segunda-feira, 16 de novembro de 2015

O que faz muitos jovens serem grosseiros?

KIM KATAGUIRI, DO CONSERVADOR MOVIMENTO BRASIL LIVRE, É UM DOS MILITANTES DA NEURÓTICA DIREITA BRASILEIRA.

Qual a relação que têm os fanáticos torcedores de futebol carioca, os internautas que ficam endeusando siliconadas como Solange Gomes e Mulher Melão, ícones da hipersexualização do corpo feminino, e os "revoltados" que pedem a saída da presidenta Dilma Rousseff do Governo Federal na marra?

Simples. É o reflexo de uma juventude tomada de valores primários e que se apoia em valores conservadores que vão do machismo ao golpismo político ou da supervalorização do futebol como um lazer totalitário e escapista, um meio sutil de garantir o poder dos dirigentes esportivos junto à grande mídia.

A onda de reacionarismo juvenil existe desde a década de 1990, quando o conservador Fernando Collor - atualmente travestido num falso progressista - assumiu a Presidência da República. Jovens de classe média ou alta, usuários constantes de Internet, passaram a defender valores estabelecidos pela mídia, pela política e pelo mercado, para não dizer pelo moralismo mais retrógrado.

No entanto, essa onda se tornou ainda mais explícita nos últimos meses, quando vieram grupos defendendo valores dos mais negativos, envolvendo machismo, racismo, violência, desrespeito às leis, e tudo isso usando a desculpa de "desejar um Brasil livre" e "lutar contra a corrupção".

Alguns aperitivos já eram vistos há dez anos, quando internautas faziam trolagem para zelar por valores ditados pela grande mídia e pelo mercado, ensaiando a defesa de valores machistas considerando tabu falar mal das "mulheres-frutas", fenômeno de hipersexualização do corpo feminino lançado pela grande mídia através do "funk" (ritmo que poucos admitem ser um subproduto das Organizações Globo).

A ascensão de grupos reacionários como Revoltados On Line, Acorda Brasil e Movimento Brasil Livre, que a exemplo de organizações surgidas durante o governo João Goulart, chegam a ser financiadas por grandes empresas, é um sinal de alerta, ao lado de vários episódios recentes de profundo retrocesso social.

Comentários racistas eram feitos em série contra várias pessoas negras, e duas vítimas famosas foram atingidas: a jornalista Maria Júlia Coutinho, a Maju, e a atriz Taís Araújo. Passeatas pelo Fora Dilma exibiam clamores pedindo a volta da ditadura militar (agora denominada "intervenção militar").

A funqueira Renata Frisson, a Mulher Melão, tentou empastelar um toplessaço no Rio de Janeiro, manifestação de mulheres chamando a atenção para problemas femininos como o estupro e o câncer de mama, e desvirtuou o sentido original do protesto, com seu volumoso corpo siliconado e sua figura sensacionalista desviando as atenções dos jornalistas com o falso feminismo da "mulher-fruta".

Eduardo Cunha, inexpressivo político carioca que havia presidido a Telerj, era protegido e depois desafeto de Fernando Collor e se casou com a bela jornalista Cláudia Cruz, se ascendeu à vida política por meio de um surto moralista de cariocas satisfeitos ou resignados com as arbitrariedades locais do PMDB carioca.

Outro político mais votado pelos cariocas, o truculento Jair Bolsonaro, afeito a posições do mais retrógrado reacionarismo e tido como desordeiro até no Exército em que servia, recentemente foi recebido por um grupo de neo-nazistas enquanto desembarcava de seu avião num aeroporto de Recife.

Um desordeiro digital, já com ficha na polícia, está sendo investigado por possível envolvimento num blogue ofensivo à professora cearense Lola Aronovich, usando o nome dela para declarações que a blogueira, também militante feminista, em nenhum momento faria. O desordeiro já chegou a publicar um manual de estupro em um de seus blogues.

No Rio de Janeiro, o fanatismo de torcedores dos quatro principais times de futebol - Flamengo, Fluminense, Vasco e Botafogo - chegam mesmo ao ponto de fazer assédio moral e usar a torcida pelo esporte como moeda para as relações sociais, discriminando as pessoas que declaram não se interessarem por essa modalidade. Pessoas que nunca torceram para qualquer um desses times sofrem preconceitos sociais ou são negativamente marcadas pelos cariocas.

A grosseria juvenil tornou-se um fenômeno preocupante porque mostra que pessoas que pareciam arrojadas e modernas se dedicam a ações retrógradas, em certos casos extremas, como os nazistas que compareceram para saudar Jair Bolsonaro.

Valores que vão da defesa extremada do consumismo, mesmo no entretenimento - o fanatismo do futebol e o endeusamento machista a mulheres siliconadas que "mostram demais" - até inclinações racistas e golpistas de toda forma, em que se inclui a defesa do livre comércio de armas e de organizações neo-medievais como o Imperial Klans, revelam o lado sombrio que atrapalha o progresso do Brasil.

A baixa popularidade do Partido dos Trabalhadores tornou-se um dos fatores dessa onda reacionária (queentre 2005 e 2007 chegou a forjar falso esquerdismo, com parte dos reacionários fingindo apoiarem o PT e outra o PSOL só para impressionar os amigos), que se revolta demais com o reformismo acanhado que os governos de Lula e Dilma Rousseff realizaram em 12 anos.

É um reformismo acanhado, que pouco fez para realizar as prometidas profundas reformas sociais, mas o suficiente para despertar a ira dos que viam o risco de perderem os privilégios e o poder de influência que haviam desenvolvido e consolidado nos anos 90 e começo dos anos 2000.

Muitos desses jovens zelam por valores que correspondem a contextos de poder diversos: o poder político, o poder midiático, a "mão invisível" do mercado, a grande indústria do entretenimento, as instituições moralistas que pregam valores de cunho machista ou racista etc.

Esses "cães de guarda" apenas usam um discurso "rebelde" para causas anti-rebeldes. E representam um perigo para a sociedade brasileira, sob diversos aspectos. Protegidos pela relativa pouca idade (quando muito, eles estão no começo dos 40 anos), eles personificam o que Renato Russo havia cantado em 1984, na música "A Dança", do primeiro LP de seu grupo Legião Urbana:

"Você é tão moderno / Se acha tão moderno / Mas é igual a seus pais / É só questão de idade / Passando dessa fase / Tanto fez e tanto faz".

Por enquanto, o verniz de modernidade que a juventude garante protege esses novos reacionários. Mas quando eles um dia se tornarem realmente "maduros", mostrarão o quanto soarão velhos e antiquados, sem a roupagem de rebeldia, juventude e modernidade que lhes mascara seus propósitos retrógrados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Observação: somente um membro deste blog pode postar um comentário.