quinta-feira, 30 de novembro de 2017
Devemos tomar cuidado com discurso de "intolerância religiosa"
Denúncias sobre intolerância religiosa se multiplicam e, de maneira bastante oportuna e necessária, criam-se delegacias especializadas nesse crime, no esforço de impedir que ações que já ocorrem no Primeiro Mundo, como os atentados que dizimam multidões, aconteçam no Brasil, assim como atos isolados que tantos danos, materiais e humanos, causam de forma lamentável.
O problema, no entanto, é como se observa no caso do bullying. Muitos valentões que na infância ou na adolescência agrediam colegas menos privilegiados nas escolas, se passam agora por agredidos. Há muita religião privilegiada que, diante da menor denúncia de irregularidade, reage com vitimismo e se passa por vítima de "intolerância religiosa".
O recente ataque de vandalismo, no Rio de Janeiro, a uma estátua do poeta Carlos Drummond de Andrade, ajuda a entender por que o ataque similar feito ao mausoléu, em Uberaba, do "médium" Francisco Cândido Xavier, não foi um ato de intolerância religiosa, mas um ataque a todo tipo de famoso, independente da atividade e do perfil que fosse.
Esses ataques se dirigem a qualquer tipo de famoso, geralmente uma pessoa que é considerada símbolo de uma cidade. Na verdade, o vandalismo é cometido quase sempre por pessoas movidas por um ódio generalizado à cidade onde vivem, é um ódio à cidade como instituição, e qualquer monumento de uma figura destacada em cada cidade pode ser atingido. Pode ser Chico Xavier, Dom Pedro I, Hebe Camargo, Leonel Brizola, Emílio Médici ou o palhaço Carequinha.
A intolerância religiosa acontece, mesmo, em religiões relacionadas a camadas sociais diferentes do padrão aceito pelas elites dominantes. Entre elas, estão as religiões afro-brasileiras, judaicas e muçulmanas, associadas a povos negros, árabes e mestiços, que estabelecem hábitos e crenças que não são compartilhados pela sociedade mais elitista.
O "espiritismo" não está entre as vítimas de intolerância religiosa. Tanto porque é uma religião de elite, que em muitos casos compartilha interesses com os neopentecostais (evangélicos derivados de movimentos como Assembleia de Deus e Igreja Nova Vida), como a criminalização do aborto.
O "espiritismo" é aceito pela alta sociedade e recebe uma blindagem surreal na qual a doutrina brasileira é tolerada até demais. Nem para dar explicações Divaldo Franco quis dar a respeito da "farinata" e por que decidiu homenagear uma estrela cadente da política nacional, o prefeito de São Paulo, João Dória Jr..
E A INTOLERÂNCIA DOS "ESPÍRITAS"?
O próprio Divaldo deu sua manifestação de intolerância depois de ser entrevistado por um veículo de imprensa após um congresso "espírita" na Espanha. Com o agravante de falar com um tom de mansuetude, Divaldo fez um julgamento de valor de extrema perversidade: acusou os refugiados do Oriente Médio de terem sido "antigos colonizadores sanguinários" que estariam voltando para a Europa para "recuperar seus tesouros".
Isso não foi uma declaração de intolerância? O prestígio de Divaldo não é razão para ele falar e fazer o que quer, e criticar suas posturas não é intolerância religiosa? E quem imagina se Divaldo não teria cometido intolerância religiosa no seu terrível juízo de valor, pois boa parte dos refugiados era de judeus e muçulmanos, pessoas que só queriam ter uma vida tranquila, ainda que modesta, sem se preocuparem com antigos tesouros ou coisa parecida, mas com um mínimo de qualidade de vida.
Os "espíritas" é que fazem juízo de valor o tempo inteiro. Se você vai para um "auxílio fraterno" em um "centro espírita" e descreve um problema pessoal, a resposta que quase sempre seus membros dão é para a pessoa aceitar o problema, porque ele lhe traz vantagens e benefícios na vida.
Se, por exemplo, um trabalhador reclama porque as contas acumulam e sobem e o salário desce - sim, estamos vivendo o "ótimo" período da reforma trabalhista que permite até mesmo redução salarial - , o "tarefeiro" da "casa espírita" dirá coisa do tipo: "de repente você está gastando demais em bobagem, corte a cesta básica, corte a salada, fique só com arroz e feijão, esse é um ótimo momento para você entrar em contato com Deus e negociar com seu patrão, que é um irmão seu".
Nem se as oportunidades que a pessoa atrai são azarentas - tipo um rapaz que perde tragicamente a moça por quem se apaixonou e depois atrai uma mulher-fruta que foi casada com um miliciano ciumento e enfurecido com o divórcio - o "tarefeiro espírita" se convence: geralmente ele vem com coisas do tipo "De repente a mulher-fruta precisa do amor de homens como você e não vejo problema em você negociar com o ex-marido dela. Fale com jeitinho e ele compreenderá".
Moleza. Negociar com o cano de um revólver, para um "espírita", tanto faz. Se a pessoa morrer, o "espírita" acha bom: "tadinho, mas ele está nos braços de Deus", dirá. A intolerância que os "espíritas" tem com as necessidades do outro, que combatem com o "exército de palavras" de seu julgamento de valor, é uma marca dessa religião que, apesar de "baseada" em postulados de Allan Kardec, é na verdade inspirada no Catolicismo jesuíta português.
Em 2009, uma entidade "espírita" na Espanha é que foi movida por profunda intolerância social. O evento Vida Depois da Vida, da região de Albacete, foi criticada por um acadêmico, o professor universitário Fernando Cuartero, por usar a estrutura da universidade onde ele lecionava, a Universidad de Castilla-La Mancha, para promover um evento religioso.
O Vida Depois da Vida poderia ter escolhido outro lugar, mas insistiu em usar a universidade e até suas marcas para promover o evento. Por ter chamado de "enganadores vulgares", o professor Cuartero foi processado pelo Vida Depois da Vida, uma entidade que se diz "seguidora da doutrina de Allan Kardec" mas é composta por muitos membros associados à Astrologia e ao esoterismo. A entidade manifestou admiração por Chico Xavier e Divaldo Franco.
Cuartero foi processado em 2010 e condenado a pagar multas e fazer retratação, mas um movimento de solidariedade de ativistas sociais e de entidades ligadas à liberdade de expressão do pensamento crítico apoiaram o professor, que, através de um processo de defesa na Justiça, foi absolvido. O caso revela que a intolerância está, muitas vezes, no lado dos "espíritas".
Religiões privilegiadas como os setores conservadores do Catolicismo, as seitas neopentecostais - como a Igreja Universal do Reino de Deus - e o "espiritismo" brasileiro não sofrem intolerância religiosa. Além disso, neopentecostais e "espíritas" estão associados a atos de intolerância, os primeiros através de pautas sociais retrógradas e atos de repressão a causas modernas, como a LGBT, por exemplo, e os segundos através do juízo de valor.
Uma pediatra de Rondonópolis (MT), com um juízo de valor não muito diferente do que "sabiamente" transmitiram Chico Xavier e Divaldo Franco, foi condenada por ter usado a "liberdade religiosa" para justificar a recusa de atendimento a uma criança cuja mãe informou ter sido vítima de estupro. A médica fez juízo de valor dizendo que a menina "tinha que sofrer aquilo" porque "exibia uma energia sexual que chamou a atenção do estuprador, seu próprio tio".
Nas seitas neopentecostais, há denúncias de enriquecimentos ilícitos de pastores evangélicos. Há também denúncias do uso de alegações "religiosas" para cometer atos de intolerância social e até de racismo, como no caso do combate às religiões afro-brasileiras. Investigar isso é intolerância religiosa?
E no "espiritismo"? Obras supostamente mediúnicas que revelam conteúdo fake - para desespero de muitos, nem Chico Xavier se livrou deste problema - têm que ser toleradas em prol da "liberdade religiosa"? Apontar irregularidades nos livros atribuídos ao espírito de Humberto de Campos, mesmo comprovadamente distantes do estilo original do autor, é ato de "intolerância religiosa"? Evidentemente, não.
A liberdade religiosa não pode servir de desculpa para as pessoas fazerem o que quiserem. É preciso ter muito cuidado e discernimento, porque o discurso de "liberdade religiosa" pode muito bem servir de estímulo ao obscurantismo e aos abusos cometidos sob a marquise da fé religiosa.
Combatemos a intolerância religiosa, mas vejamos o outro lado, quando religiões que abusam de seus procedimentos - como as traições que os "espíritas" fazem ao legado original de Allan Kardec - devem ser questionadas e investigadas. As religiões não estão acima da humanidade, elas precisam ter um limite para não cometer atos abusivos e irresponsáveis.
quarta-feira, 29 de novembro de 2017
Posturas diferentes de dois atores, sendo o pior caso o de um "espírita"
Duas posturas bastante diferentes revelam que nem sempre o rótulo de "espírita" merece a imunidade que se atribui a seus palestrantes, celebridades e "médiuns". Depois que Divaldo Franco abriu seu Você e a Paz para o lançamento oficial de um alimento duvidoso, não há como dizer que os "médiuns" não podem ser responsabilizados pelos graves erros, como nenhum outro "espírita" em atitudes do nível.
Vamos comparar dois casos, em que um ator não necessariamente "espírita" dá um exemplo de humanismo e generosidade humana que faltou a outro ator, que, sendo um declarado seguidor do "espiritismo", tendo interpretado uma de suas antigas figuras, adotou posturas de profundo e retrógrado preconceito social e ainda apoiou notícias falsas, ou seja, mentiras, publicadas por outrem.
Semana passada, o ator Pedro Cardoso estava no programa Sem Censura, da TV Brasil - integrante da Empresa Brasileira de Comunicação, ligada ao Governo Federal - , a princípio para lançar seu romance sobre a crise social do Brasil, O Livro dos Títulos, quando se recusou a ser entrevistado pela jornalista Katy Navarro, apresentadora do programa.
Pedro Cardoso disse que não iria dar entrevista alguma para uma empresa com funcionários em greve e acrescentou a isso outra indignação, que é a do presidente da EBC, o jornalista Laerte Rímoli, ter compartilhado de memes (ilustrações com mensagens divulgadas nas redes sociais) debochando de uma declaração da atriz Taís Araújo.
Taís, negra assim como seu marido e também ator Lázaro Ramos e os dois filhos do casal, desabafou, numa palestra, que as pessoas "mudavam de calçada" ao verem ela e seu filho. Uma postagem montava o fundo com Taís e seu filho com a imagem de uma menina branca apavorada, e outra mostrava um executivo de pára-quedas. Em ambas, a mensagem jocosa de que as duas figuras estariam fugindo de Taís e seu filho, como se fossem um "problema".
Pedro fez um discurso no qual lembra as raízes africanas de todo o povo brasileiro e disse respeitar todo o pessoal da EBC, ganhou um comentário solidário de Katy, que manifestou respeito à decisão do ator, e este, ao se retirar, abraçou a apresentadora. Em seguida, Pedro se juntou aos grevistas na entrada da TV Brasil e gravou um vídeo de apoio aos funcionários.
Até o fechamento deste texto, não pegamos informações sobre a religião de Pedro Cardoso, mas observa-se que sua conduta está acima dessas crenças e que, mesmo sendo ele primo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, o ator, consagrado pelo seriado A Grande Família, da Rede Globo (no qual interpretou o picareta Agostinho Carrara), se aproxima mais das posturas progressistas, e ainda alfinetou a televisão dos tempos de FHC:
"O mundo mudou muito. E uma coisa principal: o Brasil mudou, muito mais que a televisão brasileira. A TV brasileira ainda está igual ao Brasil do FH [Fernando Henrique Cardoso] e nós estamos num Brasil pós-Dilma, embora ela ainda esteja [no governo]. E a gente tem que retratar este Brasil que mudou. Se a gente ficar fazendo a televisão que era da época do Fernando Henrique, o público vai fazer outra coisa", afirmou o ator.
VEREZA INTEGRA ATÉ INSTITUTO MILLENIUM
Enquanto isso, o ator Carlos Vereza, um dos propagandistas do "espiritismo" brasileiro - cada vez mais voltado ao conservadorismo ideológico, sintonizado com Michel Temer, João Dória Jr. e Aécio Neves - , tendo interpretado o médico Adolfo Bezerra de Menezes, tornou-se um dos militantes da chamada "direita hidrófoba" do país.
Um dos integrantes do Instituto Millenium - entidade similar aos antigos IPES-IBAD na combinação de aparato intelectual e ativismo direitista - , Vereza, que participou da novela Velho Chico da Rede Globo, teria indicado seu amigo "médium" João Teixeira de Faria, o João de Deus, à colega Camila Pitanga ir agradecer por ter sido poupada de uma tragédia que matou seu amigo e par romântico na novela, Domingos Montagner.
