sexta-feira, 17 de julho de 2015

A preocupante polarização do Brasil de Fernando Collor e Eduardo Cunha


É preocupante que o Brasil, que sofreu uma avalanche de retrocessos nos últimos 50 anos e, de forma ainda mais intensa, nos últimos 25, ainda se ache em condições de se tornar potência mundial e vanguarda espiritual da humanidade planetária.

A epidemia que atinge o Brasil, comparável à gripe espanhola de 100 anos atrás - que chegou a matar o presidente da República, Rodrigues Alves, no começo de 1918 - , pode não causar danos físicos, mas traz danos sociais profundos. É o provincianismo, que impele as pessoas de terem uma compreensão confusa, incoerente e atrasada da realidade em volta.

O Rio de Janeiro tornou-se um caso preocupante, porque, pela primeira vez, depois de Pereira Passos - ainda mais antigo que a gripe espanhola que atingiu muitos brasileiros, pois urbanizou a Cidade Maravilhosa cerca de uma década antes - , a outrora capital do país, antes símbolo da modernidade, tornou-se uma das cidades mais atrasadas do país.

Tudo retrocedeu. Até o desabastecimento dos supermercados, no Grande Rio, atingiu proporções dignas de cidade do interior. E isso com o Rio de Janeiro próximo a sedes, estaduais ou interestaduais, dos fabricantes e distribuidores de produtos. Até a Bahia - do estereótipo, injusto, do povo "preguiçoso", passou uma boa rasteira nos cariocas - , o que é preocupante.

Nas mídias sociais, boa parte dos reacionários e matutos são internautas do Rio de Janeiro. Ver que pessoas de formação universitária e bom poder aquisitivo, com pinta de surfista (só para citar um estereótipo moderno), morando na Barra da Tijuca (a "Hollywood" brasileira, no sentido urbano do termo), agirem como se fossem um misto de Klu Klux Klan com Comando de Caça aos Comunistas, é estarrecedor.

Isso sem falar no clima de bangue-bangue que atinge a cidade, mostrando a falência das UPPs e a falência maior ainda do autoritário grupo político de Eduardo Paes que, de tão matuto, acho que sistema de ônibus era igual criação de gado bovino e juntou diferentes empresas de ônibus para usar o mesmo visual da província e ganhar o carimbo da Prefeitura.

São pessoas sendo mortas por balas perdidas. Policiais sendo assassinados a queima-roupa. E cidadãos sendo assaltados por ladrões que, num contexto desses, só precisavam de faca para renderem suas vítimas. Teve assassinato à luz do dia na movimentada estação do metrô no entorno da Rua Uruguaiana.

E o que se observa, no âmbito ideológico? Fora os reacionários (mal) fantasiados de esquerdista - apesar do QI nos níveis do lendário senador estadunidense Joseph McCarthy, famoso pelo reacionarismo neurótico - observa-se, no status quo da opinião pública, a polarização entre uma direita psicótica e uma esquerda festiva.

A direita psicótica, simbolizada por Reinaldo Azevedo, Rodrigo Constantino, Rachel Sheherazade, Eliane Cantanhede e o roqueiro Lobão, quer um país mergulhado no mais castiço e castrador capitalismo e quer que o povo seja excluído dos benefícios sócio-econômicos e dos debates públicos no país.

A esquerda festiva, simbolizada por Pedro Alexandre Sanches, Paulo César Araújo, Gustavo Alonso, Eduardo Nunomura e outros que, na verdade, imigraram da mídia direitista e outros ambientes similares, quer uma cultura brasileira mergulhada no mais castiço e castrador capitalismo e quer que o povo seja excluído dos benefícios sócio-econômicos e dos debates públicos.

A diferença entre uns e outros é só pontual. A direita psicótica tem um discurso raivoso e não admite sequer um papel positivamente caricatural para o povo pobre. A esquerda festiva tem um discurso sorridente, e admite que o "melhor lugar" para as classes populares é fazer um papel de debiloide através de uma "cultura popular" submetida às regras vorazes do mercado de entretenimento.

