Recentemente, os palestrantes e ideólogos do "movimento espírita", preocupados com a crise que sofrem, tentam apelar para conceitos morais aparentemente assistencialistas, como a pretensão de prevenir suicídios.
Desnorteados diante de suas próprias contradições, eles apelam, desesperados, dizendo que não agem em defesa de penalidades, que o "espiritismo" não é punitivo, não é igrejista, não é medieval etc. Tentam desmentir o tempo todo, como todos que agem no caminho da contradição. Dizem uma coisa, fazem outra e desmentem o que fizeram.
Parece ser simples assim. Simples dizer que, se uma pessoa sofre infortúnios sob a "proteção" do "espiritismo" brasileiro, o problema é com ela, ela é que sofre por razões meramente individuais, e ela é que tem que "se virar" para superar suas dificuldades.
Pouco importa se essas dificuldades crescem como bola de neve, que as barreiras são insuperáveis, O indivíduo é que é o culpado, e tudo o que ele tem que fazer é somente fazer a parte dele para superar os infortúnios, de preferência aguentando limitações que lhe chegam em doses surreais.
Se você é um peixe no aquário, o que você deve fazer é pular e subir em uma árvore com seus próprios esforços. Se você não conseguir pular, você é culpado, tem falta de perseverança e de jogo de cintura porque você, sendo um peixe no aquário, tem mais é que se esforçar e subir em uma árvore, podendo ser a mais alta. "É só uma questão de mais esforço", é o que lhe dirão.
Se você é um elefante, você deve subir em uma árvore, e, se o seu peso derrubá-la, o culpado é você, porque seu esforço teve exageros que fizeram a árvore não resistir. Você é que tem que se virar para subir na árvore sem que seu peso possa comprometer a resistência dela.
Pouco importam as condições. Pouco importam as circunstâncias. Se a pessoa se "rala" até não poder mais e, de repente, as circunstâncias mostram que seu esforço foi em vão por diversos imprevistos, a pessoa não pode ser considerada culpada. Mas é. E esse é o problema.
É verdade que a pessoa tem que fazer a sua parte. Não estamos defendendo que as pessoas cruzem os braços e recebam as graças de mão beijada. Mas o que se reclama é que mesmo o mais árduo esforço não encontra o efeito desejado e os imprevistos, para quem recorre ao "espiritismo" brasileiro, surgem desafiando, até sem necessidade, a mais habilidosa esperteza de quem se esforça.
Isso quer dizer que a pessoa que se esforçou é culpada por não ter previsto os imprevistos? Como prever os imprevistos se eles são imprevistos? Como alguém se esforça, dá tudo de si, e nada acontece, e ainda é culpada pelas barreiras que encontrou pela frente? A pessoa que se esforça é culpada pelos próprios imprevistos?
Por exemplo, pessoas que estudam e se dedicam de corpo e alma a concursos públicos, mas não têm condições de obter o material indicado pelos seus programas e que, quando encontram, as bibliotecas onde está esse material não têm funcionário disponível ou, então, os bibliotecários entram em greve. O estudioso dedicado e exemplar será culpado por esses imprevistos?
Devemos encarar a situação como um equilíbrio. É fundamental que a pessoa se esforce e faça sua parte para superar uma dificuldade. Mas é preciso que ela tenha também sorte, para que sua busca por superação tenha êxito. Isso os "espíritas", com sua Teologia do Sofrimento, ignoram totalmente.
Se essa pessoa, com todo o esforço, não consegue superar suas dificuldades, e as limitações que encontra são difíceis de serem rompidas, se com toda a perseverança e até jogo-de-cintura nada lhe acontece de positivo, não será essa pessoa, que lutou na esperança de vencer as barreiras, que será responsável pelos imprevistos que encontrou.
A justiça consiste em, de um lado, recomendar à pessoa que se esforce para superar uma dificuldade. Por outro, cabe às circunstâncias permitirem que esse esforço seja recompensado. É muito fácil, para um moralista acomodado em seus privilégios, exigir apenas de quem se esforça para fazer sua parte, sem que haja sorte na vida.
Só que querer que a vida brinque com quem se esforça na vida é um ato de crueldade, e o moralismo do "espiritismo" brasileiro, na medida em que diz para a pessoa "se virar", pouco lhe importando as dificuldades da vida, mostra o quanto é nocivo exigir demais dos outros.
E mostra que, no fundo, os moralistas é que, acomodados, ignoram que as circunstâncias também devem fazer seu esforço para permitir que aquele que se esforça possa vencer na vida. Em muitos casos o moralista é um grande preguiçoso em potencial, que deveria olhar para si antes de exigir demais dos outros.
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