quinta-feira, 8 de junho de 2017

"Espiritismo" brasileiro nunca rompeu realmente com Roustaing

NÃO TEMOS FOTO DE JEAN-BAPTISTE ROUSTAING, MAS SUA CONTRIBUIÇÃO AO "ESPIRITISMO" BRASILEIRO FOI COMO A DE EDUARDO CUNHA PARA O GOVERNO TEMER.

O "espiritismo" brasileiro se complicou cada vez mais, porque sua "fase dúbia" nunca resolveu de verdade o sério problema da igrejificação da Doutrina Espírita. A volta da velha promessa de "conhecer melhor a obra de Kardec" mais parece causar apreensão do que qualquer esperança ou consolo.

Isso porque será a repetição da velha ladainha de alternar uma exposição aparentemente correta da teoria espírita autêntica com o igrejismo mais derramado e pegajoso. Enquanto aparentemente se "estuda melhor" o pensamento de Allan Kardec, se pratica ideias e procedimentos contrários a ele.

Nas últimas quatro décadas, a "fase dúbia" representou uma falsa estabilidade no "movimento espírita". Os roustanguistas aceitariam "estudar melhor Kardec" e os kardecianos aceitariam os apelos igrejeiros nos limites das "mensagens positivas" e "ações de caridade". Um acordo por conveniência que forjou um suposto equilíbrio no "movimento espírita" brasileiro.

Só que esse período de "paz" era como um vulcão adormecido, afinal, se as antigas confusões no "movimento espírita" passaram a ser abafadas e "resolvidas" por um suposto diálogo, as velhas contradições e conflitos de ideias sempre vêm à tona, criando um quadro muito chocante em relação ao que deveria ser o Espiritismo proposto pelo próprio Kardec.

O "espiritismo" brasileiro nunca rompeu com sua raiz ideológica, calcada em Os Quatro Evangelhos de Jean-Baptiste Roustaing. O nome de J. B. Roustaing pode ser visto como um palavrão por muitos "espíritas", mas seu legado ideológico, de profundo igrejismo, foi mantido em sua essência nos postulados da doutrina brasileira.

Os romances "espíritas" e o mito dos "médiuns" dotados de culto à personalidade, tendo se tornado verdadeiras aberrações so serem transformados em ídolos religiosos, reforçaram esse roustanguismo, que permanece forte mesmo na "fase dúbia" - que insiste numa suposta "fidelidade a Kardec" - , em um típico caso de uma ideologia que renega o ideólogo mas herda suas ideias.

A grande hipocrisia que a "fase dúbia", na qual se falam até na "total valorização da obra de Kardec", causou foi uma grande erosão doutrinária, que aos poucos fez o que parecia ser um "espiritismo à brasileira" se transformar numa versão repaginada do velho Catolicismo jesuíta que vigorou no período colonial. Ou seja, o "espiritismo" virou um clone do Catolicismo, só que mais medieval.

O rol de contradições que fazem com que dirigentes, "médiuns" e palestrantes comprometidos com a igrejificação condenarem a "vaticanização do Espiritismo" cria situações patéticas, em que vários ideólogos "espíritas", que se contradizem em ideias, mas sempre igrejeiros de alguma forma, falam em "um único Espiritismo, o de Kardec", criando uma contradição cada vez maior.

Afinal, o que se vê é uma grande Torre de Babel em que "espíritas" levaram tão longe o igrejismo que, se perdendo no caminho, seguiram rotas diferentes. Uns são mais esotéricos, outros moralistas, outros acreditam em profecia, outros acham isso um exagero, uns assumem Roustaing, outros nem querem ouvir falar nesse nome, uns acreditam na virgindade de Maria, outros não etc etc etc.

Isso é grave, mas também coloca o "espiritismo" num beco sem saída. O igrejismo foi longe demais, mesmo na "fase dúbia" (que tanto bajula Kardec, mas só aprecia seu legado pela "letra morta" de textos mal traduzidos, sobretudo da IDE), e o nome de Roustaing perdeu força enquanto sua influência se tornava, mesmo sutil, ainda mais forte.

A situação se torna insustentável e, diante da erosão doutrinária que faz os "espíritas" se afastarem de Kardec, o "espiritismo" se reduziu a um mero receituário moral e um arremedo de filantropia. Reduziu-se, sobretudo, a um sub-Catolicismo desnecessário, no qual as recomendações "morais" parecem até salutares aos olhos de muitos brasileiros, mas elas soam inócuas, igrejeiras, místicas e, sobretudo, meramente paliativas. Isso só agrava a crise que o "espiritismo" vive hoje em dia.

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