domingo, 23 de agosto de 2015

Corrupção política e corrupção "espírita"


No último domingo, setores da classe média brasileira realizaram mais uma passeata contra o Governo Federal, sob o pretexto de protestar contra a corrupção. Embora a grande imprensa anunciasse as manifestações do último 16 de agosto como "grandiosas", a verdade é que elas repetiram a morna repercussão das manifestações anteriores, em que a cobertura jornalística dominante faz mais barulho do que os fatos soaram.

Como manifestações voltadas para setores conservadores, a exemplo da antiga Marcha da Família Unida com Deus pela Liberdade - apoiada por Chico Xavier e a Federação "Espírita" Brasileira - , ocorrida em 1964, as passeatas "contra a corrupção" cometeram as suas habituais gafes, como defender a ideia de que uma intervenção militar seria feita "em respeito à Constituição" e manifestar solidariedade ao prepotente e anti-legalista presidente de Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha.
É verdade que o Partido dos Trabalhadores anda envolvido em corrupção, e as esquerdas, mesmo a petista, já não conseguem mais esconder.

A recente prisão do ex-chefe da Casa Civil do governo Luís Inácio Lula da Silva, José Dirceu, antiga figura histórica do movimento estudantil de 1968, sinalizou esse quadro, que causa profundo desgaste ao partido fundado em 1980. O PT está no comando do Governo Federal desde 2003, depois de Lula ter enfrentado várias derrotas eleitorais na campanha eleitoral, a primeira delas contra Fernando Collor, em 1989.

A corrupção do PT envolveu alianças políticas e empresariais suspeitas, das quais as primeiras denúncias se referiram ao esquema de propinas montado pelo publicitário Marcos Valério, esquema conhecido como Mensalão. Nessa época, figuras da corrupção política nacional, como Paulo Maluf, José Sarney, Fernando Collor ou mesmo o baiano Mário Kertèsz, se aliaram a Lula dentro de um esquema de conveniências e favorecimentos pessoais.

Ultimamente, se investiga o esquema de propinas da Petróleo Brasileiro S/A (Petrobras), num processo conhecido como Operação Lava-Jato. Dirceu havia sido denunciado por envolvimento com Marcos Valério, assim como outra figura história da luta contra a ditadura, o ex-presidente do PT, José Genoíno, remanescente dos guerrilheiros que lutaram no Araguaia, em 1972. Preso, Genoíno acabou vivendo seu inferno astral político.


No caso da Petrobras, a corrupção envolve três partidos: PT, PMDB e PP. O PMDB é remanescente dos dois partidos da ditadura, correspondendo a uma versão repaginada do antigo MDB, Movimento Democrático Brasileiro, oposição de fachada que misturou comunistas menos radicais e pessedistas (ligados ao antigo PSD de Juscelino Kubitschek) moderados.

Atualmente, o PMDB, oficialmente sem uma linha ideológica definida por ter sido um histórico balaio de gatos se comportando ultimamente como um parasita político - estabelece seu poder na carona de outros partidos, às vezes o PSDB, outras o PT - , demonstra sua linha autoritária através de sua filial carioca, por meio de figuras como Eduardo Paes, Sérgio Cabral Filho, Luiz Fernando Pezão, Carlos Roberto Osório e, sobretudo, Eduardo Cunha.

É uma tendência autoritária que impõe decisões nem sempre benéficas para a população, sancionadas à revelia da lei. Eles agem com arbitrariedade, mas tentam, no discurso, fazer crer que estão agindo a favor da lei e do interesse público, como se observa na praxe dissimuladora típica de nosso país.

Mas a corrupção pode se expandir para outros partidos políticos e envolve pessoas autoritárias, mas nem por isso mais responsáveis no tratamento da coisa pública. Eduardo Cunha também está envolvido no esquema investigado pela Lava-Jato, tendo sido denunciado por cobrar propina de um empresário. Há também outros esquemas de corrupção, como o dos trens de São Paulo, chamado de Trensalão.

O esquema do Trensalão envolveu uma empresa estrangeira que, através de um duvidoso esquema de concessão para o transporte ferroviário paulistano, injetou uma grande soma financeira que favoreceu não só o governo estadual e a prefeitura da capital paulista, então comandados pelo PSDB, como também o então candidato à reeleição à Presidência da República, o sociólogo Fernando Henrique Cardoso.

O que preocupa os setores conservadores, definidos como a direita brasileira, é que as investigações pudessem incriminar seus próprios ídolos. Mesmo o senador Aécio Neves, derrotado nas eleições presidenciais de 2014, está envolvido em diversos casos de corrupção.

Segundo a revista Carta Capital, os protestos anti-PT escondem uma intenção de, usando o pretexto do "combate à corrupção", pedir a expulsão do PT do Governo Federal e assim paralizar ou enfraquecer as investigações, evitando atingir setores da oposição.

A CORRUPÇÃO "ESPÍRITA"

A corrupção no "movimento espírita" também atinge dimensões estratosféricas, com o agravante dela ser justificada pelos pretextos de "amor e bondade". Desde os primórdios da FEB, a corrupção se deu a partir da adoção de conceitos anti-kardecianos trazidos por Jean-Baptiste Roustaing, nome hoje tendenciosamente descartado pelo movimento, apesar de suas ideias serem seguidas até pelos dissidentes da FEB ou por supostos "kardecistas autênticos".

