quinta-feira, 18 de junho de 2015
Joaquim Nabuco desfaz mito de "herói abolicionista" de Dom Pedro II
Um pouco de memória e pesquisa sobre História do Brasil não faz mal algum. Nada que um esforço de consultar os livros não consiga resolver as dúvidas sobre o nosso passado. A pesquisa faria com que muitos dos mitos e visões equivocadas sobre nosso passado histórico se evaporassem.
Pois o notável intelectual Joaquim Nabuco, um dos fundadores da Academia Brasileira de Letras, havia escrito um livro que derruba completamente o mito "espírita" de Dom Pedro II de "corajoso líder abolicionista", ao lado da Princesa Isabel e do deputado e médico Adolfo Bezerra de Menezes.
Em primeiro lugar, porque a abolição do trabalho escravo já era uma causa defendida ainda sob o reinado de Dom Pedro I e o estadista José Bonifácio de Andrada e Silva defendeu a causa, embora nada pudesse fazer para combatê-la, diante da grande pressão dos senhores de engenho e outras elites influentes.
Hoje pode ser deplorável, mas naquela época, o decorrer de todo o século XIX, a quase totalidade das elites instruídas e influentes do país defendia a escravidão. Negros, da mesma forma que índios, não eram considerados cidadãos, e a escravidão era considerada uma atividade econômica que impulsionava o desenvolvimento nacional.
Uma visão absurda, pois, mas durante muito tempo era dominante e defendida energicamente com os mais diversos argumentos. Havia até mesmo a conversa de que, se ocorresse a Abolição, os negros causariam uma rebelião incendiando casas e assassinando brancos, uma histeria paranoica de muito mau gosto, que exagerava exemplos como a Revolta dos Malês, em Salvador.
Dom Pedro II era simpático à abolição do trabalho escravo, mas o culto monarca, além de tímido e reservado, era hesitante diante das pressões políticas. E Joaquim Nabuco, lançando em 1886 o livro O Erro do Imperador, descreveu a condescendência do monarca ao dissolver um gabinete ministerial Liberal e ter atraído para si um gabinete ligado ao Partido Conservador.
Não é preciso detalhar que o livro foi publicado dois anos depois do surgimento da Federação "Espírita" Brasileira, no mesmo sobrado da Av. Passos, no Rio de Janeiro, onde se situa a atual unidade fluminense. A FEB surgiu em 1884 exaltando a "figura libertadora" de Dom Pedro II, principalmente em prol da libertação dos escravos, e da construção de um Brasil mais "solidário e cristão".
Havia a polarização de dois partidos principais, o Liberal e o Conservador, mais ou menos como vemos hoje entre o PT e o PSDB. O Partido Liberal, do qual era ligado Joaquim Nabuco, era relativamente progressista. O Partido Conservador faz juz ao nome e era ligado à defesa convicta da exploração do trabalho escravo.
Pois houve diversas manifestações populares pela Abolição, pois até agora apenas algumas leis atenuaram a situação dos escravos, como a Lei do Ventre-Livre e a Lei do Sexagenário, que respectivamente tornaram crianças e idosos negros livres da condição de escravos.
Nessa época, alguns negros emancipados, como os irmãos Rebouças e José do Patrocínio, defendiam na imprensa a causa abolicionista. O Partido Liberal não era unânime nesta causa, mas tornara-se o reduto político principal de seus ativistas e dos simpatizantes.
O Segundo Império vivia sob o sistema de governo parlamentarista. Havia o presidente do Conselho de Ministros que montava sua equipe de governo. Em 1885, o gabinete do liberal Manuel Pinto de Sousa Dantas foi dissolvido pelo Imperador e, com nova eleição, saiu vitorioso o gabinete liberal, mas de inclinação próxima ao Partido Conservador, de José Antônio Saraiva.
Nabuco então descreveu o episódio como um grande retrocesso, e nota-se que se tratava de uma época ligeiramente anterior à Lei Áurea. O intelectual acusava Dom Pedro II de atrair para si o apoio do Partido Conservador, que já atraiu para si setores do Partido Liberal para apoiar a ainda dominante causa escravagista.
Saraiva preparou o caminho para ser sucedido, poucos meses depois, por João Maurício Wanderley, o Barão de Cotegipe, do Partido Conservador. A causa abolicionista, segundo Nabuco, havia sido praticamente perdida, com o retrocesso político que favoreceu os escravocratas. Para Joaquim Nabuco, Dom Pedro II é culpado por permitir que esse retrocesso fosse feito.
No final do livro O Erro do Imperador, já depois do texto de Nabuco e na seção de breves notícias, é narrado, entre tantos casos, o de um escravo fugitivo de São Paulo, chamado Honório, que, se deslocando para a então capital do país, o Rio de Janeiro, foi trabalhar como condutor de um bonde. Capturado em Sepetiba, chegou a ser agredido e torturado na prisão.
A situação mostra o quanto a historiografia do Brasil narrada pelos "espíritas" é constrangedora e risível de tão cheia de fantasias. É muito melhor que pudéssemos todos ler os documentos históricos e apostar numa visão bem mais realista da coisa.
Lamentavelmente, é um ponto a menos para a doutrina do "espíritismo" brasileiro, que se gaba em apreciar a Ciência e promover o esclarecimento, e no entanto preferir divulgar visões e mitos absurdos. Daí as críticas que se recebem, que pouco tem a ver com a "ira de irmãozinhos sofredores" e muito mais a ver com as cobranças de coerência verdadeira que a doutrina não tem.
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