segunda-feira, 1 de fevereiro de 2016
Epidemia de vírus Zyka e o desprezo à Ciência
Quase cem anos após a trágica epidemia da gripe espanhola, que entre 1918 e 1920 causaram as mortes, no Brasil, do então presidente da República Rodrigues Alves (homenageado em uma famosa avenida na zona portuária carioca) e das personalidades "espíritas" Eurípedes Barsanulfo e Anália Franco e, em Portugal, de dois dos três meninos que em 1917 alegaram ter visto a "virgem de Fátima", os irmãos Jacinta e Francisco Marto, outra epidemia preocupa nossos dias.
Como a antiga epidemia, transmitida por um vírus de influenza A do tipo H1N1 e que matou mais do que a Primeira Guerra Mundial, tendo sido 300 mil só no Brasil, a nova ocorrência, com vírus da dengue, zyka e chikungunya, males transmitidos por um único inseto, o mosquito do tipo aedes aegypti, começa a causar mortes e se espalhar por vários países do mundo, principalmente Brasil.
As doenças são transmitidas quando um mosquito, geralmente uma fêmea, pousa na pele de uma pessoa ou um animal e realiza a picada. Sintomas como febre e intensa dor de cabeça são indicativos de cada um desses males. O vírus zyka, infectando mulheres grávidas, influi para que seus filhos nasçam com microcefalia, doença relacionada à má formação do cérebro.
O vírus zyka, por exemplo, foi descoberto em humanos no ano de 1952, o mesmo em que Divaldo Franco fundou a Mansão do Caminho, em Salvador, no Brasil, Madre Teresa de Calcutá investiu nas "casas dos moribundos" em Calcutá, na Índia, e Lafayette Ronald Hubbard, ou simplesmente L. Ron Hubbard, fundou a Cientologia, em Nova Jersey, EUA. O zyka já havia sido identificado em animais cinco anos antes, em Uganda, na África.
Graves doenças eventualmente alarmam a humanidade, e epidemias graves voltam para ameaçar quaisquer pessoas. E a situação é tão grave que, foi só um país africano comemorar o fim da epidemia de Ébola, outra doença mortal, originária de contato com animais infectados por morcegos que hospedam o vírus, que novas ocorrências voltaram a acontecer.
As epidemias mostram o quanto os trabalhos científicos estão muito atrasados no esforço de controlar e erradicar, de maneira definitiva, graves doenças. E ainda, com muita dificuldade, se realizam estudos para a cura da AIDS, dos vários tipos de câncer, dos males de Alzheimer e Parkinson, da cura para a paralisia e tetraplegia nos membros e de diabetes, entre outras doenças conhecidas.
CIÊNCIA SUBESTIMADA
O trabalho é árduo, os investimentos são racionalizados ou, quando as experiências feitas no exterior, há mais sorte de se obter recursos, e muita dedicação é feita dentro dos limites encarados. E obstáculos acontecem, como o fato de muitos importantes pesquisadores sobre AIDS terem morrido em um acidente aéreo, pouco tempo atrás.
O trabalho científico é subestimado no Brasil. A ação da ciência na busca de curas sofre a concorrência sinistra e mística das "curas espirituais" do "espiritismo" e das "curas milagrosas" da Igreja Católica. O fato da euforia que existe quando as curas ocorrem sob o manto da fé - ou ao menos pareçam ocorrer - mostra a preferência que muitos brasileiros têm pela fé religiosa em detrimento do trabalho científico.
A Ciência é ensinada de forma negativa pelas bancas escolares. Ela é abordada como um processo maçante, inacessível e incompreensível, o que faz com que suas matérias conhecidas, como Física, Química e Matemática, sejam ensinadas de maneira complicada e desagradável, causando repulsa aos alunos que, no futuro, se tornam cidadãos que hostilizam tudo que lembra práticas de raciocínio mais elaborado.
Por outro lado, a religião é ensinada como um conto-de-fadas e aborda narrativas cheias de fantasias e promessas de melhorias de vida através de perspectivas místicas em que o sonho e a alegoria falam mais alto que a realidade, e que a emoção humana é trabalhada de maneira confortável, ao mesmo tempo sedutora e catártica, o que faz as pessoas se apegarem à fé religiosa, quando adultas.
