sábado, 9 de abril de 2016

Allan Kardec, depois de morto, foi vítima de fraude de materialização

O FOTÓGRAFO FARSANTE, EDUARD BUQUET, E A FOTO MONTAGEM COM A VIÚVA DE ALLAN KARDEC, AMÉLIE GABRIELLE BOUDET, AO LADO DO SUPOSTO ESPECTRO DO MARIDO.

Sabemos que a deturpação da Doutrina Espírita já começou na França, embora o Brasil tivesse sido um terreno propício para esse processo infeliz, de tal forma que ele atingiu níveis praticamente insustentáveis e de difícil reparação.

Foi na França que se ascendeu o advogado Jean-Baptiste Roustaing, que com um serviço mediúnico de valor duvidoso - Roustaing utilizou apenas uma médium para receber mensagens - , lançou o livro Os Quatro Evangelhos atribuído aos quatro evangelistas e outros autores bíblicos, e dotado de muita mistificação igrejista.

Quando Allan Kardec faleceu de aneurisma cerebral, em 1869, sem chegar a completar 65 anos de idade, sua Doutrina Espírita estava desacreditada. Kardec, mesmo doente, escrevia compulsivamente e queria dar o máximo de esclarecimentos sobre suas descobertas intelectuais, contrariando conselhos médicos.

Kardec sabia que sua doutrina seria deturpada, e por isso se empenhou em dar o máximo de esclarecimentos que teve condições de dar. Procurava olhar o máximo para o futuro, e por isso havia lançado o Conselho Universal dos Ensinos dos Espíritos, um sistema de critérios e cautelas a serem tomados quando se toma conhecimento de uma suposta mensagem espiritual.

A Gênese e os textos que resultaram no livro Obras Póstumas, além das últimas edições da Revista Espírita sob sua responsabilidade, são resultados dessa fase, em que o autor mantinha sua lucidez impressionante mesmo com a doença e com o Espiritismo desacreditado por uma França fortemente católica.

Nem mesmo o sucessor de Kardec na Revista Espírita, Pierre Gaetan Leymarie, teve a mesma vigilância e o mesmo empenho do pedagogo de Lyon. Leymarie deixou que fossem publicadas fotos de falsas aparições espirituais, sobretudo uma suposta imagem do próprio Kardec.

As fotos foram feitas por Eduard Buquet, que dizia que as obras mostravam aparições de espíritos de pessoas falecidas. Numa delas aparece a pedagoga e artista plástica Amélie Gabrielle Boudet, viúva de Allan Kardec, sentada enquanto uma suposta imagem do espírito do marido, junto a um bilhete, aparecia no lado direito da foto.

Outras fotos também foram publicadas com a mesma fraude, Buquet fazia o trabalho assistido pelo jovem médium estadunidense Alfred Firman. Era cobrado um preço barato por cada foto, e as famílias levavam as fotos acreditando na farsa.

Depois, foi denunciada a fraude e Buquet foi ao banco dos réus. Leymarie também. Os dois foram condenados a um ano de prisão e multa de quinhentos francos. O juiz não parecia simpático à Doutrina Espírita, quando interrogou Amélie, então com 80 anos, chamada como testemunha.

O juiz interrogou sobre a origem do codinome "Allan Kardec" e Amélie custou a responder, ao que o juiz se adiantou respondendo que "conhecia" os livros de Kardec, que alegava terem sido inspirados no Grand Grimoire, um livro de feitiçaria.

Amélie reagiu negando isso e dizendo que Kardec só se inspirava nas mensagens que os espíritos diziam através de médiuns. O juiz insistiu com a origem do codinome e questionou o fato de Amélie ter registrado no túmulo este pseudônimo e não o nome de batismo, e Amélie respondeu para o juiz não brincar com essas coisas, argumentando que todos os literatos usam pseudônimos.

O juiz, irritado, disse que Kardec não era um literato e sim um "compilador" e insistiu na tese de que o pedagogo retirava ideias de livros de magia negra. Ordenou que a viúva do pedagogo francês se sentasse e encerrou o assunto.

A França havia retomado a política de inspiração católica, o que enfraqueceu a Doutrina Espírita. É simplório criar um maniqueísmo entre Espiritismo e Catolicismo, até porque, no caso brasileiro, esse maniqueísmo é falso, já que os conflitos eram apenas eventuais e o "movimento espírita" sempre agiu para agradar os católicos e adaptar ritos e dogmas da Igreja Católica.

Quanto aos sucessores de Kardec, mesmo discípulos como Camille Flamarion, amigo do pedagogo, não tiveram a mesma firmeza do Codificador. O Espiritismo perdeu o rigor científico e a precisão da busca do Conhecimento, e aos poucos sucumbiu ao religiosismo que o tornou uma versão mais informal do Catolicismo ou do Protestantismo (como no caso da Grã-Bretanha).

E foi por essa falta de firmeza e de vigilância que Pierre Leymarie, que herdou de Allan Kardec o comando da Revista Espírita, consentiu que fosse publicada uma série de fotos fraudulentas, que já poderiam causar estranheza pelo sensacionalismo fácil das pretensas aparições espirituais, sem estudo e dotadas de muitas irregularidades (como mostrar Kardec, que em vida foi um bonachão, tão sisudo quanto nas fotografias da época, que exigiam essa postura).

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