Tido como "amigo de Lula" (no mesmo sentido de José Sarney, por exemplo), João de Deus apareceu recentemente num clima de muita cumplicidade ao lado do presidente Michel Temer, que, embora tenha declarado "nunca ter ido a um centro espírita", tem seu projeto de governo, ultraconservador, apoiado pelo "movimento espírita".
Vereza apoiou uma fake news divulgada pelo filho do ultradireitista Jair Bolsonaro, Eduardo Bolsonaro, na qual distorce um trabalho escolar, sobre identidade de gênero, promovido pelo colégio carioca Pinheiro Guimarães, como uma medida que forçava alunos rapazes a se vestirem de rosa e usarem batom para ganhar pontos na escola.
Horrorizado ao ver muitos famosos transexuais - como a modelo Lea T e o ator Thammy Miranda, nascidos sob gênero sexual oposto ao atual - , Carlos Vereza havia recorrido, recentemente, ao presidente Michel Temer, pedindo medidas de combate à "ideologia de gênero", demonstrando o nível homofóbico do famoso ator e "espírita" convicto.
"Tem professores tirando o artigo “o” e o artigo “a” e colocando “x”, estão brincando de Deus e mudando toda a biologia. Por mais que eles inventem, homem não tem útero. E mulher não tem pênis", disse o ator, que alegou que a causa LGBT está "traumatizando e erotizando" as crianças.
A verdade, porém, é que o trabalho escolar, uma exposição de sala de aula, não teve qualquer intenção de influenciar os alunos, mas de promover um debate a respeito de mudanças de âmbito sexual e afetivo na sociedade brasileira, sem desconsiderar as relações heterossexuais tradicionais.
Vereza foi um enérgico opositor aos governos de Lula e Dilma Rousseff e acabou aderindo a uma notícia falsa divulgada por um Bolsonaro. É mais uma adesão de um "espírita" a uma figura retrógrada, pela afinidade de sintonias a pessoas que simbolizam algum obscurantismo moralista que voltou à tona no Brasil desde 2016.
Sabe-se que Francisco Cândido Xavier também manifestou sua sutil homofobia, no final dos anos 1960, auge do movimento hippie. Chico Xavier havia dito que o homossexualismo era "compreensível", mas era fruto da "confusão mental" dos espíritos encarnados, que "não teriam definida sua sexualidade".
Recentemente, através de correntes como as de Divaldo Franco, o "espiritismo" brasileiro adotou uma postura supostamente anti-homofóbica. O conservadorismo ideológico precisava ser dissimulado, pois o "espiritismo" igrejeiro e catolicizado não podia exceder no seu moralismo, já medieval demais para carregar, também, posturas homofóbicas que nem mesmo a Rede Globo e a Veja aceitam.
Mesmo assim, o "espiritismo" brasileiro demonstra estar afastado de qualquer intenção e prática humanistas. O "médium" Divaldo Franco perdeu a chance de, no caso da "farinata", adotar uma postura de coragem contra o produto, tal como foi a atitude de coragem de Pedro Cardoso em se recusar a divulgar o próprio livro num programa de TV em protesto contra o racismo e as arbitrariedades do governo Temer, que congelou os salários dos funcionários da EBC.
O conservadorismo do "espiritismo" brasileiro e sua adesão a personalidades políticas decadentes e retrógradas derrubou de vez a imagem de "progressista" oficialmente associada aos "espíritas". O "espiritismo" está até mesmo aquém do Catolicismo, que, mesmo com seus dogmas, consegue se adaptar às mudanças sociais, enquanto os "espíritas" se voltam para as raízes jesuítas do Brasil colonial.
terça-feira, 28 de novembro de 2017
Data-limite para os "espíritas", na verdade, foi outra
PROMESSA DE CHICO XAVIER E DIVALDO FRANCO DE "APRENDER KARDEC" NUNCA FOI CUMPRIDA.
A verdadeira data-limite para o "movimento espírita" cumprir a promessa de recuperar os postulados espíritas originais, fazendo com que os "místicos" passassem a entender o conteúdo apreciado pelos "científicos" e promovendo um equilíbrio entre Fé e Conhecimento, já aconteceu.
Não é a "data-limite" do sonho de Francisco Cândido Xavier depois da expedição de astronautas estadunidenses à Lua em 1969, da qual se fala de um prazo de cinquenta anos para a Terra buscar o caminho da paz.
Até porque esse sonho, que só foi revelado em 1986, é dotado de graves erros de abordagem histórica, geológica e sociológica. E ainda "previu" o crescimento da Petrobras, que até ocorreu, mas graças ao presidente Michel Temer (e seu indicado para a estatal, o tucano Pedro Parente) chegará em 2019 em frangalhos. Se chegar e se as multinacionais do petróleo deixarem.
Fala-se da data-limite dada aos deturpadores de aprenderem as lições racionais do Espiritismo e aprenderem, sobretudo, que não há salvação para a caridade se ela vive ao arrepio da ética e do bom senso. Todas as promessas dadas pelo "movimento espírita" de "aprender melhor Kardec" não foram devidamente cumpridas.
Expor a teoria espírita original até se expôs. Fazer elogios a figuras como José Herculano Pires e Deolindo Amorim, também. Falou-se em fatos e personalidades científicas. Falou-se em Erasto e no Controle Universal do Ensino dos Espíritos. Foram evocados intelectuais dos mais renomados. Conceitos de Física, Biologia e Psicologia, ainda que de maneira um tanto pedante, foram inseridos no "espiritismo" feito no Brasil.
Mas nada disso impediu que o velho igrejismo de matriz roustanguista fosse feito, e, o que é pior, feito com muito mais entusiasmo do que nos tempos em que o sobrenome Roustaing era mais valorizado que o de Kardec. Até porque a "vaticanização" do Espiritismo feita pelos brasileiros tornou-se ainda mais entusiasmada do que nos primórdios da FEB.
RELIGIÃO DE PAPALVOS
A promessa se deu diante de vários fatores. Com a era Wantuil se encerrando, já que o então presidente da FEB, Antônio Wantuil de Freitas, há muito tempo na instituição, anunciou sua aposentadoria, já em 1969, por estar bastante doente. Ele faleceu cinco anos depois. Wantuil foi o descobridor do "médium" Chico Xavier e era quase o seu "empresário", a maneira dos empresários dos astros pop.
Nessa época, começou a estourar a crise na cúpula. Os herdeiros de Wantuil na equipe dirigente da FEB não eram bem vistos pelos demais membros. A FEB era acusada de centralizadora, prejudicando as ações das federações regionais, com exceção da FEESP, a federação paulista, que parecia ter mais privilégios até mesmo que as federações dos Estados do Rio de Janeiro e Guanabara, que não eram mais do que gabinetes da FEB.
Um dos dirigentes, Luciano dos Anjos, foi hostilizado por haver denunciado - surpreendentemente, com razão - o plágio literário feito por Divaldo Franco sobre as obras já duvidosas de Chico Xavier. Os plágios foram publicados no livro de Luciano, A Anti-História das Análises Co-Piadas, e a denúncia causou escândalo e quase provocou a inimizade dos dois "médiuns".
A denúncia ocorreu em 1962 mas ela se refletiu em 1969-1970. Além disso, surgiu a denúncia de que o lucro das vendas dos livros de Chico Xavier era destinado à fortuna dos dirigentes da FEB, um acordo que havia sido acertado secretamente por Wantuil e Chico, apesar da hipótese oficial de que o lucro era "para a caridade".
O escândalo estourou e o esperto Xavier tirou o corpo fora. Diante dessa revelação, o "médium" alegou ter "se sentido muito triste" com este fato, e então deixou de ter seus livros publicados pela FEB, recorrendo a outras editoras. Mas essa decisão se deu porque Xavier se dava bem com Wantuil, mas não se dava com os herdeiros do poder de seu mentor material. Sobretudo Luciano dos Anjos.
Houve também a publicação de uma reportagem da revista O Cruzeiro, mais de 25 anos depois de David Nasser e Jean Manzon terem escrito sobre Xavier. A reportagem revelou que a suposta médium Otília Diogo era uma farsante, tendo sido encontrado o material usado para os rituais de falsa materialização dos falecidos Irmã Josefa e dr. Alberto Veloso, antigo médico da Marinha do Brasil.
Oficialmente, Chico Xavier foi tido como "enganado" pela farsante. Passou ileso até das acusações de ter sido cúmplice e chegou-se a dizer que "cúmplice não é culpado", mas fotos dos bastidores do evento ilusionista mostram o "médium" bastante atento e desenvolto diante dos presentes, e existem registros dele observando os detalhes da armação de Otília, como se já estivesse sabendo e apoiando a fraude.
O escândalo levou ao auge o conflito entre os "místicos", que desviavam o legado kardeciano para as influências católicas, e os "científicos", que queriam a pureza doutrinária do Espiritismo original. Houve ainda a denúncia de que a FEESP iria produzir traduções ainda mais deturpadas e desfiguradas da obra kardeciana, agravando ainda mais a crise.
O escândalo foi denunciado na imprensa e no rádio pelo jornalista e tradutor José Herculano Pires - o tradutor mais fiel da obra kardeciana - , que definiu o "movimento espírita" como "seita de papalvos", e a situação se complicou.
A PROMESSA
A solução diante desse impasse foi que o "movimento espírita" se dividiu, com a cúpula da FEB ligada ao antigo grupo de Wantuil isolada. Mesmo os "místicos" ligados às federações regionais passaram a usar uma estatégia para tentar agradar os "científicos": abandonaram de vez o nome de J. B. Roustaing e passaram a eleger, tendenciosamente, Allan Kardec como seu "mestre maior".
A partir daí vieram as promessas de "não só entender Kardec, mas vivê-lo", entre tantas promessas de recuperação das bases doutrinárias. Criou-se então uma tese de que os "médiuns" Chico e Divaldo foram acusados de "catolicizar o Espiritismo" por "acidente" e "entusiasmo demais com a origem católica", não sendo considerados culpados pela deturpação doutrinária.
A tese não tem a menor coerência, porque os trabalhos de Chico e Divaldo eram longos e de repercussão muito grande para serem considerados "deturpadores sem culpa". E a promessa de "entender melhor" a Doutrina Espírita original foi uma promessa que apenas foi cumprida na aparência, e ainda assim parcialmente.
Esse "cumprimento" se deu apenas no aparato das exposições doutrinárias aparentemente corretas, mesmo quando se usam os livros kardecianos traduzidos pela FEB e IDE, que substituíram "doutrina de Jesus" por "doutrina do Salvador" e "Deus" por "Pai", respectivamente. Mesmo assim, até os alertas de Erasto e o C. U. E. E. eram evocados e, para os "científicos" como Herculano Pires, se dirigiam apenas elogios.
Esse simulacro era feito para garantir o que, aos olhos dos leigos, parecia uma doutrina perfeita. Mas por trás da embalagem "limpa" do "espiritismo" brasileiro, havia muita sujeira. O falso equilíbrio entre "científicos" e "místicos" escondia o privilégio que eles tinham, transformando os primeiros em "reféns" de um igrejismo que colocava a Ciência e a lógica a seus pés.
Essa fase denominamos de "fase dúbia", porque o igrejismo de raiz roustanguista era mantido mesmo quando Roustaing era renegado. E o aparato "científico" que passou a ter o "espiritismo" brasileiro não disfarçou o igrejismo que chegava com muito mais apetite através de romances "espíritas" e de estórias de cunho religioso supostamente ligadas à esperança e superação humanas.
Com isso, vemos que hoje até o próprio Kardec tornou-se refém dos deturpadores. E, agora, as contradições se tornam cada vez mais evidentes, e a gota d'água se deu quando Divaldo ofereceu o Você e a Paz para o lançamento oficial de um estranho composto alimentar promovido pelo prefeito de São Paulo, João Dória Jr..
O evento derrubou a reputação de "melhor discípulo de Kardec" que Divaldo carregava com um aparato mais verossímil possível. O "médium" não teve a firmeza que o pedagogo francês teria em rejeitar o estranho alimento e exigir, com firmeza, exames técnicos e documentos que comprovassem que a "farinata" não era prejudicial.
Divaldo cometeu inúmeros (e gravíssimos) deslizes e comprovou o fracasso da "fase dúbia", a ponto hoje da situação dos "espíritas" se encontrar num grande impasse. A crise só foi minimizada porque o episódio da "farinata" foi superado com a suspensão do produto e Divaldo ter sido beneficiado pelo silêncio da imprensa.
Mas o escândalo que foi abafado é só um precedente diante de tantos outros que virão, mostrando o quanto a contradição que marcou o "espiritismo" brasileiro, misturando deturpação e bases doutrinárias originais, traz problemas para o Espiritismo autêntico. O limite de cumprimento da promessa de "aprender Kardec" se esgotou e não há como prometer de novo o que se deixou de cumprir.
segunda-feira, 27 de novembro de 2017
Cuidado com a retratação "espírita". É resquício da Idade Média
É aquela história conhecida. Pessoas que vivem em profundo ceticismo em relação ao "espiritismo" igrejista brasileiro, várias delas se declarando ateias, algumas de postura inflexível. De repente, elas entram em contato com um evento "espírita" e se convertem, "comovidas" com as "lindas lições de amor" e as "palavras sublimes" que a colocaram no "bom caminho da fé e da fraternidade".
