segunda-feira, 3 de julho de 2017

Espíritos atrasados dominam o Brasil sem tirar proveito de suas vantagens


O Brasil sofre com o auge da ação de espíritos atrasados, que sempre dominaram o país mas só nas últimas décadas se comprometem a defender profundos retrocessos sociais. O antigo pacto em que o "novo" sempre era acolhido de maneira diluída, sem representar uma ruptura real com o velho, deu lugar a uma forma escancarada de ultraconservadorismo, simbolizado pelo cenário político atual.

A constante ameaça de um desordeiro político como Jair Bolsonaro conquistar o planalto e da impunidade beneficiar os mesmos corruptos da plutocracia política, como Michel Temer e Aécio Neves, sinaliza sobretudo esse poder descomunal de espíritos atrasados que conquistaram o topo da pirâmide social brasileira, sem qualquer proveito nem compromisso social.

Sabe-se que o topo da pirâmide social no Brasil passa por um sinal avançado de perecimento. Pessoas que variam quanto a um atributo ou privilégio terreno, passando do porte de armas ao prestígio religioso, da toga ao diploma acadêmico, da fama e do dinheiro a uma simples popularidade doméstica nas redes sociais ou nos pátios escolares, são dotadas de poder, prestígio e até alguma imunidade social que os faz parecerem eternos e invulneráveis.

Em tese, espíritos atrasados têm a existência vital prolongada e os infortúnios minimizados como meios de fazê-los depurar suas almas e possuir algum aprendizado, mas não é isso que se está vendo. O que se vê é uma prepotência muito grande, que não raro causa conflitos, e uma intransigência diante de seu próprio desgaste social.

A seletividade social que acompanha até o obituário - há um grande medo da sociedade em ver assassinos ricos falecerem, apesar de dois famosos feminicidas e um latifundiário, já idosos, apresentarem indícios de doenças graves - parece proteger esse "mundo atrasado" que insiste em permanecer no Brasil, como se os anos 1970 nunca tivessem terminado em nosso país.

Há um grande movimento para retroceder o Brasil para os padrões coloniais do século XVIII ou, na melhor das hipóteses, na "democracia controlada" da Era Geisel (1974-1979). São retrocessos que se destacam no âmbito político e econômico, no qual as reformas trabalhista e previdenciária sinalizam uma permissividade aos abusos cometidos pelos patrões e a perda de direitos e garantias dos empregados.

A reboque disso tudo, as redes sociais na Internet viram redutos de truculência e os chamados cyberbullies, os brutamontes da Internet, chegam até mesmo a criar blogues ofensivos contra desafetos, agindo de forma impune e até apoiada por amigos. Eles também articulam ataques verbais em série e fazem popularizar pontos de vista reacionários, obscurantistas e até anti-populares.

Não raro, eles também difundem e disseminam preconceitos sociais graves, como machismo, racismo e homofobia. E isso se deu de tal forma que até celebridades, empresários e políticos passaram a expressar abertamente preconceitos sociais e defesas de profundos retrocessos, como apoiar padrões de trabalho que se equiparem à antiga escravidão, de triste lembrança histórica.

Os espíritos atrasados não saem de cena. A ponta da pirâmide social começa a arder em chamas e a exalar um fortíssimo cheiro de mofo tóxico. Mesmo assim, seus personagens não saem de cena, se envolvem em confusões, mas se mantém em postura invulnerável.

Vivemos um contexto em que a renovação da humanidade é comprometida quando os óbitos ocorrem quase sempre atingindo personagens associados a atividades progressistas, humanistas ou de vanguarda. Eles morrem, muitas vezes, de maneira prematura ou quando estão no auge de suas atividades em benefício da humanidade.

Enquanto isso, personalidades retrógradas parecem sobreviver a tudo, sem qualquer serventia, apenas para gozar dos privilégios que suas posições sociais lhes garantem. Suas colaborações só servem para reciclar ou ressuscitar valores decadentes ou obsoletos, causando um prejuízo para maiorias que pertencem às partes média e inferior da pirâmide social.

Não há um desfecho, um fim de ciclo, e espíritos retrógrados permanecem em pé, com uma longevidade que pode inspirar exemplos nas novas gerações, que acabam tendo como referências as causas obscurantistas que agora geram até catarse entre os jovens nas redes sociais da Internet.

O apego da sociedade brasileira em geral a valores associados ao status quo e ao rigor moralista faz com que crimes e delitos sejam tolerados quando cometidos por pessoas de elite. Quando muito, se reclama pelas costas, mas a sociedade oferece todo tipo de condição, mesmo por meio do conformismo, para que o "topo da pirâmide" permaneça imune com seus gravíssimos erros que são equivocadamente subestimados e socialmente aceitos.

Até no "espiritismo" brasileiro, uma das religiões que mais simboliza o "topo da pirâmide", apesar de seu verniz de "humildade", também faz das suas. Cada vez mais voltado à Teologia do Sofrimento, a religião igrejeira se concentra mais em pedir aos sofredores "paciência" e em combater o pensamento questionador e o debate aprofundado.

Pior: a impunidade, no "espiritismo", atinge plenamente os "médiuns" que produzem mensagens fake tidas como de "autoria espiritual", o que pode ser facilmente identificado pelas irregularidades de conteúdo, bastante graves. Existe até "médium" pintando quadro falso atribuído a um pintor morto e muitos acham "ofensivo" classificá-lo de falsário, pelo prestígio religioso que o cerca.

A blindagem que o "topo da pirâmide" recebe é tanta que situações surreais ocorrem. Se um feminicida rico que virou noticiário nacional quando enfrentou um júri popular morre de infarto de repente, a imprensa não noticia. Se um político de direita é envolvido em diversos escândalos de corrupção, ele dificilmente é punido. Se um "médium espírita" produz mensagem fake em escrita, pintura ou fala, ele não só fica impune como ainda é endeusado pela sociedade.

A permanência de espíritos atrasados no status quo do Brasil se dá devido a diversos fatores que envolvem estruturas oligárquicas, conveniências de todo tipo e um sistema moralista e elitista. A esperança vã de que os espíritos retrógrados possam progredir é bem intencionada mas não encontra efeito prático, porque eles continuam ligados aos mesmos interesses mesquinhos de sempre.

A influência deles já começa a afetar o Brasil, que pode andar para trás, num processo inimaginável de retrocesso histórico e social. O mofado cenário político brasileiro, vigente desde maio de 2016, reflete isso, além das ilusões de que o "topo da pirâmide" é um repositório de qualidades e atribuições vistas como "positivas" pela associação a qualidades apreciadas pelos conservadores, como "racionalidade", "pragmatismo", "carisma" e "visibilidade".

Algo deverá ser feito. Afinal, o Brasil está pagando caro pelo preço desse retrocesso político, no qual o mofo se rebela contra o fungicida. Essa volta para trás social, que poderá botar um autoritário no poder, pode trazer prejuízos gravíssimos para a população e nem a sociedade moralista e apegada ao establishment estará a salvo de futuras convulsões e vindouros impasses a ocorrerem no nosso país.

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