Até mesmo a figura do doutor Adolfo Bezerra de Menezes, contrariando o que aconteceu com seus contemporâneos Rui Barbosa e Machado de Assis, por exemplo, teve sua figura de político "fisiológico" (afeito a conchavos em troca de vantagens pessoais) substituída pela figura mítica e fantasiosa do "anjo encarnado", "unificador dos espíritas".

A fantasia substituiu a realidade, Bezerra foi trabalhado à imagem de um "Papai Noel brasileiro" e, para completar, supostas psicografias e psicofonias sob o nome do dr. Bezerra foram feitas coroando a atual tendência do "movimento espírita" trair o pensamento de Allan Kardec e, no entanto, declarar suposta fidelidade a este.

Desvios grosseiros eram feitos em relação à Doutrina Espírita e enxertos católicos eram inseridos sutilmente, criando equivalentes diversos como a "reunião doutrinária", o "auxílio fraterno", o "evangelho no lar" e a "água fluidificada", que no Catolicismo correspondem, respectivamente, à missa, ao confessionário, à novena e à água benta.

Por outro lado, não houve qualquer estudo a respeito de vida espiritual nem de atividade mediúnica. Sem a educação necessária, supostos médiuns não quiseram ter a concentração necessária para se comunicarem com espíritos falecidos e preferiram redigir, de suas próprias mentes, mensagens de apelo religioso, mesmo o mais sutil, as quais eles apenas usavam o crédito das pessoas falecidas.

Essa prática infeliz, popularizada por Francisco Cândido Xavier - ele mesmo um católico fervoroso e adorador, dos mais materialistas, de imagens religiosas - , criou uma péssima "escola espírita" que seduz até acadêmicos e cria todo um rol de mistificações e mentiras que monografias de metodologia engenhosa, mas falha em muitos aspectos, tentam em vão legitimar.

A corrupção "espírita" é tanta que Chico Xavier está associado a terríveis pastiches literários, já a partir de seus livros mais conhecidos, Parnaso de Além-Túmulo e Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho. Uma análise comparativa entre as obras "espirituais" e o correspondente ao que os autores alegados fizeram em vida derruba qualquer veracidade do trabalho de Xavier.

Para piorar, sua apropriação a personagens falecidos, como o escritor Humberto de Campos, a poetisa Auta de Souza e a anônima professora Irma de Castro Rocha, a Meimei, fez aumentar ainda mais a corrupção "espírita", que de forma preocupante foi legitimada por uma ideologia expressa por apelos piegas de "amor e bondade", com palavras dóceis e arremedos de filantropia.

Assim, Chico Xavier virou um dos maiores "donos dos mortos" que se tornaram os ditos "médiuns espíritas". Ele deixou de ser um intermediário do contato entre vivos e mortos e virou a atração principal do sensacionalismo no "movimento espírita", em espetáculos com um apelo popularesco semelhante ao das "mesas girantes" e "tábuas Ouija".

Isso criou um caminho inverso do que Allan Kardec havia feito na França. Se ele examinava e questionava esses espetáculos ocultistas e desenvolvia, através desses questionamentos, conceitos e questões que compõem a Ciência Espírita, Chico Xavier fez essa ciência regredir para o nível dos mesmos espetáculos duvidosos que atraíram multidões que queriam "falar com os mortos".

Através de Chico Xavier, veio uma "indústria" de anti-médiuns que, como ele, se recusaram a assumir um papel intermediário e viraram estrelas, virando dublês de pensadores e arremedos de filantropos. Depois de Chico, Divaldo Franco puxou toda uma tendência de falsos médiuns e palestrantes pretensiosos, falsos sábios que se passavam por "filósofos" num Brasil carente de grandes filósofos (pelo menos aqueles cujo pensamento está à prova do tempo).

A corrupção se torna tão aberrante que três manobras são observadas. Primeiro, a pretensão de "originalidade" na restrição da Doutrina Espírita, no Brasil, a um mero movimento religioso (claramente influenciado pelo Catolicismo medieval português). Segundo, a bajulação a Allan Kardec sob alegação de "rigorosa fidelidade a seu pensamento", enquanto na prática se comete traições severas a ele. E, terceiro, diante das acusações de irregularidades, o bom-mocismo através das alegações de "amor e caridade" como tentativa de validação do "movimento espírita".

A traição ao pensamento de Allan Kardec e às suas recomendações, que os "espíritas" fazem, com toda a sua bajulação e alegação de "rigorosa fidelidade", faz o movimento se tornar a mais corrompida tendência religiosa no Brasil. Isso porque o "espiritismo", em princípio, assumiu responsabilidades que foi incapaz e até indisposto a seguir.

A desonestidade ideológica agrava a corrupção que já causou sérios danos à apreciação do pensamento de Allan Kardec pelos brasileiros. E esse quadro terrível não pode ser dissimulado por alegações de "amor e caridade" que nada contribuem para resolver as confusões e irregularidades observadas.

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