terça-feira, 30 de maio de 2017
Mito do Brasil como "pátria do Evangelho" é herança de J. B. Roustaing
O mito de que o Brasil será o "coração do mundo" e a "pátria do Evangelho", trazido por Francisco Cândido Xavier usurpando indevidamente o nome de Humberto de Campos, é, comprovadamente, um conceito de herança roustanguista.
A leitura dos quatro volumes de Os Quatro Evangelhos, de Jean-Baptiste Roustaing, revela um intuito semelhante, no qual o deturpador francês sonha com a reunião de várias religiões dom o Espiritismo, transformando-se numa religião-síntese nos moldes não da doutrina de Kardec, mas no Catolicismo medieval.
Roustaing virou um palavrão entre os "espíritas" brasileiros não apenas por causa do mito radical do "Jesus fluídico". Ele virou um palavrão porque simbolizou o poder central da Federação "Espírita" Brasileira num momento de conflito com as federações regionais. Daí que estas, por uma mera formalidade, passaram a "enfatizar" o nome de Allan Kardec, visando levar vantagem nesta conveniência.
Mas é J. B. Roustaing que mostra o conteúdo que no Brasil é mais conhecido nas obras de Chico Xavier e Divaldo Franco. E isso de maneira bastante explícita e não acidental. Chico e Divaldo, devemos admitir, nunca deturparam o Espiritismo por acidente ou boa-fé, até porque seus trabalhos neste sentido foram inúmeros, feitos durante longos anos e transmitidos a um enorme público de leitores e/ou ouvintes.
Diante disso, a "profecia" de Chico Xavier de que o Brasil será o "centro de difusão de ideais de fraternidade cristã no mundo", através do lema "Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho", além de ser um devaneio típico de um caipira conservador mas sonhador em ver o Brasil "mandando no planeta", é também uma adaptação do ideal roustanguista da "religião-síntese".
E olha que o referido livro no qual Chico Xavier e seu tutor, o presidente da FEB Antônio Wantuil de Freitas, escreveram a quatro mãos e atribuíram a brochura a uma obra (fake) de Humberto de Campos, supostamente trazida do mundo espiritual, foi uma encomenda do Estado Novo de Vargas num acordo para evitar a repressão policial às "casas espíritas".
A ideia do Brasil como "coração do mundo" e "pátria do Evangelho" é herança do igrejismo de Roustaing. Tanto que Brasil, Coração do Mundo, Pátria do Evangelho mais parece uma adaptação brasileira de Os Quatro Evangelhos. Se rebatizasse o livro como Síntese de Os Quatro Evangelhos e a Missão do Brasil, seu sentido seria correto.
A ideia é igrejista. Colocar um país no centro de decisão político-religiosa, aos moldes do Império Romano, um discurso que os desinformados ficam entusiasmados de tanta paixão religiosa. O enunciado é lindo: um país que vai comandar o mundo e guiar as lições de fraternidade cristã para os demais povos do planeta. Mas o que está por trás disso é terrivelmente perigoso e ameaçador.
Países que sempre agiram por supremacia política e religiosa sempre tiveram ações sanguinárias. Em nome da implantação de uma causa, por mais "nobre" que seja, se destrói correntes contrárias, como um obstáculo a ser derrubado.
Foi assim que ocorreram "banhos de sangue" na Idade Média. Depois dela, com o Catolicismo jesuíta português ainda fincado em ideias medievais, um herege chegou a ser condenado à morte a pedido do "santo" José de Anchieta, e sob a concordância imediata do padre Manuel da Nóbrega, o mesmo Emmanuel que virou "pregador espírita".
Quem garante que a "pátria do Evangelho" não prescindirá de "banhos de sangue". Os "espíritas" já mostram sua vocação de fazer juízo de valor, e usarão como desculpas os "resgates coletivos" e "reajustes espirituais" para dizimar, se possível, cidades inteiras. Hoje a "pátria do Evangelho" é um projeto lindo como um jardim florido. Mas, amanhã, será mais uma teocracia a ameaçar a humanidade no planeta.
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