sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Heterodoxo nos ritos, Catolicismo de Chico Xavier era ortodoxo nos dogmas

NOSSA SENHORA DA ABADIA ERA A SANTA DE DEVOÇÃO DE CHICO XAVIER.

Oficialmente, Francisco Cândido Xavier é visto como uma pessoa que enfrentou a Igreja Católica para professar seu "espiritismo" e combatia tradições medievais para trazer a nova espiritualidade em conceitos e valores futuristas que anunciavam a liderança plena do Brasil no futuro da Terra.

Essa visão, defendida por muitos e consagrada oficialmente como se fosse uma verdade indiscutível, é, todavia, falsa. A construção do mito de Chico Xavier criou aspectos surreais como os do parágrafo acima, que à menor comparação com fatos reais, se desfaz como castelo de areia ao menor contato com o mar, pela falta de lógica que a generosa mitologia se apresenta.

O que se pode verificar, com muita atenção, é que Chico Xavier nunca foi um espírita de verdade. Ele era paranormal, mas era católico fervoroso e, em seus livros, tudo o que ele fez foi inserir o que havia de mais retrógrado no Catolicismo travestido de "espiritismo moderno".

Em muitos aspectos, os livros de Chico Xavier retrocedem, e muito, em relação às ideias transmitidas por Allan Kardec. Temas como o machismo, abordagens racistas (como definir negros e índios como "condenados morais") e intolerância religiosa (o anti-semitismo) são vistas como "positivas" pela bibliografia chiquista, que em muitos trechos prega valores puramente medievais.

O que chama a atenção é que Chico Xavier era um católico heterodoxo "em termos". Ele irritava setores da Igreja Católica porque fazia práticas paranormais e começava a atender pessoas com sua suposta "mediunidade", prática considerada clandestina e, sinceramente, quase nunca devidamente valorizada e sistematizada no Brasil.

No entanto, podemos assegurar que Chico Xavier era um católico heterodoxo apenas no aspecto ritual, e nem tanto assim. Ele nunca rompeu com a Igreja Católica, como instituição, e saiu muito magoado por ter sido excomungado, não por sua índole "bondosa" ter sido machucada na ocasião, mas porque era um dos mais apaixonados católicos do Brasil.

No aspecto dogmático, Chico Xavier era tão ortodoxo quanto aqueles que o excomungaram. E mesmo alguns ritos eram mantidos, apesar de sua paranormalidade, como a adoração de imagens de santos, com as quais Chico Xavier conversava feito um beato. Ele tinha um altar particular de adoração a esses santos, era um beato católico além da conta.

A devoção religiosa de Chico Xavier faz com que seja inútil pensar se ele foi ou não Allan Kardec em outra encarnação. Com a mais absoluta certeza e de forma comprovada e comprovável por argumentos dos mais consistentes, Chico nunca teria sido Kardec, por diferenças de índole, de ideias, de temperamento, de trabalho, de tudo. É uma hipótese falida e rejeitada por sua própria natureza.

Chico Xavier demonstrou seu catolicismo em entrevista ao programa Pinga Fogo, em 1971. E um catolicismo bem mais conservador que Dom Hélder Câmara e Alceu Amoroso Lima, só não era um conservadorismo furioso como se via no Gustavo Corção, que se vivo fosse seria o sacerdote predileto dos Revoltados On Line.

Mesmo assim, Chico Xavier assustava quando dizia que a ditadura militar - que era conhecida como "revolução" na época - estava construindo um "reino de amor e luz" do Brasil futuro, porque era um "reino" construído com os sangues de muitos prisioneiros, torturados e desaparecidos políticos.

Ele pedia para respeitarmos o Vaticano como entidade superior da Igreja Católica, apresentava em seus livros uma visão medieval de Jesus Cristo, estabelecia contatos espirituais com o jesuíta Padre Manuel da Nóbrega, que virou Emmanuel, e inseria abordagens bíblicas também típicas da Idade Média em muitas e muitas de suas obras.

O catolicismo de Chico Xavier é tão certo que o "espiritismo", a partir dele, fortaleceu e consolidou muitas práticas católicas, adaptadas à "nova doutrina": a água-benta virou "água fluidificada", o confessionário virou "auxílio fraterno", os santos viraram "espíritos de luz", a missa virou doutrinária, a penitência se transformou em "Evangelho no lar" etc.

Até mesmo a devoção que os seguidores de Chico Xavier têm ao anti-médium é do mais mofado catolicismo. É risível que tanta gente, mesmo muitas donas-de-casa, dissimulem seu fervoroso catolicismo em prol de Chico Xavier, fingindo que entendem de ciência, dizendo que são intelectualizadas, dentro da habitual hipocrisia dos "espíritas" brasileiros.

Daí que a gente define Chico Xavier como "católico heterodoxo" por uma questão de formalidade. Isso porque ele exercia a paranormalidade - mas muito longe do "super-médium" que oficialmente se acredita dele, mas que ele nunca foi - e estabeleceu uma relação conflituosa com líderes católicos, a ponto de deixar Pedro Leopoldo para viver o resto de seus dias em Uberaba.

Porém, o catolicismo de Chico Xavier, ideologicamente falando, era tão ortodoxo quando o de seus opositores, e lendo os livros do anti-médium observa-se justamente isso. Como também de seu maior seguidor, o baiano Divaldo Franco, outro católico de carteirinha que parece até ter treinado dicção nas fileiras católicas. Só os desinformados não admitem que eles são "católicos da gema".

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