terça-feira, 5 de julho de 2016

Retrocessos sociais podem aumentar a violência em todo o Brasil

A MÉDICA GISELE PALHARES, MORTA DIAS ATRÁS EM UM ASSALTO NA LINHA VERMELHA, NO RIO DE JANEIRO.

A chamada "sociedade civil" brasileira está brincando com fogo quando clama pelo resgate de valores "sagrados" ou "estáveis" que na verdade correspondem a retrocessos diversos feitos para salvar privilégios econômicos e sociais e valores hierárquicos.

As passeatas pelo "Fora Dilma" abriram caminho para um governo de moldes ultraconservadores que é o do presidente interino Michel Temer, que causou um cenário político de disparada nos preços dos produtos, aumento de desemprego e propostas que preveem retrocessos sociais de qualquer espécie, sempre em prejuízo às classes populares, maioria no povo brasileiro.

A questão da hierarquia, que é objeto da maior, embora silenciosa, crise que atinge todo o país, fez com que setores da classe média manipulados pelos meios de comunicação - controlados por oligarquias riquíssimas, como é o caso da Rede Globo de Televisão - pedissem o fim de "13 anos de roubalheira" e quisessem tirar Dilma Rousseff do poder.

A crise da hierarquia atinge todos: empregadores, acadêmicos, políticos, profissionais liberais, empresários, celebridades, tecnocratas. Gafes, crimes e outras irregularidades graves envolvem pessoas de algum status quo. E a própria base de apoio dessa sociedade retrógrada, com jovens capazes de fazer cyberbullying na Internet ou exibir símbolos nazistas nas ruas, é uma amostra de como o topo da pirâmide anda cada vez mais apodrecido.

Enquanto isso, o governo Michel Temer planeja uma política de austeridade sócio-econômica que vai entre outras coisas, deixar os pobres mais pobres e os ricos mais ricos. Investimentos à Saúde e Educação serão reduzidos, o mercado de trabalho será desqualificado com o fim de encargos e a desvalorização salarial, os preços já aumentam de forma descontrolada e constante.

Diante desse processo de verdadeira "higienização social" - movido por um mercado de trabalho socialmente preconceituoso e menos inclinado a talentos diferenciados, preferindo adotar critérios de conveniência social, e por um sistema de preços que só serve para afastar certos produtos do alcance de consumidores "socialmente inferiores" - , a sociedade brasileira sofre um grave perigo.

Na medida em que se afasta as classes populares dos benefícios alcançados nos últimos anos, e conforme as autoridades "mais responsáveis", sobretudo do estilo "administrativo" do PMDB carioca, que não resolvem o problema da segurança pública nem fazem políticas de melhorias sociais para as comunidades pobres, as pessoas mais pobres se expõem a infortúnios pesados que, em indivíduos menos pacientes, pode gerar ações vingativas.

Se, da parte de classes mais abastadas, os crimes são feitos para preservar os privilégios que têm ou para se vingar de privilégios perdidos - como os feminicídios conjugais cujos criminosos se vingam da perda dos "troféus sexuais" que suas companheiras lhes representavam, tirando-lhes a vida - , nas classes populares os crimes são feitos por quem geralmente não consegue obter algum benefício, nem mesmo um emprego.

É ilustrativo que em áreas de governos irregulares, como as decadentes cidades do Rio de Janeiro e de Niterói (esta com o agravante de ser uma cidade provinciana que nenhuma cidade provinciana gostaria de ser, com lojas fechando aos montes enquanto o prefeito Rodrigo Neves ganha prêmio por "empreendedorismo"), os assaltos aumentaram drasticamente e ocorrem até à luz do dia.

No Rio de Janeiro, balas perdidas e assaltos diversos já dizimaram várias pessoas, independente das classes sociais. Cinco jovens pobres que comemoraram conquistas de emprego e estudo foram assassinados por policiais, em 2015. Recentemente, uma médica de Nova Iguaçu, Gisela Palhares, de 34 anos, foi assassinada por uma quadrilha de assaltantes, na Linha Vermelha.

Os assaltos podem aumentar diante da situação irremediável a que serão condenados muitos pobres. A desqualificação do mercado de trabalho e a desvalorização dos salários pode, com o fim da auto-estima das classes populares, poder causar revolta naqueles que antes eram esperançosos e, assim, levar muitas pessoas à ação criminosa, pela falta de algum meio de obter renda de maneira honesta para sua sobrevivência.

A violência pode se voltar cada vez mais para as classes mais abastadas, sobretudo porque as políticas de segurança são muito frouxas. Dentro desse quadro caótico de descaso político e administrativo, e do propósito elitista de reverter os avanços obtidos pelos governos de Lula e Dilma Rousseff, a revolta popular pode se voltar justamente contra quem defendeu com tanta urgência o "Fora Dilma".

Não é preciso dizer que cenários políticos como os últimos anos da ditadura militar e os governos de José Sarney, Fernando Collor e os momentos de crise de Fernando Henrique Cardoso foram épocas de muita violência. A falta de ações para garantir não só o emprego e alguma renda, mas qualidade de vida e outros benefícios, até mesmo educacionais, podem transformar o país num território de uma verdadeira guerra civil.

Com a terceirização do emprego que reduzirá os assalariados aos padrões do trabalho informal, projetos como Escola Sem Partido que proibirão os debates sobre problemas sociais e a privatização de serviços essenciais que fará com que eles tenham o caos que se vê hoje na telefonia, cada vez mais cara e incompetente, podem pesar nas contas futuras da sociedade que quer se beneficiar com o atual cenário político.

Sem salários dignos, sem qualidade de vida, sem garantias sociais e sem uma educação que discutisse e esclarecesse os valores morais, as pessoas ficarão mais egoístas, arrivistas, vingativas, reacionárias e preconceituosas, e o Brasil se tornará ainda mais violento, como foi no momento de crise no final da Era Geisel, com um AI-5 revogado de maneira humilhante, sem poder "moralizar" o país pela repressão.

O crime se tornou mais organizado, as elites também passaram a praticar crimes, os reacionários se manifestando de maneira violenta, o desrespeito humano se banalizando, tudo isso foi se consolidando no final da Era Geisel, já que a sociedade "equilibrada" de 1974 deixou suas máscaras caírem.

Não adiantou a Rede Globo reinventar Francisco Cândido Xavier inspirado num documentário sobre Madre Teresa de Calcutá. O mito "filantrópico" de Chico Xavier, feito para adoçar as mentes brasileiras nessa época de crise, só fez resgatar uma religiosidade ultraconservadora que em nada contribuiu para resolver de forma corajosa as injustiças e desigualdades vividas. Muito pelo contrário.

O que vemos é um saudosismo doentio, obsessivo, paranoico e viciado de pessoas que nunca deixaram de sentir saudade da Era Geisel, tentando a todo custo voltar o relógio social para 1974, o que pode, diante de novos contextos que exigem transfomação, criar um quadro ainda mais desastroso, próximo ao de uma catástrofe social. Pois desta vez é a plutocracia e as elites associadas que pagarão o preço caro de quererem retroceder o país.

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