Muita gente caiu nessa armadilha. Muita gente boa. Até o filho de Humberto de Campos. São pessoas que, com todo o ceticismo que possuem, aderiram depois ao "espiritismo" e sucumbiram às lágrimas, aderindo a essa religião de forma submissa. Isso parece lindo, mas é bastante traiçoeiro.
Vamos nos lembrar do Catolicismo da Idade Média. Naquela época, havia os hereges, que professavam crenças alheias e divergentes à religião dominante. Havia métodos mais coercitivos, para não dizer sanguinários, de conversão dos hereges, mas também havia muita persuasão por parte de alguns sacerdotes "bondosos" em convencer as "ovelhas desgarradas" a "abraçar a fé cristã".
Sabe-se que o legado de Allan Kardec reduziu-se a pó no Brasil. O que se viu foram desvios progressivos de doutrina, na qual a racionalidade kardeciana deu lugar a um viscoso igrejismo de matriz roustanguista, adotada com muito entusiasmo por mais que o nome de J. B. Roustaing seja visto como um "palavrão" por uma parcela do "movimento espírita". Mas de que adianta renegar o idealizador se suas ideias foram tão comoda e entusiasmadamente aceitas?
O "espiritismo" brasileiro rumou a uma conduta medieval. A promessa de recuperar as bases kardecianas, dada há pouco mais de 40 anos, foi apenas um papo furado para os "místicos" agradarem os "científicos" diante da crise vivida pela cúpula da FEB, na época da aposentadoria e, depois, do falecimento de seu ex-presidente Antônio Wantuil de Freitas.
O que se recuperou mesmo foram os postulados do Catolicismo jesuíta do Brasil colonial, tanta é a evocação de espíritos de jesuítas feitas pelas instituições "espíritas" em todo o país. Criou-se uma situação insólita em que o Brasil conta com "dois" Catolicismos: um é a Igreja Católica propriamente dita, com suas crenças e fantasias, mas atualizando-se ao longo dos anos, e outro o "espiritismo", que, apesar da roupagem "moderna", pegou o que havia de mais antiquado entre os católicos.
Os "médiuns" acabaram se tornando uma versão repaginada dos antigos sacerdotes medievais que, embora evocassem o legado de Jesus de Nazaré, se equiparavam aos antigos sacerdotes que o próprio ativista nazareno reprovava em seu tempo. Aliás, os "médiuns" brasileiros adotam procedimentos e posturas que o próprio Kardec havia reprovado com muita coerência em O Livro dos Médiuns.
RETRATAÇÃO PERIGOSA
A falta de firmeza das pessoas contribui para o país injusto em que vivemos, em que uma parcela de privilegiados - cujos atributos vão do porte de armas ao prestígio religioso, passando pelos privilégios da fama, do dinheiro e do poder político-empresarial - faz o que quer enquanto quem está de fora só resta aceitar e submeter-se às limitações sociais que lhes são impostas.
Vemos muita gente criticando a deturpação do Espiritismo original e recua no meio do caminho, diante de apelos emocionais trazidos pelos deturpadores que os contestadores não têm coragem de lidar. Ver que, num dado momento, pessoas mostram de coração mole e vigilância débil e se deixam levar por paisagens floridas, céu azul e crianças sorrindo que os deturpadores do Espiritismo exibem, é bastante preocupante.
A retratação é perigosa, porque reforça o poder descomunal que os "médiuns" passaram a exercer no Brasil, com uma blindagem que já supera, de longe, a dos políticos do PSDB. Os "médiuns" já têm uma posição aberrante e surreal, pois romperam com a função intermediária e quase anônima dos médiuns originais para abraçar o estrelato, vivendo do culto à personalidade e se tornando o centro das atenções.
A aberração chega ao ponto dos "médiuns" serem considerados "grife" para pessoas que buscam mensagens de entes queridos falecidos. E, contrariando as recomendações de Kardec e seu Controle Universal do Ensino dos Espíritos, há "médiuns" que se tornam "donos dos mortos", havendo um "médium" específico para cada morto de sua escolha.
A situação se tornou aberrante, junto ao "espiritismo" que se tornou "catolicizado" demais. E aceita-se tudo sem críticas, mas até com gosto. Pior: quando surge alguma crítica, os "espíritas" estão até acostumados com o que eles chamam de "fim da tempestade": segundo eles, "furacões", "terremotos" e "tormentas" trazidas pelos "contestadores de nossa doutrina" poderão vir com muita intensidade, mas tudo passará e o "espiritismo" triunfará em forte calmaria.
Foi sempre essa ladainha. E os "espíritas" esperam, "pacientemente", pela retratação que eles acham sempre serem possível. Os contestadores brasileiros, que facilmente abandonam a firmeza que o próprio Kardec e mensageiros como o espírito Erasto recomendavam e aconselhavam com urgência, contribuem mais para os deturpadores do Espiritismo do que estes próprios.
Daí que o que desarma os contestadores é a "fascinação obsessiva". O "médium" mostra logo uma "mensagem de amor", sob a ilustração de palavras floridas. Pode até ser uma frase seca, grotesca, mas pelo apelo religioso ela já é vista como "amorosa". O "canto de sereia" é desafinado, mas, infelizmente, funciona e leva os resistentes à perdição, assim que eles se rendem a essa cantoria.
A "fascinação obsessiva" se manifesta pelos apelos emocionais do "bombardeio de amor", que travam todo tipo de raciocínio. Nem mesmo o fato de haver um contexto estranho, nas "casas espíritas", de uma hospitalidade "familiar demais" e "excessivamente amorosa" numa sociedade em que nem famílias consanguíneas têm essa afeição, desperta qualquer desconfiança.
Pelo contrário. Pessoas estranhas que se utilizam do "bombardeio de amor" para dominar suas vítimas passam a receber, de graça, uma afetividade que não é real. A falta de preparo dos que combatem a deturpação do Espiritismo, que em dado momento se rendem à influência dos "médiuns" igrejeiros, revela o quanto a retratação é um processo muito perigoso.
A fácil adesão a esse processo faz com que a deturpação do Espiritismo permaneça como está, mesmo com todo o simulacro de "recuperação das bases espíritas originais". A esperteza dos palestrantes, dirigentes e dos "médiuns" em seu intrincado sistema de dominação permite o sucesso da deturpação de matriz roustanguista, que nunca é devidamente combatida.
Isso reflete a provável hipótese de que os "médiuns" brasileiros são reencarnação de sacerdotes medievais. A atribuição de reencarnação é possível pela afinidade de ideias e procedimentos, e isso nos faz ajudar a compreender a antiga rendição dos hereges ao Catolicismo medieval, coisa que se repete quando os céticos, leigos ateus e os críticos da deturpação do Espiritismo passam a se render, seduzidos pelos "apelos amorosos", aos deturpadores da doutrina de Kardec.
A rendição fácil aos deturpadores do Espiritismo, portanto, é um perigo no qual se deve buscar ampla resistência e evitar o máximo, com muita firmeza e atitude enérgica. Isso não é intolerância religiosa nem perseguição a "homens de bem", mas uma atitude que já havia sido recomendada, no século XIX, por Allan Kardec. Quem se rende aos deturpadores não é dotado de razão nem firmeza, mas de coração mole e falta de vigilância contra as armadilhas mais sutis da vida.
domingo, 26 de novembro de 2017
"Lata Velha", "padronizetes" e o apego a uma medida retrógrada e anti-popular
As denúncias sobre corrupção no sistema de ônibus do Rio de Janeiro - embora casos similares ocorram em cidades como São Paulo, Curitiba, Florianópolis, Porto Alegre e Brasília, mas eles tentam ser abafados - revela o fracasso do modelo implantado em 2010 e um estranho apego a uma medida aparentemente estética, mas que mostra sua falta de funcionalidade e ilegalidade.
O apego doentio à medida da padronização visual dos ônibus, que faz com que até simples busólogos se comportem de maneira autoritária ou até neurótica - um busólogo da Baixada Fluminense "surtou" e foi praticar cyberbullying nas redes sociais, criar blog de difamação contra desafetos e até viajar para a cidade deles na tentativa de intimidá-los - e autoridades tentem trocar "seis por meia-dúzia" para resolver problemas sem combatê-los de fato, mostra a que ponto chegou o Brasil.
A pintura padronizada, uma atitude oriunda da ditadura militar e implantada pelo arquiteto e então prefeito-biônico de Curitiba, Jaime Lerner, inspirado nos ônibus militares, havia sido relançada no Rio de Janeiro sob as desculpas de "disciplinar" o sistema de ônibus, com um visual único que sugeria, supostamente, que as empresas de ônibus eram monitoradas pela prefeitura municipal.
Grande engano. A medida, que coloca diferentes empresas de ônibus sob uma mesma pintura, sob o aparato de "consórcios", "zonas de bairros" e "tipos de ônibus", confunde os passageiros na hora de ir e vir - por exemplo, torna-se impossível identificar um ônibus ao longe, por mais que se tente colocar em destaque o logotipo da empresa, como se faz em São Gonçalo - e já foi identificada como contrária a leis como a Lei de Licitação e o Código de Defesa do Consumidor.
Entre as infrações legais causadas pela pintura padronizada, estão os artigos 11 (natureza do serviço) e 12, inciso II (funcionalidade e adequação ao interesse público) da Lei de Licitações (Lei 8.666, de 1993) e o artigo 39, inciso IV, do Código de Defesa do Consumidor (Lei 2.078, de 1990).
No caso da Lei de Licitações, a pintura padronizada, que expressa um visual imposto pelo poder público, contraria a natureza do processo, no caso concessão do serviço de ônibus a empresas particulares. O poder público concede o serviço, mas "fica" com a imagem, proibindo as respectivas empresas, beneficiárias da concessão, de apresentar ao público a própria identidade visual.
Além disso, a medida da pintura padronizada não traz funcionalidade, pois não há vantagem técnica em colocar diferentes empresas de ônibus para exibir a mesma pintura. Nem mesmo o crédito do nome da empresa em letreiros digitais ou em logotipos expostos nos ônibus garante funcionalidade, pois são detalhes que se perdem facilmente à vista de qualquer um.
Outro aspecto é a forma deturpada com que se interpreta a "adequação ao interesse público". De modo cafajeste, autoridades usavam como "adequação" a promessa de adquirir ônibus com ar condicionado ou veículos especializados, no caso BRTs (articulados). São coisas diferentes, não há lógica em usar ônibus refrigerados para justificar a pintura padronizada como "medida de interesse público". É como usar os parques de diversões para promover o reflorestamento de um lugar.
Aliás, isso também remete ao inciso IV do artigo 39 do Código de Defesa do Consumidor. Nele se fala que é vedado prevalecer-se da fraqueza, ignorância ou condição social do consumidor para impor um produto ou serviço. A pintura padronizada foi imposta pelo prefeito Eduardo Paes se aproveitando do desconhecimento da população, portanto cometendo claramente a infração prevista no referido artigo e correspondente inciso.
Ainda sobre o artigo 39, inciso IV, Eduardo Paes usou os ônibus com ar condicionado e os BRTs como "moeda de troca" para forçar o apoio da população aos ônibus padronizados, o mesmo "desvio de foco" que se fala do pretexto da "adequação ao interesse público". São coisas que nada têm a ver, e revelam o cinismo de Paes, que, para defender a pintura padronizada, chegou a ofender imigrantes portugueses, ao definir, pejorativamente, a diversidade visual dos ônibus cariocas antes de 2010 como "embalagem de azeite português".
"LATA VELHA" E "PADRONIZETES"
O caráter autoritário dos defensores da pintura padronizada se mostrou quando a medida foi divulgada, ainda em 2009, pelo então prefeito carioca. Busólogos que defenderam a medida usavam as mesmas alegações de "disciplina" que militares do Exército usam para defender a instalação de uma ditadura no Brasil.
Segundo denúncias de outros busólogos, havia uma articulação de uma minoria de busólogos para formar um "gabinete" da Secretaria Municipal de Transportes, quando o titular era o tecnocrata Alexandre Sansão. Com isso, surgiu, de repente, uma "luta fratricida" nas redes sociais, nas quais busólogos que defendiam a pintura padronizada passaram a agir com arrogância, intolerância e muita agressividade.
Os mais jocosos falavam dos opositores da pintura padronizada como "viúvas de lata de tinta". Diante de tantas discordâncias, os defensores da "PP", como era definida a "pintura padronizada", ainda chamavam os interlocutores de "seu m****".
