quinta-feira, 21 de setembro de 2017

Erros do "espiritismo" fortaleceram crescimento de evangélicos

O ENTÃO DEPUTADO EDUARDO CUNHA, HOJE PRESO, COMANDANDO UM CULTO EVANGÉLICO.

Os "espíritas" costumam dizer, com seu triunfalismo dotado de certa arrogância, que as críticas que seu movimento recebe são "benvindas", porque contribuem para aquilo que entendem como a "divulgação da Doutrina Espírita". Imaginam eles que podem enfrentar os piores obstáculos e saírem vencedores, colocando a deturpação acima de tudo, até do próprio Allan Kardec.

Na prática, porém, o que vemos é que os erros do "espiritismo" brasileiro, sobretudo a "fase dúbia" - que bajula Kardec mas segue ideias de Roustaing, algo visto na quase totalidade dos "espíritas" no Brasil e em movimentos similares no exterior - , favoreceram ainda mais o crescimento das seitas evangélicas, principalmente as da linha neopentecostal, nos últimos anos.

A "fase dúbia" surgiu depois da saída de Antônio Wantuil de Freitas do comando da FEB, que foi na virada dos anos 1960 para os 1970. Com a divulgação de irregularidades e a animosidade dos "médiuns" e das federações regionais ao grupo que herdou o poder de Wantuil, uma parcela considerável de roustanguistas, visando agradar os espíritas "científicos", prometeram participar da recuperação das bases doutrinárias originais do Espiritismo.

Essa promessa foi apenas maneira de dizer e manter as aparências, porque o igrejismo e a vaticanização do Espiritismo continuaram a todo vapor, apenas dissimulada por apreciações teóricas "corretas" do pensamento kardeciano original, ainda que por meio de traduções igrejeiras como as de Salvador Gentile, que passaram a prevalecer sobre a de Guillón Ribeiro, esta da FEB.

Mas a série de contradições que envolveu o "movimento espírita" a partir dos anos 1970, mesmo com a poderosa blindagem da Rede Globo de Televisão aos "médiuns espíritas" - transformados em sacerdotes à maneira do Catolicismo medieval, mas à paisana, sem batina - , não conseguiu neutralizar a ascensão das seitas neopentecostais, que agora tentam, através de processos ativistas (Movimento Brasil Livre) e legislativos (Bancada da Bíblia), impor velhos valores à sociedade.

A Rede Globo contribuiu para a reinvenção do mito de Francisco Cândido Xavier visando evitar a ascensão de pastores eletrônicos como Edir Macedo e R. R. Soares, nos anos 1970. O mito de Chico Xavier, trabalhado sob inspiração na receita de Malcolm Muggeridge para Madre Teresa de Calcutá, tornou-se um paradigma de "filantropia de novela", uma visão "positiva" de Assistencialismo, uma caridade que traz poucos resultados mas é feita para promover comoção e idolatria religiosa.

Apesar da blindagem que envolve os "espíritas", como se fosse o PSDB da religião - há denúncias de mediunidades fake que não são devidamente investigadas, mas aceitas cegamente por causa de mensagens aparentemente fraternais - , o "espiritismo" nunca conseguiu crescer, mantendo-se, oficialmente, com uma porcentagem de 2% de adeptos segundo dados do Censo do IBGE, mas podendo ser um número ainda menor se tornassem os critérios ainda menos confusos.

Enquanto isso, as seitas neopentecostais cresceram tanto que, de arrendamento em arrendamento, episódios como a compra de todo o espólio da Record pelo "bispo" Edir Macedo, da Igreja Universal do Reino de Deus, impulsionaram o crescimento das seitas neopentecostais e até de movimentos dissidentes.

Hoje a influência das seitas neopentecostais está na propaganda da Escola Sem Partido - embora seu projeto pedagógico seja "independente", apenas condenando o debate dos problemas da realidade e permitindo a crença de fantasias religiosas, o que faz com que católicos e "espíritas" também pudessem se enquadrar nesta causa - , nas censuras à arte engajada e em propostas como obrigar FMs laicas a tocarem música religiosa em sua programação.

Recentemente, por influência de movimentos neopentecostais, o Movimento Brasil Livre - do qual fazem parte figuras como Kim Kataguiri e o hoje vereador paulista Fernando Holiday, divulgador da Escola Sem Partido - , fizeram uma campanha nas redes sociais contra uma exposição sobre diversidade sexual que era exibida no Santander Cultural, em Porto Alegre, o Queermuseu.

O crescimento dos evangélicos, principalmente em Estados conservadores como os do Sul e Sudeste mas de forma não menos expressiva em outras regiões, está fazendo com que uma pauta retrógrada fosse proposta para o Brasil, fazendo o país retroceder para os padrões conservadores do século XIX.

RETROCESSOS

Na verdade, ocorre uma série de movimentos de retrocessos sociais, como se houvesse um saudosismo de parte considerável da sociedade brasileira em retomar paradigmas e padrões sociais de pelo menos, antes da Lei Áurea. Se bem que mesmo conquistas como a Independência do Brasil e a modernização do país após a chegada da família real portuguesa em 1808 podem ser postas a perder nessa cavalgada louca para trás.

A neurótica e psicótica retomada ultraconservadora faz com que muitas pessoas, em nome da recuperação de valores hierárquicos hoje obsoletos, cheguem a ameaçar mudanças sociais a ponto de, se necessário, agirem contra a Constituição e ameaçarem a democracia brasileira. Tanto que o candidato dos neopentecostais é um desordeiro político, Jair Bolsonaro, infelizmente com grandes chances de ser eleito presidente do Brasil.

O "espiritismo", que nunca representou qualquer diferencial de religião e, muito pelo contrário, se tornou um "segundo Catolicismo", também está sintonizado com os movimentos retrógrados do país. Se pautando no antigo Catolicismo jesuíta, de origem portuguesa e medieval, que vigorou no período colonial, o "espiritismo" brasileiro passou a ter uma agenda cada vez mais conservadora, igrejista, de apelos emocionais piegas, e sinalizou apoio ao projeto político do presidente Michel Temer.

Solidário à "Bancada da Bíblia" em causas como a condenação ao aborto mesmo em casos de estupro - os "espíritas" chegam a recomendar à estuprada que "dialogue fraternalmente" com o estuprador - , o "movimento espírita" acaba consentindo a ascensão dos neopentecostais, até pela afinidade conservadora de suas ideias.

Bem antes da "cura gay", que voltou a ser defendida, desta vez por um juiz evangélico, Waldemar Cláudio de Carvalho, do Distrito Federal, o "médium" Chico Xavier atribuiu o homossexualismo à "confusão mental" do espírito encarnado, como se fosse uma doença psicológica. A ironia é que o "médium" foi famoso pelos gestos efeminados que fizeram alguns atribuírem a Chico supostas encarnações passadas em personalidades femininas.

Mas aí temos o vereador Fernando Holiday, que, negro e gay, também participa de pautas conservadoras que se voltam contra negros e gays. Ele quer revogar o Dia da Consciência Negra sob a desculpa de que não deveria haver uma data de consciência do povo negro, mas de "todos os brasileiros". A desculpa usada pelo membro do MBL é a mesma dos "espíritas", voltada a uma suposta fraternidade entre os cidadãos.

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