É preocupante ver que a intelectualidade que se divide entre esses dois papéis igualmente cruéis para as classes populares, em que uns querem ver o povo à deriva e outros apenas admitem ao povo a expressão de papéis ridículos, que o "bom elitismo" dos "generosos pensadores" festivos, desejando a espetacularização da miséria, define como "cultura do mau gosto".

Na política, nota-se uma polarização semelhante. Tem-se, num lado, o presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, dotado de ideias retrógradas, como se nota nos casos da terceirização, do fator previdenciário e na redução da maioridade penal, além de uma reforma política que sutilmente lhe arrumasse uma chance de transformá-lo em primeiro-ministro.

Para quem não sabe, a terceirização é a eliminação de conquistas trabalhistas, reduzindo o emprego a uma ocupação instável, insegura e muito mal remunerada. O fator previdenciário é um cálculo feito para adiar para muitos anos a aposentadoria, obrigando os idosos a trabalhar mais. A redução da maioridade penal apenas irá lotar as prisões com adolescentes que só cometeram crimes porque se inspiraram nos "adultos selvagens" da programação violenta da televisão.

No outro, tem-se o senador Fernando Collor de Mello, o ex-presidente que decidia medidas contrárias aos interesses dos trabalhadores, confiscou as poupanças dos brasileiros, era um privatista doentio - queria vender até as universidades públicas - e desvalorizou a indústria nacional, enfatizando demais a importação de produtos (inclusive os péssimos automóveis da russa Lada).

Todavia, depois que ele recebeu o impeachment e a proibição de exercer direitos políticos por oito anos, Fernando Collor voltou como se fosse personagem de filme de Luís Buñuel: cortejado por seus opositores e aclamado como "estadista moderno e progressista", quase tratado como se fosse um político emergente de centro-esquerda.

O teste desta blindagem veio quando o Supremo Tribunal Federal ordenou que buscassem e apreendessem bens e documentos em casa, empresas e instituições que Fernando Collor controlava, direta ou indiretamente. Três automóveis caríssimos (Ferrari, Porsche e Lamborghini) foram apreendidos. Collor é acusado de receber R$ 3 milhões do esquema de propinas de uma subsidiária da Petrobras, a BR Distribuidora.

Se, em vez de Collor, fosse Aécio Neves, a esquerda toda comemorava. Mas como não foi um político do PSDB, setores da esquerda ficaram incomodados e fizeram coro quando Collor, furioso, disparou no palanque do Senado Federal que tinha sido "humilhado" e que o Procurador-Geral da República, Rodrigo Janot, "extrapolou" os limites do Estado democrático e da Constituição.

Fernando Collor tornou-se o símbolo tardio das esquerdas festivas - embora parte dela diga "não ir com a cara dele" - por ter sido o presidente que apoiou todo o contexto de decadência sócio-cultural vivida no Brasil, em que a Economia virou a medida de todas as coisas, mesmo com um povo brasileiro entregue ao emburrecimento duplamente produzido pela falta de investimentos na Educação e pelos valores retrógrados transmitidos pela mídia.

Imaginemos como se daria essa polarização, se um dia Eduardo e Fernando se tornarem os favoritos para concorrer à Presidência da República. O obscurantismo "cristão" de Eduardo Cunha e o neoliberalismo "popular" de Fernando Collor não são as melhores soluções para resolver os problemas do país, mas medidas que só agravarão esses mesmos problemas.

Acreditar que Eduardo Cunha trará moralidade e cidadania ou que Fernando Collor fará um país mais justo e mais moderno são tolices mediante o que os dois representam. Polarizar a política com um líder vindo do grupo autoritário e antilegalista do PMDB carioca e um antigo político da ARENA e do esquecido PRN convertido num "populista" pretensamente progressista.

Essa polarização se torna preocupante porque são dois lados de uma mesma moeda, em que um lado se preocupa demais com a "nobreza" e outro quer dar "pão e circo" para a "plebe". Nenhum dos lados tem compromisso real com o progresso do país e com o atendimento das necessidades das classes populares, e o Brasil só tende a piorar quando os dois passarem a polarizar o jogo político.

E, mais uma vez, não há como acreditar que o Brasil possa vir a ser "potência mundial", "coração do mundo", "vanguarda da humanidade" ou coisa parecida, passando por retrocessos que o fazem, na verdade, se atolar na retaguarda dos países emergentes.

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