta a Wantuil que deixou vazar que Parnaso de Além-Túmulo era feito por uma equipe de editores. Acabou "confessando" o que fez. E isso é o que os "espíritas" tanto temem, daí que eles acusam os questionadores de "perseguição injusta a um homem de bem" (no caso, Chico) e de "julgamento dos homens da terra".

Sem perseguições nem julgamentos injustos. A lógica dos fatos mostra essas contradições. A realidade dói mais aos "espíritas", que preferem botar na conta do além toda sorte de absurdos e surrealismos.

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