terça-feira, 3 de janeiro de 2017

Por que não há uma Leah Remini do "espiritismo" brasileiro?


Quanta diferença entre o exterior e o Brasil. Na vida política, enquanto lá fora especialistas sérios conseguem repercutir com seus graves alertas sobre o desastre que é o governo do presidente Michel Temer, em todos os aspectos, aqui há quem veja alguma validade nesse projeto político bastante catastrófico, nocivo à população e realizado sob o arrepio da lei.

Atores conceituados fizeram manifestos contra a votação do impeachment que tiraria de vez a presidenta Dilma Rousseff e o Senado não deu ouvidos. Estudioso da ONU fez um relatório dizendo que a PEC dos Gastos Públicos é uma afronta aos direitos humanos e, mesmo assim, a proposta foi aprovada, virou lei e irá estrangular a economia brasileira por vinte anos.

Lá fora, a ex-adepta da Cientologia, a atriz Leah Remini, exigiu da seita uma indenização de US$ 1,5 milhão (equivalente a R$ 5,1 milhões, no câmbio atual) por danos morais e como devolução das doações que ela deu à religião. Ela denuncia, também, que a Cientologia teria recorrido a uma rede de TV a cancelar o documentário dela sobre a seita.

E aqui no Brasil? No momento, o Rio de Janeiro - que, mesmo decadente, ainda insiste com a ilusão de bancar a "cidade-modelo" do país - vive um catastrófico calor de 43°, perigoso para a saúde da população, e as pessoas felizes achando que estão vivendo no paraíso. Com temperatura infernal?

Ficamos imaginando como seria se o Rio de Janeiro estivesse no lugar de Pompeia. A despreocupação dos brasileiros, sobretudo os cariocas, é preocupante, e ficamos pensando o que os cariocas veriam com as pedras de lava do Vesúvio caíssem sobre elas, e a lava escorrendo pelas ruas. Alguém teria coragem de rir com isso?

O Brasil é um país tão absurdo que, aqui, mulher-objeto pode ser considerada "feminista" mesmo se "sensualizando demais" como se fosse carne de rua. Só porque a mulher-objeto não tem, em tese, algum namorado ou marido, ou porque não é escrava do lar, não significa que ela seja feminista, até porque trabalha uma imagem claramente machista de sensualidade e exploração do corpo feminino.

No âmbito da religião, não bastasse a ameaça dos evangélicos em instaurar uma teocracia no Brasil, consolidando sua supremacia no Poder Legislativo e já invadindo setores do Poder Executivo, há a blindagem do "espiritismo" em que é possível usar falsidade ideológica sem que a Justiça mexa e, o que é pior, com ampla chance de obter o consentimento dos familiares do morto usurpado.

O Brasil é um país ensandecido, em que há insegurança jurídica, vulnerabilidade ética e social de todos os tipos, e não há um movimento para combater em larga escala as catástrofes sociais que existem. Questionamentos existem aqui e ali, mas eles não repercutem o suficiente para combater os aberrantes retrocessos que ocorrem no país, que beneficiam os que mais cometem abusos por impulso do egoísmo.

O "espiritismo" já se equipara aos movimentos neopentecostais pela combinação de erros, ambição e blindagem sócio-jurídica, se bem que no caso dos neopentecostais, a Justiça ainda pega em cima deles dependendo das circunstâncias. Entre os "espíritas", salvo uns "peixes pequenos" aqui e ali, como a pediatra de Rondonópolis, que se recusou a atender uma criança vítima de estupro por causa do moralismo "espírita" que sempre coloca a vítima é a culpada.

Não há um documentário oficial denunciando as irregularidades do "espiritismo". Mas há documentários sobre bobagens em prol da seita, embora não sejam crenças unânimes. A suposta profecia da Data-Limite, por exemplo, não é aceita por todos os seguidores de Francisco Cândido Xavier, havendo quem veja nelas um absurdo, por crer que seu ídolo seria incapaz de tal aventura.

E isso já é grave. Põe-se um documentário sobre supostas profecias que nem todos os seguidores do suposto médium concordam. O "espiritismo" mostra irregularidades muito piores do que a Cientologia ou a vida de Madre Teresa de Calcutá. que possuem documentários denunciando suas irregularidades.

Um produtor que decida, por exemplo, denunciar as irregularidades de Chico Xavier, provando, entre outras farsas "mediúnicas", a maior delas, a de Humberto de Campos - que em verdade se afastou, horrorizado, de qualquer assédio do anti-médium mineiro - , dificilmente receberia um centavo dos anunciantes e mesmo um crowdfunding, financiamento independente pela Internet, seria muito difícil e atingiria uma arrecadação longe de pagar os mais singelos custos de produção.

Não há uma Leah Remini com visibilidade e prestígio para denunciar. O que Chico Xavier fez com Humberto de Campos é algo que nem um inimigo teria coragem de fazer, um revanchismo barato só porque Humberto, em vida, não fez um comentário elogioso com um livro de Xavier, e, morto, foi usurpado da maneira mais leviana, oportunista e obsessiva possível, com o esperto "médium" ainda aliciando os familiares do autor morto, não bastasse a impunidade dada pela Justiça.

As irregularidades cometidas pelo "espiritismo" brasileiro são muito mais graves e preocupantes do que uma mera predileção ao igrejismo de Jean-Baptiste Roustaing, hoje tendenciosamente descartado (como o ex-deputado Eduardo Cunha no âmbito político). Envolve fraudes "mediúnicas" que não podem ser aceitas sob o pretexto da carteirada religiosa, porque elas destoam seriamente dos estilos e aspectos pessoais dos mortos a que tais obras são atribuídas.

Esquece-se, por causa do deslumbramento religioso, que as obras de falsificação buscam o máximo de semelhanças com as obras autênticas. Não são as semelhanças que conferem autenticidade, se existem diferenças que podem derrubar qualquer presunção neste sentido. As supostas obras mediúnicas são autenticadas apenas levando em conta as semelhanças, mas existem diferenças que vão contra a natureza de cada falecido que é atribuído a essas obras.

É preciso que as pessoas abram mão de tantos apegos a paradigmas, dogmas e totens que já não fazem mais sentido. Deixar a arrogância de manter esses apegos só porque o Brasil não é a Europa e os EUA. O problema não é o Brasil ser Europa ou EUA, mas devem ser aproveitados procedimentos e posturas adotados pelo povo desses lugares que freia a ascensão e combate a supremacia daqueles que agem em torno do abuso, da desonestidade e do arrivismo.

Temos que deixar a doença infantil de aceitarmos tudo porque, na primeira denúncia, o acusado vem com imagens de crianças pobres tomando sopa ou velhinhos doentes dormindo nas ruas. É um vício grave recorrer à carteirada religiosa para acobertar fraudes de seitas e crenças e garantir aos ídolos religiosos a impunidade, por causa de suas desonestidades feitas "em prol da caridade". Caridade não é cúmplice da fraude e do engano, vale lembrar.

É essencial deixar de lado fantasias, deslumbramentos e teimosias que parecem confortáveis, mas trazem muito prejuízo para o nosso país. Vide o desastrado governo de Michel Temer, instituído por causa de tantas fantasias e ilusões em torno das pessoas de algum status quo elevado, seja ele jurídico, econômico, empresarial, midiático e político. Pagamos o preço do apego a essas ilusões de atribuir valor a alguns "iluminados" do diploma, dinheiro, fama etc.

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