Pelo menos dois busólogos estavam associados a atitudes típicas de haters e ciberbullies. O mais ambicioso, de uma cidade da Baixada Fluminense, então recém-saído de uma equipe de busólogos local, passou a fazer mensagens ofensivas nas redes sociais, ainda nos tempos do Orkut e dos primórdios do Facebook, com o objetivo de destruir reputações de busólogos emergentes. Também usava pseudônimos - que ele chamava de "fakes do bem", para divulgar ofensas no Fotopages.
Outro busólogo teria sido um rapaz que teria sido menor de idade em 2010 e também participou de mensagens ofensivas nas redes sociais, nos fóruns digitais e outros espaços similares. Este rapaz tinha como tática usar pseudônimos diversos, geralmente de desafetos ou de gente famosa, para paródias relacionadas ao homossexualismo ou à pornografia.
Em seguida, o busólogo mais velho empastelou uma petição digital feita contra a pintura padronizada com divulgação de mensagens jocosas de caráter ofensivo. Chamava outros busólogos, inclusive o encrenqueiro mais novo, para "zoar" na petição, rebaixando o espaço de abaixo-assinado a um falso chat de mensagens ofensivas e violentas. O busólogo mais velho chegou a falar que um desafeto iria "acordar com a boca cheia de formiga" (metáfora para ameaça de morte).
O busólogo da Baixada Fluminense havia também criado um blog de ofensas, o Comentários Críticos, que segundo várias fontes já foi denunciado para o SaferNet (serviço de denúncias sobre crimes digitais de qualquer natureza). Aparentemente o busólogo só copiava, para fins de difamação, textos e imagens de dois busólogos emergentes, mas a ideia dele havia sido esculhambar a busologia como um todo, inclusive aqueles que o busólogo da Baixada fingia ser grande amigo.
O objetivo é criar uma "derrubada de reputações" nas quais só sobrava o busólogo da Baixada, seu amiguinho mais novo e aquele que "aceitar engraxar os sapatos" dos dois. Mais tarde, o busólogo da Baixada foi denunciado pelos amigos, que revelaram a identidade do blogueiro "crítico" (dos Comentários Criticos).
Não bastasse o Comentários Críticos ter sido denunciado pela SaferNet, tornando-se de conhecimento da Polícia Federal, que recebe as denúncias, o busólogo da Baixada, ao fazer constantes visitas a Niterói para intimidar desafetos, chamava a atenção, tanto pela sua aparência robusta quanto pelo olhar "atento demais" na hora de tirar fotos, de milicianos que fazem ponto na área do antigo Carrefour, ao lado do Terminal João Goulart. Ligados à "máfia das vans", os milicianos pensavam que o busólogo era um miliciano rival querendo "dominar a área".
Com as denúncias - que incluem até mesmo ofensas pessoais quanto ao estado civil de alguns busólogos (ser solteiro durante muito tempo, por exemplo, era xingado de "virgem"; se divorciar, mesmo de forma amigável, seria "corno") - , os busólogos valentões saíram desmoralizados e o episódio repercutiu nacionalmente, com busólogos de outras partes do país acreditando que os busólogos do Rio de Janeiro "só vivem brigando".
Com o aumento dos acidentes de ônibus e da corrupção no setor, um triste espetáculo no qual a pintura padronizada serviu de lona, os busólogos que defendiam a "PP" passaram a perder a "moral" que se julgavam ter. Alguns discordantes que haviam sido antes alvos de humilhação passaram a definir os defensores da "PP" como "beatas de carimbo de prefeitura", "padronizetes" e "lambedores de gravatas".
A crise dos ônibus padronizados também se define pelo sucateamento do setor e por muitas irregularidades. Os ônibus padronizados - chamados pejorativamente de "ônibus iguaizinhos" - passaram a ser apelidados de "lata velha", de tão sucateados e sujos. Empresas de ônibus eram extintas, mudavam de nome ou trocavam de linha sem que a população soubesse de imediato. Os cidadãos eram os últimos a saber de tais imprevistos.
Situações assim também acontecem em outras capitais. Em Belo Horizonte, a pintura padronizada que faz uma mesma empresa tivesse mais de cinco pinturas diferentes, os custos de transferência de veículos de um sistema de linhas para outro é maior, o que faz com que, em situações de emergência, ônibus de um consórcio circulassem em linhas de outro com a pintura do consórcio anterior.
Em Brasília, empresas piratas facilmente utilizam as mesmas cores dos ônibus padronizados, se aproveitando da aquisição de carros vendidos pelas empresas oficiais. Em Florianópolis, onde diferentes empresas municipais passaram a ter uma mesma pintura sob o risível nome de "Consórcio Fênix", há denúncias de corrupção similares às do Rio de Janeiro. Em Curitiba, a corrupção é mais antiga, mas os grandes empresários tentam abafar as denúncias pressionando a imprensa a ignorar ou minimizar o assunto.
No Rio de Janeiro, o atual secretário de Transportes e vice-prefeito Fernando MacDowell, também engenheiro urbanista, garantiu que a pintura padronizada será cancelada nos ônibus municipais, o que, se realizado, refletirá no resto do Brasil. Mas a medida está demorando a acontecer devido aos escândalos de corrupção que impedem que o secretário mexa no sistema sem que se resolva a situação dos empresários envolvidos em diversas acusações.
O desgaste da pintura padronizada nos ônibus é notório, apesar da resistência desesperada de várias prefeituras, que andam trocando o design dos ônibus padronizados, como forma de "mudar a embalagem" em prol de uma falsa novidade.
Há também vários busólogos e políticos que andam assustados em ver que os ônibus deixarão de ser conhecidos pelo logotipo de prefeituras ou governos estaduais, num apego completamente desesperado e paranoico. Para eles, pouco importa o direito de ir e vir das pessoas que, com tantas coisas a fazer, precisam prestar atenção em ônibus com pintura igualzinha para não embarcarem no veículo errado. Daí que a pintura padronizada simboliza o egoísmo humano sobre rodas.
sábado, 25 de novembro de 2017
Promessa de "aprender Kardec" dos "espíritas" foi em vão
ROUSTANGUISMO SE TORNOU AINDA MAIS INTENSO A PARTIR DE CHICO XAVIER E DIVALDO FRANCO.
Foram mais de 40 anos de promessa para melhor aprender os ensinamentos de Allan Kardec. Tanto se prometeu a respeito disso, mas o que vimos foi apenas aparatos, fingimentos, simulações. As promessas foram em vão e nunca passaram de promessa para boi dormir, de conversa mole para os "místicos" agradarem os "científicos".
Enquanto isso, o nome de Jean-Baptiste Roustaing - ou J. B. Roustaing - , renegado oficialmente a ponto do referido sobrenome se tornar um "palavrão" entre uma parcela de "espíritas", ou um "estranho desprezível" do qual os "espíritas" menos iniciados nunca ouviram falar, continua ressoando através de seu legado, pois o roustanguismo tornou-se ainda mais forte e intenso entre os "espíritas" que se autoproclamam "rigorosamente fiéis a Kardec".
Há mesmo os "espíritas" que estufam o peito para fazer falsos ataques à "vaticanização", dizendo, com um discurso envaidecido, serem contra os "constantinos" que corrompiam a Doutrina Espírita, sem olhar para si mesmos, "constantinos" convictos até a medula, beatos que pensam que Kardec é o "sacerdote moderninho" que aceitaria qualquer capricho igrejeiro.
Palestrantes que diziam, com ar triunfante, "devemos não só conhecer Kardec, mas vivê-lo no dia a dia" eram os que mais traíam o legado do pedagogo francês, misturando todo o apelo do "Kardec total" com um engodo igrejeiro medieval e até cheio de firulas esotéricas e ocultistas.Em nome do "espiritismo de verdade", evocava-se até o Horóscopo nas palestras, livros e artigos.
Quanta erosão doutrinária se observa nas "casas espíritas" mais diversas, nas publicações do gênero, quanto vazio de ideias camuflado por um simulacro de caridade - Assistencialismo, a "caridade" que mais ajuda o "benfeitor", na projeção pessoal, do que os mais necessitados - , por um espetáculo de palavras bonitinhas, músicas piegas, fora tantas e tantas tolices.
"MÉDIUNS" INTENSIFICARAM O ROUSTANGUISMO
Tudo virou um igrejismo inócuo. Nem mesmo quando há palestrantes e "médiuns" teorizando "corretamente" os ensinamentos kardecianos originais adianta. É aquele ditado: "primeiro o serviço, depois a diversão", e, assim que esses "teóricos" supostamente cumprem a "lição de aula" de expor, em seminários e programas de TV, a verdadeira teoria espírita, eles vão a outros eventos expressar o mais viscoso e exultante igrejismo.
A partir de Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco, o igrejismo herdado do pioneiro deturpador Roustaing, que prometia ser definitivamente descartado, foi mantido e intensificado mesmo sob o verniz do "espiritismo autêntico". O roustanguismo foi uma postura que já havia prevalecido oficialmente no "movimento espírita", mas sem o apetite redobrado que se obteve após "engavetar" o sobrenome de Roustaing em nome do falso ideal do "Kardec total".
Chico Xavier e Divaldo Franco mantiveram seu igrejismo roustanguista com o máximo de convicção. Mas é como na política de hoje, em que o nome do deputado Eduardo Cunha faz muitos adeptos da "derrubada do PT" de 2016 hoje torcerem o nariz, se esquecendo que ele presidiu a sessão da Câmara dos Deputados que abriu o processo de impeachment que depois tirou a presidenta Dilma Rousseff do poder.
As propostas do governo Michel Temer, como as ditas reforma trabalhista e previdenciária, além de aspectos como a flexibilização nas negociações entre patrões e empregados e a terceirização total (para atividades-fim das empresas, pois a medida antes se limitava para atividades-meio), já faziam parte das pautas-bombas do então presidente da Câmara, atualmente preso. Aliás, essas mesmas propostas são apoiadas pelos "espíritas".
Pois é a mesma coisa. O governo Michel Temer se autoproclama "legalista" e "democrático" e usa as ideias de Eduardo Cunha jogando o nome deste na lata de lixo, aproveitando as ideias e escondendo o idealizador. O "espiritismo" brasileiro, que se diz "progressista", vestiu a camisa de Roustaing sem mostrar a sua grife, jogando o nome do deturpador pioneiro por debaixo do tapete.
Os "médiuns" são os maiores propagandistas deste roustanguismo enrustido. E sabemos por que o nome de Roustaing foi desnecessário: ele foi inteiramente adaptado ao contexto brasileiro pelas obras de Chico Xavier e Divaldo Franco, que agora são representantes oficiais de tais ideias igrejeiras.
A figura do "médium" já se tornou uma grande aberração, revelando um processo de clericalização à paisana, canonização em vida e na base do "achismo" e intenso culto à personalidade. Ela perdeu o sentido intermediário da função original, e o "médium" ainda tem o agravante de produzir obras fake que não condizem aos aspectos pessoais dos autores mortos alegados.
NÃO FOI SEM QUERER
Muitos acreditam que Chico e Divaldo tenham sido "católicos" sem querer. A desculpa usada para seu igrejismo é que eles "estavam empolgados demais" com o Catolicismo que "botaram tempero católico em excesso" no conteúdo da Doutrina Espírita. Oficialmente, aceita-se isso sob o pretexto, em verdade bastante discutível, das afinidades com os ensinamentos de Jesus, ignorando que os "médiuns" adotam uma interpretação medieval do mito do homem de Nazaré.
Mas um simples raciocínio revela que os dois "médiuns" não catolicizaram o Espiritismo sem querer, por acidente ou falta de tempo para estudo. Eles fizeram isso de propósito e com a consciência plena do que estavam fazendo.
Chico Xavier e Divaldo Franco não teriam catolicizado sem querer o Espiritismo porque não faz sentido fazer algo de longa data, grande repercussão e amplo alcance sem propósito ou por um lapso de consciência. Eles veicularam seu igrejismo em obras publicadas durante décadas, que repercutiam num público de grandes dimensões, pelo Brasil e pelo mundo, algo que deve ser entendido como um procedimento feito com a mais evidente intenção de "vaticanizar" a Doutrina Espírita.
Outro dado a considerar é que Chico e Divaldo continuaram igrejistas mesmo após a promessa que os dois haviam feito há mais de 40 anos, para agradar espíritas autênticos diante da crise vivida pela cúpula da FEB após o falecimento do ex-presidente Antônio Wantuil de Freitas (que havia sido descobridor e "empresário" de Chico Xavier), de que os dois "médiuns" iriam "aprender Kardec".
Nem mesmo a pose de humildade, diante dessa promessa de, supostamente, obter um aprendizado melhor da doutrina kardeciana, convence, pois o aprendizado nunca foi devidamente alcançado, em que pesem exposições eventuais de ideias teóricas do Espiritismo original. Até porque, sabemos, é insuficiente expor a teoria kardeciana original num momento, e praticar igrejismo em outro. Não se faz um bom mestre por ele ensinar bem numa ocasião, e depois ensinar mal em outra.
