sexta-feira, 29 de abril de 2016

Brasil poderá viver um obscurantismo político


O Brasil, infelizmente, pagará muito caro pela acomodação social e pela intransigência política. E não é por falta de religião, mas pelo excesso dela. O apego a hierarquias e estereótipos também fez o país decair drasticamente e estamos à mercê de uma "época medieval" à brasileira.

Com boa parte da sociedade induzida pelo poder midiático a querer ver a presidenta Dilma Rousseff fora do poder, por causa de um esquema ainda muito mal esclarecido de corrupção supostamente envolvendo políticos do PT, mal pode perceber o perigo que assumiu em ver o país caminhando para trás na História.

Com a aprovação da abertura do processo de impeachment de Dilma Rousseff, um fato visto com estranheza pela imprensa estrangeira (mesmo a mais conservadora), mas foi festejado como "acontecimento histórico" pela mídia oligárquica brasileira, os tempos de políticas voltadas aos movimentos sociais iniciam seu caminho para o fim.

O governo de Michel Temer está comprometido com pautas obscurantistas, não bastasse ele ser político pouco carismático e sem aprovação popular expressiva. Embora sem o radicalismo do presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, que virá a ser o vice-presidente do governo Temer, este novo mandato deixa o Brasil num clima de apreensão.

O discurso conservador da grande mídia e outros que compartilham desse mesmo ponto de vista tentam afirmar que o governo Temer será de "conciliação nacional". Sabemos desse discurso, até pela roupagem religiosa, incluindo a "espírita": apelar pela "fraternidade" que oculta desigualdades e injustiças, pedindo sempre ao infortunado que aceite o privilégio do algoz, e o perdoe nos abusos.

Foram divulgadas informações de que a Confederação Nacional das Indústrias (CNI) estaria pressionando Michel Temer para aprovar a terceirização e a "flexibilização" das relações de trabalho, pautas conhecidas da "bandeira" de Eduardo Cunha, visando favorecer o abuso dos patrões e empresários diante da deterioração do mercado de trabalho.

Isso significa que os trabalhadores perderão encargos e garantias de segurança, e, associado a outras "bandeiras" conservadoras - como a extinção da exigência de diploma universitário para várias profissões - , haverá uma queda de qualidade nas profissões e também uma queda do nível salarial, do poder de compra e da capacidade de sustento próprio dos trabalhadores.

Por outro lado, o Judiciário deixará de regular as relações de trabalho, que poderão ser feitas na surdina, conforme querem as elites que declaram apoio ao futuro governo Temer, o que fará com que empresários sempre fiquem com a palavra final nas "livres negociações".

Temer anunciou que irá cortar verbas para programas sociais, e, "naturalmente", para a Educação e Saúde. Além disso, como que numa malandragem política, o futuro presidente acolherá políticos do PSDB, derrotados nas eleições de 2014, que neste processo revanchista irão praticamente obter o poder que não conseguiram conquistar pelo voto democrático.

A situação é comparada a um golpe, embora o termo seja visto como "ofensivo" pela mídia conservadora e pelas instituições que lhe são associadas. Afinal, se as forças derrotadas pelo voto dos brasileiros arrumam um jeito para destituir a candidata vitoriosa - à qual se atribuem acusações sem provas, vagamente enunciadas mas respaldadas pela "paixão política" do oposicionismo cego - e tomar o poder, isso é uma atitude claramente golpista, sim.

A situação é muito grave e o país tornou-se "acéfalo" (isto é, sem governo) depois do "histórico" 17 de abril, quando 367 votos autorizaram a abertura do processo de impeachment, que poderá tirar Dilma Rousseff do poder no próximo 11 de maio, talvez de maneira definitiva.

Isso porque o país anda desgovernado. Dilma Rousseff politicamente isolada e sem autoridade. Temer e Cunha envolvidos em denúncias de corrupção, que ambos poderão empurrar com a barriga e sair impunes de qualquer processo. E as pessoas dormindo tranquilas porque o impeachment foi aprovado e a permanência do PT no Governo Federal está com os dias contados!

O grande risco é que o Brasil viverá um obscurantismo político. A direita comemora, mas mesmo aqueles que pediram o "Fora Dilma" e deram "Tchau Querida" no 17 de abril não serão muito beneficiados.

O impedimento do militante Kim Kataguiri, do Movimento Brasil Livre, para assistir às sessões do Congresso Nacional, é um indício de como os futuros detentores de poder tratarão os "coxinhas" que os puseram no poder. Reacionários não agradecem apoio. Será muito se os "coxinhas" virarem faxineiros ou funcionários de lanchonetes decadentes (como McDonald's).

O país pode caminhar para retrocessos terríveis, sob a desculpa de combater a crise econômica e garantir a moralidade social. Poderemos perder conquistas históricas e a busca por qualidade de vida ficará mais distante. A sociedade retrocederá aos padrões moralistas do período colonial, sobretudo por influência da "bancada da Bíblia", da qual Eduardo Cunha, assim como o encrenqueiro Jair Bolsonaro, fazem parte.

E aí perguntaremos aos "espíritas": diante de tudo isso, será suficiente "pedirmos fraternidade" e "cultivarmos o perdão" diante dessa situação? Será bastante uma fraternidade que não combate desigualdades e um perdão que autoriza os abusos de nossos algozes contra nós mesmos? E será positivo suportarmos retrocessos terríveis em nome de "bênçãos futuras"?

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