terça-feira, 17 de fevereiro de 2015
Chico Xavier e o sonho "carnavalesco" da "Cidade da Luxúria"
Sempre os sonhos. Francisco Cândido Xavier é o único que, quando sonha, sofre "desdobramento astral" e tudo aquilo que ele sonha é "profecia" e "alerta para a humanidade". Somo se ele fosse tomado de superpoderes, como ente sobrenatural que acabou sendo considerado pelos seguidores.
As pessoas vão reclamar. Mas elas mesmas consideram Chico Xavier "sobrenatural", sem admitir que ele seja. Isso porque, para elas, Chico Xavier é o único que erra muito e erra feio e "sempre está certo", é "espírito puro" com suas imperfeições graves e o único capaz de desafiar os argumentos da lógica e do bom senso, contraria Allan Kardec e é considerado como "fiel" a este.
Fazer o quê? Chico Xavier, o homem das contradições, o vice-Deus de todo o universo, na visão de seus defensores, que se dizem altamente espiritualizados mas movem suas paixões materialistas no endeusamento de um estereótipo do "bom caipira" depois convertido no "velhinho humilde". Apesar de toda alegação espiritualista, são paixões apegadas ao mais puro materialismo.
Pois o Chico Xavier dotado de superpoderes havia comunicado ao amigo Newton Boechat um sonho - o tal "desdobramento espiritual" - que teve em 1950 quando ele foi "levado" pelo mentor Emmanuel para conhecer uma "Cidade da Luxúria" cujo cenário pode aludir hoje ao Carnaval de Salvador, com sua viscosa e enjoativa axé-music. Ou então um Rio Parada Funk. Diz Newton Boechat:
"Em um dos constantes desdobramentos astrais ocorridos com nosso querido médium, durante o sono, Emmanuel conduziu o duplo-astral de Chico Xavier a uma imensa cidade espiritual, situada na região do Umbral. Esta lhe pareceu extremamente inferior e bastante próxima da crosta planetária. Era uma cidade estranha não só pelo aspecto desarmônico e antiestético, como pelas manifestações de luxúria, degradação de costumes e sensualidade de seus habitantes, exibidas em todos os logradouros públicos, ruas, praças, etc. Emmanuel informou ao Chico que aquela vasta comunidade espiritual era governada por entidades mentalmente vigorosas porém negativas em termos de ética e sentimentos humanos. Eram estes maiores que davam as ordens e faziam-se obedecer, exercendo sobre aquelas entidades um poder do tipo das sugestões hipnóticas, ao qual tais Espíritos estariam submetidos, ainda mesmo depois de reencarnados. Pelas ruas da referida cidade estranha, desfilavam, de maneira semelhante a cordões carnavalescos, multidões compostas de entidades que se esmeravam em exibições de natureza pornográfica, erótica e debochada. Os maiorais eram conduzidos em andores ou tronos colocados sobre carros alegóricos, cujos formatos imitavam os órgãos sexuais masculinos e femininos. Uma euforia generalizada parecia dominar aquelas criaturas, ou mais aproximadamente, assistia-se a uma “festa de despedida” de uma multidão revelando a certeza da aproximação de um fim inexorável, que extinguiria a situação cômoda até então usufruída por todos. De fato, aqueles Espíritos, sem exceção, haviam recebido um aviso de que estava determinado, de maneira irrevogável pelos “Planos da Espiritualidade Superior”, o seu próximo reingresso à vida carnal na Terra. A esse decreto inapelável não iriam escapar nem os próprios maiorais".
Narrativa de cunho materialista. Uma cidade tomada de luxúria e que é localizada no centro da Terra. Líderes moralmente inferiores mandando nas demais pessoas. Pessoas desfilando com exibições de natureza pornográfica e debochada. Suposto fim inexorável pelo anúncio de retorno ao mundo carnal, mediante "decreto inapelável dos planos da espiritualidade superior".
Pode até ser que a turma da "Cidade da Luxúria", se de fato existiu - devemos prestar atenção que é um sonho, que pode ser de Chico Xavier ou de um mendigo, é apenas um sonho de quem dorme - , ganhou seu equivalente nas pessoas que se reúnem no Carnaval de Salvador, ou em eventos como a Festa de Barretos ou o Rio Parada Funk, ou qualquer evento que os grandes chefões da mídia definem como "balada".
SABE NADA, INOCENTE - O É O Tchan tem seus sucessos livremente expostos para o público infantil do "Coração do Mundo", tendo sido tocado até em evento filantrópico "espírita".
No entanto, não houve "decreto inapelável" nem "Planos da Espiritualidade Superior" que determinaram a ida dessas pessoas, inclusive os chamados "maiores" (os chefões de toda a baderna onírica sonhada por Xavier), mas uma baixa sintonia espiritual brasileira, trazida sobretudo pela ditadura militar e seus apoiadores, que "trouxeram" a patota toda para o Brasil de hoje.
CONDENAÇÃO OU APOLOGIA?
O que se observa no suposto sonho "carnavalesco" de Chico Xavier é o sentido ambíguo da festa lembrar o Carnaval de Salvador ou um Rio Parada Funk, talvez o misto dos dois. Mas, à primeira vista, isso traz uma grande dúvida sobre se o sonho era para atribuir o fim de uma manifestação luxuriosa, ou o começo de sua implantação no "Coração do Mundo" brasileiro.
Soa muito ambíguo que o sonho sugira o fim dessa fase toda, quando sabemos que o "espiritismo" brasileiro sempre estimulou ou consentiu que muitas condições sociais para tais deslizes de ordem moral e sócio-cultural aconteçam. O "espiritismo" apoiou de maneira direta ou indireta, mesmo com seu moralismo rigoroso.
Só que não vemos o tal "fim inexorável", muito pelo contrário. O que vemos é a expansão dos piores valores, decisões, procedimentos e pontos de vista, num crescente e diversificado retrocesso social, sob vários ramos da atividade humana, a quatro anos da tal "data-limite" que celebrava a antiga fantasia de Chico Xavier de ver seu "País das Maravilhas" virar a nação mais poderosa do mundo.
Aliás, se alguém observar, no caso do "funk" (manifestação extrema dos piores instintos humanos no Brasil), o que elites de antropólogos, ativistas, jornalistas e famosos falam sobre o gênero, eles usam dos mesmos "bons argumentos" que Chico Xavier usa para prever o "reino de amor" que sua suposta profecia da "data-limite" alega prever para o Brasil do futuro.
Já se viu famílias, algumas delas "espíritas", que faziam desfiles escolares, de cunho filantrópico, que tocavam sucessos do É O Tchan diante de criancinhas desavisadas por pais que, alegremente, despejavam esse ícone do "melhor da música baiana" nos ouvidos ingênuos da criançada.
Que "Coração do Mundo" é esse? Será que Emmanuel estava feliz da vida ao saber que a "Cidade da Luxúria" que se situava no centro da Terra - como se os espíritos embrutecidos, tomados de interesses materialistas no além-túmulo, aguentassem viver num forno aquecido, num equivalente "espírita" do Inferno católico - iria ser extinta e seu povo se espalhar para todo o Brasil?
E o que vai resolver o problema dos excessos cometidos? Oração em silêncio? Servir aos nossos algozes, que se divertem com tais excessos? Condescendência e confiança passiva no "tempo"? Engolir sapos? Ou então o jeito é aderir a essa farra toda e depois ler um daqueles terríveis livros de Emmanuel que trazem ainda mais azar para nossas vidas?
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