Por isso, vemos que o "espiritismo" brasileiro vive uma crise bastante severa pelas más escolhas que teve. E agora as dívidas da promessa não cumprida se tornam ainda mais fortes, de forma que é impossível que essa promessa seja feita novamente, com o mesmo papo de "viver Kardec de verdade".
O apetite igrejeiro dos "espíritas" só aumentou, superando até mesmo os tempos em que o roustanguismo era mais aberto e mais explícito. Isso porque o que antes parecia uma formalidade acabou sendo a "alma" do "espiritismo" brasileiro, que, por ironia, se tornou ainda mais roustanguista quando o sobrenome Roustaing foi escondido nas gavetas da FEB.
Foram mais de 40 anos de promessa para melhor aprender os ensinamentos de Allan Kardec. Tanto se prometeu a respeito disso, mas o que vimos foi apenas aparatos, fingimentos, simulações. As promessas foram em vão e nunca passaram de promessa para boi dormir, de conversa mole para os "místicos" agradarem os "científicos".
Enquanto isso, o nome de Jean-Baptiste Roustaing - ou J. B. Roustaing - , renegado oficialmente a ponto do referido sobrenome se tornar um "palavrão" entre uma parcela de "espíritas", ou um "estranho desprezível" do qual os "espíritas" menos iniciados nunca ouviram falar, continua ressoando através de seu legado, pois o roustanguismo tornou-se ainda mais forte e intenso entre os "espíritas" que se autoproclamam "rigorosamente fiéis a Kardec".
Há mesmo os "espíritas" que estufam o peito para fazer falsos ataques à "vaticanização", dizendo, com um discurso envaidecido, serem contra os "constantinos" que corrompiam a Doutrina Espírita, sem olhar para si mesmos, "constantinos" convictos até a medula, beatos que pensam que Kardec é o "sacerdote moderninho" que aceitaria qualquer capricho igrejeiro.
Palestrantes que diziam, com ar triunfante, "devemos não só conhecer Kardec, mas vivê-lo no dia a dia" eram os que mais traíam o legado do pedagogo francês, misturando todo o apelo do "Kardec total" com um engodo igrejeiro medieval e até cheio de firulas esotéricas e ocultistas.Em nome do "espiritismo de verdade", evocava-se até o Horóscopo nas palestras, livros e artigos.
Quanta erosão doutrinária se observa nas "casas espíritas" mais diversas, nas publicações do gênero, quanto vazio de ideias camuflado por um simulacro de caridade - Assistencialismo, a "caridade" que mais ajuda o "benfeitor", na projeção pessoal, do que os mais necessitados - , por um espetáculo de palavras bonitinhas, músicas piegas, fora tantas e tantas tolices.
"MÉDIUNS" INTENSIFICARAM O ROUSTANGUISMO
Tudo virou um igrejismo inócuo. Nem mesmo quando há palestrantes e "médiuns" teorizando "corretamente" os ensinamentos kardecianos originais adianta. É aquele ditado: "primeiro o serviço, depois a diversão", e, assim que esses "teóricos" supostamente cumprem a "lição de aula" de expor, em seminários e programas de TV, a verdadeira teoria espírita, eles vão a outros eventos expressar o mais viscoso e exultante igrejismo.
A partir de Francisco Cândido Xavier e Divaldo Pereira Franco, o igrejismo herdado do pioneiro deturpador Roustaing, que prometia ser definitivamente descartado, foi mantido e intensificado mesmo sob o verniz do "espiritismo autêntico". O roustanguismo foi uma postura que já havia prevalecido oficialmente no "movimento espírita", mas sem o apetite redobrado que se obteve após "engavetar" o sobrenome de Roustaing em nome do falso ideal do "Kardec total".
Chico Xavier e Divaldo Franco mantiveram seu igrejismo roustanguista com o máximo de convicção. Mas é como na política de hoje, em que o nome do deputado Eduardo Cunha faz muitos adeptos da "derrubada do PT" de 2016 hoje torcerem o nariz, se esquecendo que ele presidiu a sessão da Câmara dos Deputados que abriu o processo de impeachment que depois tirou a presidenta Dilma Rousseff do poder.
As propostas do governo Michel Temer, como as ditas reforma trabalhista e previdenciária, além de aspectos como a flexibilização nas negociações entre patrões e empregados e a terceirização total (para atividades-fim das empresas, pois a medida antes se limitava para atividades-meio), já faziam parte das pautas-bombas do então presidente da Câmara, atualmente preso. Aliás, essas mesmas propostas são apoiadas pelos "espíritas".
Pois é a mesma coisa. O governo Michel Temer se autoproclama "legalista" e "democrático" e usa as ideias de Eduardo Cunha jogando o nome deste na lata de lixo, aproveitando as ideias e escondendo o idealizador. O "espiritismo" brasileiro, que se diz "progressista", vestiu a camisa de Roustaing sem mostrar a sua grife, jogando o nome do deturpador pioneiro por debaixo do tapete.
Os "médiuns" são os maiores propagandistas deste roustanguismo enrustido. E sabemos por que o nome de Roustaing foi desnecessário: ele foi inteiramente adaptado ao contexto brasileiro pelas obras de Chico Xavier e Divaldo Franco, que agora são representantes oficiais de tais ideias igrejeiras.
A figura do "médium" já se tornou uma grande aberração, revelando um processo de clericalização à paisana, canonização em vida e na base do "achismo" e intenso culto à personalidade. Ela perdeu o sentido intermediário da função original, e o "médium" ainda tem o agravante de produzir obras fake que não condizem aos aspectos pessoais dos autores mortos alegados.
NÃO FOI SEM QUERER
Muitos acreditam que Chico e Divaldo tenham sido "católicos" sem querer. A desculpa usada para seu igrejismo é que eles "estavam empolgados demais" com o Catolicismo que "botaram tempero católico em excesso" no conteúdo da Doutrina Espírita. Oficialmente, aceita-se isso sob o pretexto, em verdade bastante discutível, das afinidades com os ensinamentos de Jesus, ignorando que os "médiuns" adotam uma interpretação medieval do mito do homem de Nazaré.
Mas um simples raciocínio revela que os dois "médiuns" não catolicizaram o Espiritismo sem querer, por acidente ou falta de tempo para estudo. Eles fizeram isso de propósito e com a consciência plena do que estavam fazendo.
Chico Xavier e Divaldo Franco não teriam catolicizado sem querer o Espiritismo porque não faz sentido fazer algo de longa data, grande repercussão e amplo alcance sem propósito ou por um lapso de consciência. Eles veicularam seu igrejismo em obras publicadas durante décadas, que repercutiam num público de grandes dimensões, pelo Brasil e pelo mundo, algo que deve ser entendido como um procedimento feito com a mais evidente intenção de "vaticanizar" a Doutrina Espírita.
Outro dado a considerar é que Chico e Divaldo continuaram igrejistas mesmo após a promessa que os dois haviam feito há mais de 40 anos, para agradar espíritas autênticos diante da crise vivida pela cúpula da FEB após o falecimento do ex-presidente Antônio Wantuil de Freitas (que havia sido descobridor e "empresário" de Chico Xavier), de que os dois "médiuns" iriam "aprender Kardec".
Nem mesmo a pose de humildade, diante dessa promessa de, supostamente, obter um aprendizado melhor da doutrina kardeciana, convence, pois o aprendizado nunca foi devidamente alcançado, em que pesem exposições eventuais de ideias teóricas do Espiritismo original. Até porque, sabemos, é insuficiente expor a teoria kardeciana original num momento, e praticar igrejismo em outro. Não se faz um bom mestre por ele ensinar bem numa ocasião, e depois ensinar mal em outra.
Por isso, vemos que o "espiritismo" brasileiro vive uma crise bastante severa pelas más escolhas que teve. E agora as dívidas da promessa não cumprida se tornam ainda mais fortes, de forma que é impossível que essa promessa seja feita novamente, com o mesmo papo de "viver Kardec de verdade".
O apetite igrejeiro dos "espíritas" só aumentou, superando até mesmo os tempos em que o roustanguismo era mais aberto e mais explícito. Isso porque o que antes parecia uma formalidade acabou sendo a "alma" do "espiritismo" brasileiro, que, por ironia, se tornou ainda mais roustanguista quando o sobrenome Roustaing foi escondido nas gavetas da FEB.
sexta-feira, 24 de novembro de 2017
Modismo das tatuagens revela preguiça em guardar valores na mente das pessoas
Nem sempre certas atitudes aparentemente "livres" representam vanguarda ou rebeldia. A desculpa de que a rejeição dessas atitudes indica "preconceito" ou "moralismo" nem sempre procede, porque muitos dos "libertários" da ocasião é que são os mais conservadores e convencionais.
O modismo das tatuagens no Brasil, em especial no Estado do Rio de Janeiro, diz mais sobre a incapacidade das pessoas de terem ideias próprias ou guardar seus valores na mente e expressarem pelas conversas do que de qualquer uso do corpo para alguma livre expressão.
Isso tanto é verdade que as pessoas mais convencionais e conservadoras que vivem no Grande Rio e regiões similares em todo o país - mas também nos EUA e Reino Unido, por exemplo - são as que mais usam tatuagens. Há muito ser tatuado tinha a ver com transgressão ou rebeldia, assim como o uso de piercing ou a apreciação de um gosto musical de baixa qualidade e valor artístico-cultural duvidoso.
Nada disso tem a ver mais com transgressão ou vanguardismo. Ter o pior gosto musical, ouvir as mais derramadas canções bregas e a esculhambação que vier nas FMs mais populares - como os "sertanejos", funkeiros ou coisa parecida - , e, depois, a falsa sofisticação musical de nomes igualmente cafonas, mas dotados de uma cosmética "chique", como Chitãozinho & Xororó e Alexandre Pires, é sinal mais de convencionalismo conservador do que de subversão ou provocação.
No caso de tatuagens e piercings, a mesma coisa, assim como a hipersexualização. No caso da hipersexualização, um modismo hoje em decadência - com "musas" como Solange Gomes e Renata Frisson, a "Mulher Melão", mostrando seus corpos agora em espaços menos expressivos da Internet, como o BOL - , a "liberdade do corpo" era apenas uma cortina de fumaça para mulheres de corpos siliconados expressarem valores machistas que impulsionam as taras dos sociopatas da Internet.
A hipersexualização cria um impasse, quando dá a uma parcela de mulheres a opção monolítica de só mostrar seus corpos em "poses sensuais" (tão frequentes e apelativas que causam mais tédio, só empolgando os tarados compulsivos). Afinal, a "livre sensualidade" acaba causando, nos internautas iludidos com esse "mundo livre das siliconadas", um impulso sexual descontrolado e uma sensação de que podem tudo.
Daí que homens passaram a se achar no direito de fazer estupros coletivos, combinados com outros rapazes, na ilusão de ver em certas mulheres "casadas com todos os homens". Ou de masturbarem em público ao ver mulheres que, mesmo sem a vulgaridade das siliconadas, causam, sem querer, excitação sexual nos machões descontrolados.
O que mostra um aspecto conservador e retrógrado na "liberdade do corpo" de siliconadas, e o que causou um profundo desgaste nas mesmas, é que a "liberdade" que elas representavam entrou em choque com os impulsos machistas, sobretudo num tempo em que famosos como o ator brasileiro José Mayer e o produtor de Hollywood, Harvey Weinstein, foram denunciados por assédio sexual (e estupro, da parte deste último).
Mesmo a tentativa de atribuir às siliconadas um suposto feminismo, apenas pelo fato delas aparentemente não terem namorados nem maridos - embora elas fossem empresariadas por homens, fato ignorado por muitos - , criando um desnecessário maniqueísmo entre duas concepções machistas da mulher, a escrava do lar (reconhecidamente machista) e a mulher-objeto (tida como falsamente feminista), não convenceu.
Vivemos uma época em que os valores estão sendo reavaliados. E entra o caso da tatuagem, no qual um artigo de Veja escrito por uma autora convidada, em 1985, já havia alertado sobre a mania de criar "cicatrizes" no corpo com a tatuagem. Mais de três décadas depois, muitos adotam a tatuagem como se fosse uma forma de autoafirmação pessoal, sem perceber que a fama de transgressora dessa medida, se não era forte, se dissolveu hoje.
Nas redes sociais, o que se observa é que os tatuados são, em maioria, figuras conservadoras ou, quando dotadas de algum progressismo, este é muito frágil e limitado. Em todo caso, são pessoas quase sempre dotadas de algum anacronismo cultural ou ideológico que necessitam da pintura do corpo para parecerem "diferentes", mas o corpo tatuado não acoberta a mesmice mental que essas pessoas possuem.