Com essa pedagogia um tanto desigual, cria-se nas pessoas um certo desprezo à Ciência, ou, quando muito, uma apreciação distanciada e indiferente, em que a descoberta de um feito científico é vista sem entusiasmo, mesmo quando ela expressa um benefício direto para as pessoas comuns.
Mas quando uma "cura" atribuída aos prodígios da fé é difundida, as pessoas cantam vitória, comemoram em êxtase, o entusiasmo é imenso. Supostas curas das quais não se tem explicação e que, no fundo, nem se tem certeza se elas realmente ocorreram, causam um grande burburinho nas pessoas e as deixam numa felicidade descomunal.
PSEUDOCIÊNCIA
O pior ocorre quando a Fé tenta se intrometer na Ciência. Quantas seitas religiosas são criadas sob o verniz da "ciência", com pretenso racionalismo e teses delirantes que se vendem como "científicas"? Quantos físicos, biólogos, químicos e matemáticos frustrados, quantos caipiras arrivistas e quantos místicos pedantes usam a Ciência como pretexto para criar seitas que nada têm de científicas?
A Cientologia é um exemplo, com toda a sua estrutura engenhosa e seu rigor metodológico que nem de longe expressa um conteúdo científico, mas antes uma série de conceitos místicos delirantes e falsamente científicos, que mais criam mitos do que aperfeiçoam a realidade.
No "espiritismo", isso é feito também à sua maneira, e o caso mais ilustrativo é de Divaldo Franco, com seu ar professoral, seu discurso rebuscado, prolixo e pedante, e sua pose de pretenso discípulo de Allan Kardec facilmente desmascarável diante de práticas anti-kardecianas como marcar datas fixas para o futuro da humanidade e acreditar em criaturas e processos místicos.
Mas a coisa não para por aí. As delirantes apreciações "proféticas" a Chico Xavier têm seu apelo pseudocientífico que mostra casos risíveis como a comprovação da "profecia da data-limite" de 1969 por episódios ocorridos ANTES, como a possível visita de extraterrestres sobre estações militares dos EUA em 1964 e 1967. Profecia que prevê o que já ocorreu antes?
Outro caso é o desprezo a cientistas pouco conhecidos no Brasil, como o alemão Wolfgang Bargmann e o estadunidense Percival Lowell, deixados para trás por causa de supostas façanhas atribuídas a Chico Xavier e seus "amigos do além", a mãe Maria João de Deus, o fictício André Luiz e um estranho Humberto de Campos que nunca teve a ver com o que viveu entre nós.
Pior é que são universitários ou radialistas considerados de alto prestígio que divulgam essas aberrações. Ver acadêmicos portadores de Doutorado e tudo alegar que André Luiz "preveu" descobertas sobre glândula pineal porque a bibliografia sobre o assunto nos anos 1940 era "escassa", sem ter contato com as fontes da época, é estarrecedor.
Da mesma forma, atribuir pioneirismo de Chico Xavier a algo que já era discutido e trabalhado antes dele nascer, como o caso da possibilidade de haver vida em Marte, presença de civilizações e água, utilizada em canais fluviais artificiais, é de uma estupidez deplorável.
E isso dentro de uma doutrina que aceita "cirurgias" feitas sem higiene e com métodos duvidosos, prejudicando os estudos que poderiam relacionar a Ciência dos homens da Terra com a comunicação com os espíritos.
Prejudica-se os estudos sobre medicina espiritual por causa de processos duvidosos, de uma "medicina espiritual" trazida de maneira improvisada por espíritos sinistros e traiçoeiros de médicos nazistas e similares. Como tudo é feito em prol da fé, ninguém questiona, ninguém duvida e muitos aderem sem saber do que se trata. Fora as fraudes e o charlatanismo que ocorre em muitos casos.
E é assim que a Ciência é marginalizada no Brasil, e também pelo "espiritismo" que se gaba em ser "amigo da Ciência". O obscurantismo da Fé mostra o quanto ela só aceita a Ciência quando esta se submete à aquela, mesmo quando a lógica, o rigor de método e a coerência são deixados de lado.
Quando "acreditar" passa a ficar acima do "saber", a busca do Conhecimento é prejudicada. Com a supremacia da Fé, a Ciência é deixada em segundo plano. E, no caso das doenças, isso agrava ainda mais a situação injusta em que se situam nossos cientistas, deixados de lado pela concorrência desleal da fé e do obscurantismo.
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