Incapazes de terem ideias próprias, as pessoas recorrem à tatuagem para forjar uma modernidade que não têm, sem saber que, de tão banal, a tatuagem já perdeu qualquer sentido de modernidade. São pessoas incapazes de formar em suas próprias mentes suas ideias e valores e preferem marcá-los, como gado marcado a ferro sob as ordens do dono da fazenda, no seu corpo. O anacronismo dos tatuados os faz não serem considerados "livres", mas submissos como gado bovino.
Numa sociedade hoje dominada pelo anacronismo que é a do Estado do Rio de Janeiro, no qual os últimos redutos de modernidade, como Copacabana e Ipanema, são invadidos por fenômenos ou espécies típicos do interior coronelista rural, como linchamentos de vendedores e ações de "justiceiros" exterminando moradores de rua, os tatuados se tornam um fenômeno já condenado à decadência.
Na vida amorosa, homens e mulheres tatuados são desvalorizados de tal forma que somente o contexto pode permitir algum êxito, sobretudo quando as tatuagens são poucas e discretas. Essa desvalorização já se reflete também em outros aspectos, como o fanatismo por religião e futebol, o reacionarismo ideológico extremo ou o gosto musical por músicas consideradas bregas e "populares demais".
A alegação de "combate ao preconceito" só expressa o vitimismo que tais pessoas têm, que, apegadas a tais convenções sociais - curtir um "sertanejo" ou um "pagode romântico", botar uma tatuagem na perna ou falar de futebol até quando não ocorre uma única partida sequer deste esporte - , falsamente tidas como "inconvencionais", não percebem o quanto querem ser vistas como "diferentes" e "livres", mesmo tão presas a essas convenções e submissas ao poder midiático e mercadológico que lhes indica tais "liberdades".
A tendência que está surgindo é a necessidade de remover tatuagens, que ainda formará longas e longas filas nas clínicas de cirurgia plástica. A hipótese apavora muitos dos tatuados que acham que suas marcas no corpo são "eternas", mas da forma como a tatuagem está se associando a pessoas cafonas, convencionais e conservadoras fará muita gente correr para os cirurgiões plásticos para a remoção das marcas que antes lhes eram motivo de orgulho e triunfo.
Espera-se, que, no caso das pessoas desejarem remover suas tatuagens, que procurem clínicas de melhor conceito, que trabalhem sob condições rigorosas de higiene e cometam os mais austeros cuidados de qualquer espécie. Para que assim a remoção de tatuagens possa representar um processo menos danoso para as pessoas, evitando que a remoção da marca crie cicatrizes piores na pele ou causem qualquer tipo de dano ou mesmo a morte.
quinta-feira, 23 de novembro de 2017
O reacionarismo digital e a ameaça à sociedade
Desde os tempos do Orkut, o reacionarismo social se tornou um problema. Desde quando fascistas digitais se escondiam em comunidades mais populares como "Eu Odeio Acordar Cedo", a mania de humilhar os outros ultrapassou os limites.
Se há dez anos os ataques digitais, combinados por um grupo de pessoas que, num horário acertado, decidem humilhar e fazer ameaças a alguém, se limitavam a internautas anônimos ou semi-anônimos. Depois, eles passaram a ameaçar pessoas famosas e agora partem para ameaças institucionais, principalmente as entidades de ensino.
O perfil da maioria desses reacionários surpreende. Por um lado, jovens de aparência moderna, garotões com pinta de surfista, universitário ou skatista, moças com jeitão de descoladas, pessoas que gostam de noitadas, falam palavrão e que, na vida real, se reúnem em bares para beber muito e conversar e cantar alto. São pessoas "comuns", que aparecem nos eventos festivos (até no Rock In Rio, por exemplo), vestem roupas da moda e se acham "as mais modernas do mundo".
Por outro, pessoas que dizem acreditar em valores cristãos. Pessoas que falam em liberdade de fé, em caridade em Cristo, em amor ao próximo, quando tudo se encontra nos limites ideológicos promovidos pela sua religião. Eles também se misturam aos citados no parágrafo anterior para promover ataques digitais contra quem não corresponde aos pontos de vista de uns e outros.
E por que essas duas camadas opostas se juntam em ataques digitais? Pessoas que se dizem "tudo de bom", que "são da paz" e se acham "show de bola" envolvidos em campanhas de humilhação e até de ameaça de agressão física. Houve caso até de busólogo (pessoa que admira ônibus) envolvido em ataques digitais e até em visitas em cidades de suas vítimas a título de intimidação, o que indica que o ódio que ele expressava no Orkut e Facebook estava caminhando para a violência física.
Nos últimos meses, na Universidade Federal da Bahia, em Salvador, uma professora e um estudante receberam ameaças de morte pelas redes sociais por causa de pesquisas de gênero que estavam em andamento na Faculdade de Filosofia e Ciências Humanas, localizada no bairro de São Lázaro, na capital baiana.
Uma professora e pesquisadora do Núcleo de Estudos Interdisciplinares sobre a Mulher (Neim) e um aluno que produzia dissertação para o Instituto de Humanidades, Artes e Ciências (IHAC), envolvidos em trabalhos sobre estudo de gênero e negritude, o que envolve, além de negros, questões ligadas à mulher e à causa LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transgêneros), foram as vítimas dessas ameaças, que teriam sido enviadas por considerável envolvimento de internautas.
INTOLERÂNCIA
Esses ataques se seguem depois de, meses atrás, à filósofa estadunidense LGBT Judith Butler (casada com uma mulher) durante sua visita ao Brasil, e aos ataques feitos a uma performance de um homem nu numa exposição de arte em São Paulo e uma mostra de temas LGBT e heresia a símbolos religiosos em Porto Alegre.
Eles refletem a ascensão de grupos reacionários que, antes, haviam agido discretamente nos tempos do Orkut e até fingido se passar por "progressistas". Entre 2005 e 2007, esses reacionários chegaram a se proclamar de "centro-esquerda" e evitar atacar Lula e outros símbolos da esquerda, pois era a época do auge da popularidade do presidente brasileiro e os reacionários queriam obter apoio de internautas para uma ocasião em que eles pudessem fazer o seu proselitismo de direita.
De 2009 para cá, o reacionarismo passou a ser aberto, e, desde então, grupos passaram a ser formados, dando origem a organizações como Movimento Brasil Livre, Acorda Brasil, Revoltados On Line, Vem Pra Rua etc. Muitos passaram a defender abertamente políticos como Jair Bolsonaro, rompendo com o pseudo-esquerdismo dos tempos do "Eu Odeio Acordar Cedo".
Defendendo abertamente projetos de exclusão social, apoiando as "reformas" de Temer e projetos obscurantistas como Escola Sem Partido, essas pessoas passaram a expressar seus preconceitos sociais sem medo das consequências, animados com o golpe político que tirou a progressista Dilma Rousseff do poder, em 2016.
Esse público simboliza a onda de ódio e intolerância social que se volta contra os antigos beneficiados da fase em que o Partido dos Trabalhadores (PT) esteve no poder federal. Negros, homossexuais, trabalhadores, domésticas etc, tornaram-se alvo não só de projetos político-institucionais excludentes - como a chamada reforma trabalhista - , mas também de aberta campanha difamatória e até homicida de uma parcela de jovens que se expressam nas redes sociais.
Mesmo o busólogo (que reside numa cidade da Baixada Fluminense vizinha do subúrbio carioca) que praticou intolerância social, criando página de ofensas e visitando as cidades de suas vítimas como forma de intimidar e ameaçar violência física, revela um sentimento segregacionista e discriminatório.
O busólogo, muito conhecido no seu meio, insultava negros, pardos e nordestinos radicados no Rio. Mesmo através da defesa doentia de uma medida antipopular imposta pela Prefeitura do Rio de Janeiro, a pintura padronizada nos ônibus (que prejudica os passageiros na hora de ir e vir devido à confusão de diferentes empresas sob o mesmo visual), ele era a expressão, no hobby da busologia, da intolerância social que infelizmente está em moda hoje em dia.
O reacionarismo ocorre, ironicamente, pela ilusão de liberdade sem limites dos internautas reacionários, para os quais só vale a liberdade deles, mas nunca a liberdade dos outros que diferem do seu status quo. Muitos desses reacionários nem sequer escondem seus nomes, pois eles se consideram "pessoas de coragem" e acham que estão "fazendo o certo" ao humilhar quem, segundo o juízo de valor deles, "não presta na sociedade".
E OS "ESPÍRITAS"?
É certo que os "espíritas" não aprovariam agressões desse tipo, mas sua postura em relação a grupos reacionários em geral chegou a ser de certo apoio, quando eles se envolveram nas passeatas contra Dilma Rousseff em 2016.
O periódico "Correio Espírita" chegou a definir os movimentos do "Fora Dilma" como "despertar político da juventude". Houve, entre os "espíritas", quem identificasse nos manifestantes a existência de "crianças-índigos" ou "crianças-cristais", mesmo em grupos como Revoltados On Line, cujo nome remete a "revolta", expressão definida como "negativa" pelo "movimento espírita".
Nos últimos meses, os "espíritas" se queixam de, supostamente, sofrerem intolerância religiosa, tanto na necessidade de pretensamente vincular ao sofrimento que, realmente, têm as religiões afro-brasileiras (frequentemente confundidas com "espiritismo"), quanto para interpretar de maneira tendenciosa os ataques sofridos a símbolos ou instituições "espíritas".
Há pouco tempo, um mausoléu de Francisco Cândido Xavier foi atacado por um vândalo a pedradas, em Uberaba. O responsável pelo mausoléu e "filho" adotivo de Chico Xavier, Eurípedes Higino, acredita ter sido, "sem dúvida", um "ato de intolerância religiosa".
Mas o contexto do "espiritismo" mostra que a religião não sofre intolerância, por ser uma religião de elite, do contrário que as crenças afro-brasileiras e muçulmanas, associadas a povos socialmente excluídos.
Além disso, o mausoléu de Chico Xavier foi alvo de ataques pelo fato dele ter sido uma celebridade. Até se fosse o mausoléu de Garrincha ou de Hebe Camargo, os ataques seriam rigorosamente os mesmos, vide o caso de uma estátua do poeta Carlos Drummond de Andrade, no Rio de Janeiro.
O "espiritismo" é uma das religiões mais toleradas do Brasil. Religião que se afastou das lições racionais de Kardec - fato comprovado no confrontamento das obras brasileiras com obras originais como O Livro dos Médiuns e O Livro dos Espíritos - , o "espiritismo" nunca teve a deturpação de sua matriz devidamente questionada em trabalhos de grande repercussão.
Pelo contrário, tudo que é relacionado ao "espiritismo" é aceito sem críticas. A participação de Divaldo Franco, no lançamento oficial da "farinata", duvidoso alimento que o prefeito de São Paulo, João Dória Jr., iria distribuir nas escolas e instituições religiosas (recentemente ele oficialmente desistiu da ideia), permitindo que seu nome e o logotipo do Você e a Paz fossem amplamente divulgados, como num vínculo de imagem, pelo governante, é um caso ilustrativo.
Nenhum jornalista sequer perguntou por que a "farinata" foi lançada num evento organizado por um "médium espírita". Ninguém observou o logotipo e o nome de Divaldo Franco claramente expostos durante o lançamento da "ração humana". Aquilo era vínculo de imagem, mas o "médium" saiu de fininho, diante do silêncio total da imprensa, mesmo a de esquerda.
Com isso, Divaldo Franco tem garantida a sua palestra no evento igrejista Você e a Paz prevista para dezembro, em Salvador, enquanto o homenageado da edição paulista, João Dória Jr., briga com colegas do PSDB e tem, a cada dia mais distantes, as chances de se candidatar à Presidência da República em 2018. Tolera-se até mesmo uma má decisão de um "médium espírita".
UFBA - Sobre os ataques, nas redes sociais, a pesquisadores da Universidade Federal da Bahia , a Polícia Federal está acompanhando o caso e investiga as mensagens ameaçadoras, com o objetivo de identificar as origens e os responsáveis.
quarta-feira, 22 de novembro de 2017
Até que ponto os "espíritas" fazem lobby no mercado literário brasileiro?
O mercado literário brasileiro, nos últimos anos, é marcado pela mediocridade e por uma certa resistência a obras comprometidas com o conhecimento. É verdade que algumas coisas melhoraram em relação a 2015, quando o mercado viveu sua pior fase, mas mesmo assim a finalidade anestesiante ainda predomina na maioria das obras mais vendidas.
Em 2015, sabe-se, prevaleceu todo tipo de escapismo literário. Havia os habituais livros de auto-ajuda, que mais servem para ajudar os autores a faturarem mais. Além deles, romances de jovens estudantes transformados em vampiros. A reboque, vieram diários de youtubers, dotados do mais puro superficialismo, romances de jogos eletrônicos de Minecraft e até livros para colorir, risivelmente incluídos na categoria de "não-ficção".
Os livros para colorir, embora aparentemente bem intencionados - eles são anunciados como "literatura (sic) anti-estresse" - , eram uma aberração injustificável diante de um contexto em que jornais e revistas deixam de ter versões impressas e passam a ser publicados somente na Internet. Assim como esta mídia, os livros para colorir, ao menos, deveriam ser publicados só na Internet, deixando ao leitor a opção pessoal de imprimir ou não.
Muitos desses livros para colorir acabaram tirando o espaço de muitas obras comprometidas com o conhecimento, fazendo com que 2015 se tornasse um ano surreal da literatura, no qual a finalidade anestesiante de fuga do saber era o objetivo um tanto insólito e contraditório, pois os livros deveriam ser uma atividade que estimulasse a obtenção do saber e não o contrário.
Aí, percebemos fatos surreais como a ausência de obras literárias de grande envergadura, como as do escritor maranhense Humberto de Campos. A última vez que foi lançada a coleção de livros dele, foi em um volume único, em 2014, para celebrar os 80 anos de falecimento do escritor.
As obras do autor maranhense geralmente são disponíveis apenas em sebos e em arquivos para download na Internet. Admite-se que páginas como o portal de sebos Estante Virtual e o de livros digitais Domínio Público fazem sua parte, mas nem todas as obras de Humberto aparecem disponíveis nessas páginas.
Enquanto isso, as obras, reconhecidamente fake, atribuídas ao espírito Humberto de Campos, trazidas pelo "médium" Francisco Cândido Xavier, são livremente publicadas e disponíveis com a facilidade de um cafezinho num circuito de bares.
Essas obras, que qualquer pesquisa mais atenta e uma leitura mais apurada vai reconhecer disparates grosseiros em relação ao estilo original do autor maranhense, circulam livremente, e, não obstante, também têm versões gratuitas para download, na Internet, com a diferença de que são TODAS as obras "mediúnicas", em edições integrais.
Até que ponto a FEB e o "movimento espírita" podem influir no mercado literário brasileiro? Sabemos que a FEB exerce um lobby que inclui a Rede Globo de Televisão e outras instituições relacionadas ao conservadorismo ideológico que garante a blindagem do "espiritismo" brasileiro. Mas não há como entender como os "espíritas" podem influir tanto nesse lobby, que envolve também outras editoras, mesmo fora do âmbito "espírita".
As pessoas sentem falta de uma obra como O Enigma Chico Xavier Posto à Clara Luz do Dia, de Attila Paes Barreto, que foi lançado em 1944 e se tornou uma raridade. Nem mesmo uma versão em PDF foi disponibilizada deste livro que aponta irregularidades severas em relação à suposta mediunidade do arrivista Chico Xavier, o "Aécio Neves dos espíritas".
Enquanto isso, livros como Não Será em 2012 alimentam uma série de adaptações em documentários e, depois, em livros baseados em documentários, e documentários baseados em livros baseados em documentários e assim por diante. O referido livro, de Marlene Nobre e Geraldo Lemos Neto, já inspirou o desnecessário documentário Data-Limite Segundo Chico Xavier, que por sua vez foi adaptado para um livro homônimo de Juliano Pozzati e Rebecca Casagrande.
O "movimento espírita" se compromete com a atualização, nunca devidamente assumida, da herança do Catolicismo do Brasil-colônia. Embora, em tese, o "espiritismo" brasileiro é uma adaptação local da doutrina de Allan Kardec, essa ideia é falaciosa, porque, o que vemos, em seu conteúdo, é uma forma reciclada do Catolicismo jesuíta do período colonial, com as devidas adaptações de contexto.
Uma dessas adaptações, por exemplo, é a combinação do Catolicismo medieval - vigente no Catolicismo jesuíta português, introduzido no Brasil a partir da catequização dos índios - com elementos de feitiçaria e esoterismo, como se houvesse um acordo entre os católicos medievais e uma parcela de hereges.
Dessa forma, a paranormalidade adotada no "espiritismo" brasileiro pouco tem a ver com a que é sistematizada em O Livro dos Médiuns - livro que adverte sobre muitos aspectos negativos de deturpadores, depois praticados pelas obras dos "médiuns" brasileiros Chico Xavier e Divaldo Franco, entre outros - , estando mais próxima de feiticeiros, bruxas e videntes que atuavam no submundo da sociedade medieval.
Quanto ao pretenso intelectualismo, não é de hoje que a FEB e as lideranças "espíritas" adotam uma postura ilustrada e pedante. No começo do século XX, "espíritas" posavam como se fossem membros da Academia Brasileira de Letras, como se a FEB fosse um arremedo desta instituição.
Não é surpresa, portanto, que escritores que haviam sido membros da ABL, como Humberto de Campos e Olavo Bilac, ou eram patronos (autores já falecidos homenageados pelas cadeiras da academia na época de sua fundação, 1897), como Casimiro de Abreu e Castro Alves, tenham sido usurpados pelo "movimento espírita" na publicação de supostas obras psicográficas, cujo conteúdo apresenta graves irregularidades de estilo.
Essas obras, por essas irregularidades, se tornaram precursoras da literatura fake depois difundida na Internet. Não por acaso, pela sintonia vibratória de acordo com o nível obscurantista das redes sociais, como Facebook e WhatsApp, o "movimento espírita" encontra cadeira cativa nestes espaços virtuais.
A deturpação presente no "espiritismo" brasileiro, que o fez fugir do legado original de Kardec, apesar de toda bajulação a sua figura, permite essas situações surreais, em que obras fake são tidas como "verdadeiras" pela carteirada religiosa que significam.
O que se pode inferir sobre o lobby dos "espíritas" no mercado literário - que faz com que a FEB tenha instalações na Bienal do Livro, como nas fotos acima da edição de 2016 - é que o poderio do "movimento espírita", que derruba de vez a sua imagem de "humilde" e "despretensiosa", reflete as condições que travam o progresso do nosso país, entregue a essa forma reciclada de obscurantismo religioso que se sustenta sob um verniz "intelectual".
terça-feira, 21 de novembro de 2017
Charles Manson e o moralismo dos assassinos ilustres
Tirar a vida dos outros levantando bandeiras moralistas, como um certo ódio a movimentos de vanguarda e de esquerda ou a defesa do machismo dá a certos assassinos de classes abastadas uma postura glamourizada, da qual passam a formar até estranhos fãs-clubes.
O falecimento do fracassado músico e ator Charles Manson - que havia feito testes para entrar na banda de rock Monkees e tentou se entrosar com músicos e produtores ligados aos Beach Boys e Byrds - , aos 83 anos, num hospital de Bakersfield, na Califórnia, aos 83 anos.
Ele era líder de uma seita macabra chamada Família Manson, que pretendia liquidar várias celebridades associadas à "decadência da sociedade". O projeto sanguinário começou quando Manson não era valorizado como músico aspirante pelo produtro Terry Melcher, conhecido por trabalhar com os Byrds. Melcher era filho da atriz Doris Day.
Manson então se declarou machista, racista e manifestava seu profundo ódio sobretudo ao movimento hippie e aos famosos que estiveram em evidência nos anos 1960. Ele planejava matar Melcher e Day, mas não conseguiu. E Manson usava canções dos Beatles, como "Helker Skelter", para justificar seus crimes. Por ironia, o perturbado Mark Chapman matou o ex-beatle John Lennon por motivos similares aos que inspiraram a atuação da Família Manson.
A chacina se deu em 09 de agosto de 1969. Membros da Família Manson saíam armados para disparar fogo contra vários alvos, entre eles a atriz Sharon Tate, então conhecida pelo filme O Vale das Bonecas, de 1967, e esposa do cineasta Roman Polanski. Em outra ironia, Charles Manson nasceu em 12 de novembro de 1934, exatos 35 anos antes de Guilherme de Pádua, ex-ator que havia assassinado a atriz Daniella Perez, em 28 de dezembro de 1992.
Vários membros foram presos e receberam prisão perpétua. Charles Manson, digamos, se livrou de três mortes. Uma, porque a pena de morte foi trocada pela prisão perpétua, por causa da revogação de uma lei local. Outra, é que a prisão perpétua o fez viver até 83 anos completos. A terceira, foi a sobrevivência de uma doença grave em janeiro, a mesma que, no entanto, o matou ontem.
Manson, se estivesse fora das grades há um tempo, digamos, em 1976, se valessem as normas brasileiras - que não preveem prisão perpétua, mas 30 anos de prisão, com liberdade condicional por bom comportamento depois de cumprido um sexto da pena - , teria morrido há tempos, pelo seu estilo de vida desregrado (consumia cocaína e era metido em confusões), e estima-se que, se Manson vivesse fora das grades desde então, teria morrido provavelmente entre 1994 e 2002, talvez antes.
Manson é o segundo dos principais membros da Família Manson a morrer. Em 24 de setembro de 2009, Susan Atkins, também envolvida no assassinato de Sharon Tate, faleceu aos 61 anos de câncer. A maioria dos membros da Família Manson está viva, mas alguns poucos também morreram e outros viveram no ostracismo, sem informações conhecidas de paradeiro.
A morte de Manson é a primeira grande morte, sem ocorrência de assassinato ou suicídio, amplamente divulgada de alguém que cometeu um crime. O psicopata também foi beneficiado, num contexto surreal dos EUA, por ter sido um "anti-herói", apoiado pela sociedade ultraconservadora (capaz de apoiar grupos como Klu Klux Klan), contra o movimento hippie e o psicodelismo.
Além disso, Manson chegou a ser considerado "cult" numa fase de "diarreia cultural" do grunge, quando nomes como G. G. Allin e Genitortures puxavam uma estranha onda de escatologia e morbidez comportamentais. Um evento de rock chegou a ser feito para comemorar os 60 anos de Manson, idolatrado como se fosse um psicopata fictício de filmes-B. O Guns N'Roses chegou a gravar uma música do psicopata, "Look at Your Game, Girl".
E NO BRASIL?
Há três assassinos de grande repercussão, famosos e idosos, com históricos de graves doenças. Dois feminicidas e um fazendeiro, associados a bandeiras moralistas que variam da "defesa da honra machista", da "defesa da família conjugal" e do "direito à propriedade de terra", esta uma desculpa para fazendeiros fuzilarem até missionárias que lutem contra o abuso de posses de terra de ricos latifundiários, um problema "clássico" do nosso coronelismo.
O feminicida Raul Fernando do Amaral Street, o Doca Street, de importante família aristocrática, a Street, tem um histórico de intenso tabagismo com uso de cocaína no passado. Matou a esposa, a socialite e ex-modelo Ângela Diniz por ciúme doentio, em Búzios, no dia 30 de dezembro de 1976. Nascido no mesmo ano de Manson, Street apareceu pela última vez, aparentemente saudável, em agosto de 2006, divulgando seu livro Mea Culpa, no qual tentava explicar seu crime pelo ponto de vista pessoal.
Mas há rumores, nunca oficialmente divulgados, de que Doca Street estaria sofrendo um câncer há 30 anos. Geralmente machistas não assumem adoecer de câncer e, com um intenso histórico tabagista que preocupava amigos, conforme reportagem de Manchete em janeiro de 1977, é possível que, hoje, o câncer esteja em estágio bastante avançado, para não dizer terminal.
O assassinato de Ângela e a soltura de Doca da prisão, por conta de seu advogado Evandro Lins e Silva (que, numa exceção à sua trajetória progressista, foi defender um machista rico) em 1981, inspirou uma grande série de atos semelhantes, criando uma onda de feminicídios conjugais que até hoje acontecem com surpreendente frequência.
Ironicamente, Doca matou Ângela em Búzios, distrito de Cabo Frio e vizinha de Casimiro de Abreu, terra natal do homônimo poeta ultrarromântico, movimento associado a homens solitários com o perfil oposto ao do empresário paulista que assassinou a mulher. Quando a imprensa noticiou os 40 anos do assassinato, no final de 2016, aparentemente não foi noticiado o atual paradeiro de Doca, depois das entrevistas que ele deu em 2006.
Outro feminicida, Antônio Marcos de Pimenta Neves, hoje com 80 anos, era chefe de redação de O Estado de São Paulo quando assassinou, por ciúme doentio, a colega Sandra Gomide, então com 33 anos em 20 de agosto de 2000. Pimenta Neves tentou suicídio ingerindo uma overdose acidental de remédios.
Segundo o portal IG, Pimenta Neves, nos últimos anos, ficou parcialmente cego por sintomas de diabetes e sofre de câncer na próstata. Há rumores de que ele também estaria sofrendo um processo de falência múltipla dos órgãos por efeito da overdose que havia cometido em 2000.
O fazendeiro Darly Alves é conhecido por ter sido o mandante do assassinato do líder ambientalista Chico Mendes, em 15 de dezembro de 1988, executado por seu filho Darcy Alves. Ambos estão entregues à impunidade. Darly é conhecido pelas constantes internações por causa de problemas sérios de úlcera.
As mortes de homicidas dessa espécie assustam a sociedade conservadora, por certas razões. Uma, pelo fato deles serem vistos como "justiceiros" moralistas diante de certas transformações sociais que as elites consideram incômodas, como a emancipação da mulher, a causa LGBT e a ascensão dos movimentos de trabalhadores rurais. Outro, é pelo medo de que, mortos, eles fossem assombrar a sociedade em virtude da interrupção da vida carnal.
Há até mesmo lendas de feminicidas que, ao morrerem, ficam "presos" às casas onde cometeram crimes. São apenas lendas. Na verdade, segundo a natureza do espírito desencarnado, assassinos, quando morrem, tendem a reencarnar o mais rápido possível, na ânsia de afastar a marca sombria de suas encarnações anteriores.
Diante das pressões sociais em que passam a viver, homicidas em geral tendem a viver de 60% a 80% a expectativa de vida de pessoas comuns. Sendo o homicídio o egoísmo humano levado às últimas consequências, o próprio executor sofre as pressões emocionais e sociais que acabam contribuindo, direta ou indiretamente, para o agravamento de doenças e ocorrência de acidentes trágicos.
Como diz a música "Hey Joe" (cuja original, interpretada por Jimi Hendrix Experience, remete a um recado a um feminicida), na versão do grupo brasileiro O Rappa: "também morre quem atira".
segunda-feira, 20 de novembro de 2017
A "fascinação obsessiva" protege os "médiuns" que deturpam o Espiritismo
Culto à personalidade, defesa de valores moralistas conservadores, apoio a políticos retrógrados, prática de Assistencialismo (caridade que pouco ajuda e serve mais de propaganda ao "benfeitor"), sem falar de ideias difundidas ao arrepio do legado original de Allan Kardec.
Esses defeitos estão presentes nos "médiuns espíritas" e as pessoas não percebem. E, quando são informadas, ainda coçam a cabeça e procuram dizer "Isso não é possível". Fazem ginástica mental para alegar que isso não faz sentido e que os "médiuns", embora "catolicizem demais" o Espiritismo, cumprem, aos olhos de muitos, a prometida "rigorosa fidelidade" à Codificação.
Não, não cumprem. Comparem o conteúdo dos livros de Allan Kardec com os livros que são publicados por Francisco Cândido Xavier e Divaldo Franco. Façam uma leitura cuidadosa, minuciosa, desprovido de paixões religiosas. Parem de sonhar com passarinhos voando sobre flores no mundo espiritual porque isso nem de longe foi cientificamente tido sequer como plausível.
Sem essas paixões religiosas, se verá que o conteúdo que os "médiuns" brasileiros difundem contraria, de forma bastante vergonhosa, o legado kardeciano. Não adianta Divaldo expor em entrevistas na TV a teoria correta de Kardec se ele lança obras e palestras contrárias.
Ensinar bem num momento e ensinar errado em tantos outros não é ser fiel ao legado espírita original, algo comparado a um homem que faz um discurso em favor do feminismo e, depois, quando volta para casa, vai bater na mulher.
O "espiritismo" brasileiro é fruto de uma série de estragos irreparáveis. Foi a religião que mais se corrompeu pelas suas más escolhas. A liberdade e a tolerância religiosa não podem ignorar esses graves aspectos, porque o direito a fé não permite jamais que as pessoas façam o que quiserem e se livrem das consequências de seus atos.
Hoje se vive a realidade absurda dos "médiuns" serem blindados com tanta obstinação pela sociedade que já superam até mesmo os políticos do PSDB, que, pelo menos, sofrem algum tipo de repúdio social. Ser "médium" no Brasil já é uma aberração, vivendo o culto à personalidade, se promovendo com Assistencialismo e vivendo do aparato das lindas imagens e belas palavras.
"MÉDIUNS" APRONTAM E SAEM ILESOS EM TUDO
O fato de um "médium" como Divaldo Franco sair "invisível" na grande imprensa ou mesmo na imprensa de esquerda, mesmo quando foi ele que ofereceu o evento Você e a Paz para o lançamento oficial da "farinata", a "ração humana" do prefeito de São Paulo, João Dória Jr., revela processos obsessivos que fazem com que a imagem adocicada dos "médiuns" se preserve a qualquer preço.
Chico Xavier foi o que mais personificou isso. De um pastichador literário - trabalho que não fazia sozinho, mas com a ajuda de Antônio Wantuil de Freitas e uma equipe editorial da FEB - a um quase Deus, o "médium" mineiro trilhou um caminho de muito oportunismo, a ponto dele, comprovado deturpador do Espiritismo, ser considerado "aproveitável" por muitos num esforço de recuperação das bases literárias. "Aproveitável" não se sabe por quê, mas "porque sim".
Ele usurpou a memória dos literatos falecidos. Não gostou de uma crítica de Humberto de Campos e esperou ele morrer para se apropriar dele e "mudar seu estilo" nas "psicografias". Foi julgado e impune por causa da seletividade da Justiça, e usou do processo de fascinação obsessiva para dominar Humberto de Campos Filho e evitar que ele continuasse os processos judiciais contra o "médium".
Como um Aécio Neves da religião, Chico Xavier aprontava e saía ileso. Era até ajudado, no caso da FEB que "tirou do caminho" o sobrinho que iria denunciar suas irregularidades "mediúnicas", Amauri Xavier. Passou por cima também do caso Otília Diogo, pois, apesar das provas de cumplicidade - fotos confirmam que Chico acompanhava a produção da farsa da suposta Irmã Josefa - , ele se saiu como "vítima".
Para complicar ainda mais, Chico Xavier passou a ser blindado pela Rede Globo de Televisão a partir dos anos 1970 e, mesmo assim, conseguia seduzir setores das esquerdas mesmo defendendo a ditadura militar e reprovando a crítica e o questionamento, pregando o "silêncio" como "voz da sabedoria" (falácia que é eufemismo de censura). Passou a ter a reputação, não se sabe por que motivo, de "progressista", suposta qualidade dada assim, de graça.
A coisa se tornou de tal forma que basta ser "médium espírita" para gozar de benefícios que se comparam a enredos como Prenda-me Se For Capaz e VIPs, baseados respectivamente nas trajetórias dos espertalhões Frank Abagnale Jr. e Marcelo Nascimento.
A aberração é tão grande que ser "médium espírita" hoje virou a fórmula para qualquer um fazer o que quiser e não ser pego de jeito algum. Pode-se até distribuir cestas básicas em campanha eleitoral que ninguém criminaliza, mesmo sob a base da lei.
Basta adquirir um casarão e jogar meia-dúzia de pobres e doentes, escrever livros atribuindo a um suposto morto com mensagens igrejeiras de "fé e esperança" e, pronto. Se Abagnale Jr. e Nascimento tivessem feito isso, estariam à beira da canonização.
O QUE É MESMO FASCINAÇÃO OBSESSIVA?
O Livro dos Médiuns, de Allan Kardec, fala de tipos de obsessão, nos quais se destacam dois dos mais perigosos, a "fascinação obsessiva" e a "subjugação". Geralmente a "fascinação obsessiva" domina os seguidores e adeptos, enquanto a "subjugação" domina aqueles com virtuais condições de investigar as irregularidades do "movimento espírita", como jornalistas, juristas e acadêmicos.
Muitos entendem a obsessão como um processo escancarado no qual um espírito claramente leviano e perverso, com um discurso claramente sombrio e malicioso, domina as pessoas na base da coerção e da ameaça. Ah, como as pessoas não percebem os voos altos da astúcia humana.
No "espiritismo", o que vemos é que a dominação se dá com o máximo de sutileza possível. Quase ninguém percebe, e mesmo os céticos se deixam levar pelo discurso de "fascinação obsessiva" que os "médiuns espíritas", movidos pelo culto à personalidade, difundem em seu favor.
O discurso é tão sofisticado que chega a se tornar uma pegadinha infalível que engana até mesmo pessoas com certo tipo de consciência crítica. Fora da religião, o "funk", um subproduto do comercialismo da mídia dominante, também se vale de apelos emocionais semelhantes, que pegaram as esquerdas desprevenidas. Para muitos oportunistas, basta mostrar fotos de crianças pobres sorridentes para conquistar a tão sonhada unanimidade social.
No caso dos "médiuns" dominando os seguidores, há uma analogia de caraterísticas da "fascinação obsessiva" de espíritos dominando médiuns na obra de Allan Kardec, pois o processo de dominação é exatamente o mesmo. Conforme o capítulo 23, item 239, de O Livro dos Médiuns:
239. A fascinação tem conseqüências muito mais graves. Trata-se de uma ilusão criada diretamente pelo Espírito no pensamento do médium e que paralisa de certa maneira a sua capacidade de julgar as comunicações. O médium fascinado não se considera enganado. O Espírito consegue inspirar-lhe uma confiança cega, impedindo-o de ver a mistificação e de compreender o absurdo do que escreve, mesmo quando este salta aos olhos de todos. A ilusão pode chegar a ponto de levá-lo a considerar sublime a linguagem mais ridícula. Enganam-se os que pensam que esse tipo de obsessão só pode atingir as pessoas simples, ignorantes e desprovidas de senso. Os homens mais atilados, mais instruídos e inteligentes noutro sentido, não estão mais livres dessa ilusão, o que prova tratar-se de uma aberração produzida por uma causa estranha, cuja influência os subjuga.
Dissemos que as conseqüências da fascinação são muito mais graves. Com efeito, graças a essa ilusão que lhe é conseqüente o Espírito dirige a sua vítima como se faz a um cego, podendo levá-lo a aceitar as doutrinas mais absurdas e as teorias mais falsas como sendo as únicas expressões da verdade. Além disso, pode arrastá-lo a ações ridículas, comprometedoras e até mesmo bastante perigosas.(1)
Compreende-se facilmente toda a diferença entre obsessão simples e a fascinação. Compreende-se também que os Espíritos provocadores de ambas devem ser diferentes quanto ao caráter. Na primeira, o Espírito que se apega ao médium é apenas um importuno pela sua insistência, do qual ele procura livrar-se. Na segunda, é muito diferente, pois para chegar a tais fins o Espírito deve ser esperto, ardiloso e profundamente hipócrita. Porque ele só pode enganar e se impor usando máscara e uma falsa aparência de virtude.
As grandes palavras como caridade, humildade e amor a Deus servem-lhe de carta de fiança. Mas através de tudo isso deixa passar os sinais de sua inferioridade, que só o fascinado não percebe; e por isso mesmo ele teme, mais do que tudo, as pessoas que vêem as coisas com clareza. Sua tática é quase sempre a de inspirar ao seu intérprete afastamento de quem quer que possa abrir-lhe os olhos. Evitando, por esse meio, qualquer contradição, está certo de ter sempre razão.
No contexto brasileiro, a dominação que Allan Kardec se refere aos espíritos sobre os médiuns se equipara, com exatidão, à de "médiuns" - que se afastaram da função intermediária e quase anônima dos médiuns espíritas originais - sobre seus seguidores. Os aspectos denunciados por Kardec são exatamente os mesmos.
Deve-se prestar atenção ao último parágrafo do item 239, no qual "grandes palavras como caridade, humildade e amor a Deus servem-lhe de carta de fiança". Até isso Kardec já preveniu as pessoas deste perigo. Mas, infelizmente, mesmo os críticos da deturpação do Espiritismo estão mais preocupados em proteger os deturpadores, movidos por esse traiçoeiro aparato de "amor e caridade".
Há até mesmo o uso de desculpas como "intolerância religiosa", apelos como o vitimismo - nos quais os deturpadores fingem "aceitar os ataques em silêncio", dizendo-se "pacientes e humildes diante da ira da sociedade contra o trabalho do bem" e "confiantes a Deus, seu único apoio no momento em que as pedras se voltam a eles". Criam todo um teatro do coitadismo, como meio de forçar a comoção pública com sua pose de pretensos "derrotados" que oculta seu poder dominador e privilegiado.
Os "espíritas" apelam até mesmo para a estratégia mais perigosa, o "bombardeio de amor", no qual se forja um clima de emotividade intensa e falsa intimidade hospitaleira. Isso mostra o quanto a "fascinação obsessiva" protege os "médiuns" e atrai a confiança cega de seus seguidores, e a "subjugação" a subordinação de quem poderia questionar e investigar mas se submete ao domínio de forma convicta.
Dessa forma, cria-se um impasse no qual os alertas de Allan Kardec forçam o "espírita" brasileiro a optar pela aceitação desses alertas ou a rejeição a eles pela submissão aos "médiuns". A cada dia as circunstâncias forçam os brasileiros a terem que escolher entre Kardec e os deturpadores. Não se pode ficar com os dois. Não há fraternidade entre o bom senso e o contrassenso. Ou é uma coisa ou outra. É hora de cair das nuvens.